Tragédia com caminhão expõe perigo do tráfego de cargas em vias íngremes de BH

Na Avenida Nossa Senhora do Carmo, uma das principais da Região Centro-Sul da capital, 11 veículos são barrados por dia

Guilherme Paranaiba

Depois do desastre e com autorização da Prefeitura de BH, caminhão-tanque desce a mesma rua onde transportador de cimento se desgovernou na véspera - Foto: Edésio Ferreira/EM/D.A PRESS


Todos os dias, pelo menos 11 veículos de carga são barrados por um bloqueio de agentes da BHTrans antes de descer a Avenida Nossa Senhora do Carmo, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, sem autorização do poder público. Os dados, fornecidos pela empresa de transporte e trânsito da capital, são do ano passado e mostram que 4,2 mil veículos pesados foram impedidos de seguir pela via, onde só foi implantado esse tipo de fiscalização depois de tragédia ocorrida em 2012. Na ocasião, uma carreta com 29 toneladas de bobinas de aço arrastou 11 veículos, matou três pessoas e deixou outras cinco feridas. Ao se deparar com o bloqueio, os caminhoneiros precisam fazer o retorno, subindo a BR-356 a partir do trevo do Bairro Belvedere. Moradores do Bairro São Bento – onde na quarta-feira duas pessoas morreram em acidente com um caminhão carregado de cimento – acreditam que parte desse fluxo se transfere para endereços de fiscalização mais frágil, nas ruas da região. A comunidade denuncia que muitos dos caminhões saem na Rua Centauro, onde teve origem o último desastre e na qual o trânsito é proibido para veículos acima de cinco toneladas.

O caminhão que na quarta-feira desceu desgovernado a via bateu com violência em um muro na Avenida Cônsul Antônio Cadar e matou a manicure Melrilene Cavalcanti da Silva, de 23 anos, além do próprio caminhoneiro, Jorge Ricardo de Ferreira da Cunha, de 52. Moradores da vizinhança dizem que a tragédia era previsível e pediam mudanças havia anos, principalmente pela inclinação elevada da Rua Centauro (de 19,22%), que favorece acidentes, e pelo frágil instrumentos de restrição, limitado a uma placa de proibição frequentemente desrespeitada.

A apreensão da advogada Maria Carolina Campos, de 36 anos, moradora da Rua Centauro, indica que realmente alguma coisa grave estava prestes a acontecer. Em novembro de 2014, ela reuniu várias informações em um dossiê para tentar sensibilizar a BHTrans a tornar a Centauro mão única, no sentido da subida.
“Aqui, a gente tira o carro da garagem temendo o pior”, afirma. Como a via é extremamente íngreme, dos cinco quarteirões entre a rotatória onde houve a tragédia e a Praça das Constelações, três se assemelham a verdadeiros tobogãs.

O único impedimento que os caminhões encontram ao alcançar a Praça das Constelações é uma placa, no primeiro quarteirão da Centauro, indicando que o tráfego pesado não é permitido no trecho. “Mesmo assim, é comum ver caminhões por aqui. Quantas vidas mais terão que ser perdidas até que alguém faça alguma coisa?”, questiona a advogada Maria Carolina.

Ontem mesmo, o Estado de Minas flagrou um caminhão-tanque com capacidade para 10 toneladas, a serviço da Prefeitura de BH, descendo o mesmo trecho. A ironia é que o veículo levava água para limpeza da pista onde ocorreu a batida. A BHTrans informou que o veículo tem autorização para transitar em locais proibidos, das 7h às 20h, até 22 de abril deste ano, desde que esteja executando serviço público.

Segundo a empresa de transporte e trânsito, que lamentou o acidente, o caminhão que provocou a tragédia na véspera desrespeitou a sinalização na Rua Centauro. Desde setembro de 2015, “foi elaborado um projeto operacional que prevê a revitalização de toda a sinalização da Rua Centauro e suas interseções”. Está prevista ainda neste semestre a implantação de faixas de estacionamento e estreitamento da faixa útil, para desestimular o excesso de velocidade, limitada a 30km/h, segundo a empresa. Quanto ao pedido de implantação de mão única na Centauro, a BHTrans argumenta que a mudança obrigaria a desviar o trânsito para as ruas Pleiades, Plutão e Principal, que também são íngremes.

 

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