Até agora, a maioria dos presídios femininos no Brasil entregava às suas detentas, na entrada da cela, um par de chinelos de dedo e um uniforme de padronização masculina, sem distinção de tamanho pequeno, médio ou grande. Tanto fazia. Com esse figurino, passar para o lado de trás das grades significa perder, além da liberdade, a identidade feminina. Ser presa, portanto, significa ser obrigada a vestir um “saco de batatas” ou um “balão”, nas palavras delas mesmas, que revelam vergonha inclusive dos trajes com que se apresentam para receber visitas de filhos e familiares.
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Detentas de presídio misto em Muriaé serão transferidas para unidade femininaDetentas recolhidas em unidades longe de casa perdem vínculos com parentesMulheres detentas têm dificuldade em manter relacionamento amoroso atrás das gradesDetentas começam a fazer curso de empreendedorismo em BHNa prática, mudar a padronização de masculino para feminino não vai gerar custos extras ao sistema penitenciário de Minas, que produz os próprios uniformes desde 2009. “Desde que me sentei na cadeira da superintendência, há três anos, a primeira coisa que perguntei foi se seria possível e se estava dentro da lei oferecer a elas um uniforme feminino. Mesmo assim, enfrentei alguma resistência dos agentes. Ainda permanece a filosofia de que a pessoa presa deve ser punida e não ressocializada. Na minha cabeça, temos de devolver para a sociedade pessoas melhores do que aquelas que entraram na prisão”, compara Louise Bernardes.
Antes de os novos uniformes serem lançados oficialmente, detentas do Complexo Penitenciário Feminino Estêvão Pinto (Piep), no Bairro do Horto, em Belo Horizonte, fizeram a prova das peças, acompanhadas pela reportagem do Estado de Minas. Aos 19 anos, Shaynara Izabelle, de longos cabelos e porte pequeno, não escondia o alívio de receber roupas do seu tamanho, ao contrário da vestimenta anterior, que era tamanho único: “Apesar da minha situação, ficou muito mais bonito.
Produção começou no Dia da Mulher
Em 8 de março, quando se comemorou o Dia Internacional da Mulher, a fabricação dos novos modelos foi iniciada em Caxambu e Pouso Alegre, pelas mãos das próprias presas, a partir de um molde tirado por uma delas, Camila Teodoro de Toledo, de 25 anos, com experiência na área de confecções, que pegou pena de seis anos por tráfico. “Eu estava na hora errada e tive a reação errada. A droga era do meu companheiro, que jogou no meu colo. Não sou nem usuária”, diz ela, que trabalha com oficina de costura desde os 18 anos em Monte Sião, no Sul de Minas.
Dentro do Presídio de Caxambu, Camila tirou a modelagem de uma peça-piloto e fez as modificações, adaptando os moldes para os tamanhos P, M e G. Em seguida, recebeu as máquinas de costura profissionais e as ajustou, uma a uma.
Neste ínterim, as colegas voluntárias participavam de cursos de corte e costura, por meio do Pronatec. Quando chegaram ao batente, Camila organizou a linha de produção. “Está ficando lindo: enquanto uma vai rebatendo, a outra vai pespontando, a colega revisando e a última, contando as peças.
No cotidiano das penitenciárias femininas, os novos uniformes vão evitar brigas diárias que costumavam haver entre seguranças e detentas, que insistiam em “enrolar” as blusas em mini-blusas ou o cós das calças, para ajustar melhor ao corpo, o que era proibido. Outra infração comum era furtar linhas e agulhas das oficinas de corte e costura para alinhavar, por dentro, os uniformes, com o mesmo objetivo. Com os novos modelos, a única preocupação da diretora de segurança da Piep, Sabrina Melo, será em relação à introdução de bolsos nas calças e bermudas que, apesar de ajudarem no estilo, podem dificultar a vigilância. “Pode aumentar o número de brigas, com uma puxando outra pelo bolso. Mas isso é só um detalhe”, afirma..