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Estado de Minas

Construção de diques deixa ruínas de Bento Rodrigues com aparência de barragem de rejeitos

Povoado devastado pela lama de minério agora se assemelha a nova barragem, aos pés de outras represas de contenção. Diques que deveriam reter poluição não cumprem a meta, segundo MP. Samarco diz que houve melhora e há projeto para reforçar estruturas


postado em 31/03/2016 06:00 / atualizado em 31/03/2016 07:26

Efluente desce de uma das três novas estruturas de barramento perto do povoado, que não têm sido capazes de impedir o carreamento de rejeitos para a Bacia do Rio Doce(foto: Leandro Couri/EM/DA Press)
Efluente desce de uma das três novas estruturas de barramento perto do povoado, que não têm sido capazes de impedir o carreamento de rejeitos para a Bacia do Rio Doce (foto: Leandro Couri/EM/DA Press)
Mariana – Acima do que sobrou de casas, igreja, pontos de comércio e ruas do subdistrito de Bento Rodrigues, agora se erguem barragens de pedra, bloqueando a visão que os antigos moradores tinham das montanhas. As toneladas de lama saturada de minério que soterraram o povoado onde viviam 600 pessoas agora são um pavimento seco, do qual se desprende pó que o vento carrega em nuvens. Sem mais moradores, as ruínas – onde já se defendeu que seja erguido um monumento para que a tragédia não seja esquecida – aos poucos vão tomando os contornos de uma nova represa de restos de mineração. Isso porque, além da lama que seca nas ruas, foram construídos pela Samarco três diques quase em cima do antigo povoamento, na tentativa de conter e filtrar os rejeitos que vazam há quase cinco meses, depois do rompimento da Barragem do Fundão, de sua propriedade. Pior, como o Estado de Minas mostrou em sua edição de ontem: as estruturas não estão sendo capazes de impedir que os efluentes continuem a descer pelos cursos d’água e a contaminar os rios Gualaxo do Norte, do Carmo e Doce, até desembocar no oceano, no Espírito Santo.


A Barragem do Fundão se rompeu em 5 de novembro, despejando 50 milhões de metros cúbicos de lama e rejeitos, em uma onda que desceu pelo vale atingindo depois a Barragem de Santarém, que continha água, e depois arrasando o subdistrito de Bento Rodrigues. A inundação avançou sobre mais comunidades de Mariana e de Barra Longa, matou 19 pessoas e trouxe problemas de abastecimento, soterramento de pastos, plantações e hábitats entre Minas Gerais e Espírito Santo naquela que é considerada a maior tragédia socioambiental do Brasil.

Ontem, a equipe do EM teve acesso às ruínas do subsdistrito de Bento Rodrigues, algo que tem se tornado cada vez mais difícil, já que agora alguns dos acessos ao antigo povoado são controlados com portões e seguranças. A construção dos diques se destaca na paisagem. O complexo de três reservatórios foi apresentado pela empresa no primeiro termo acordado com o Ministério Público estadual, na tentativa de cessar o dano ambiental continuado que o carreamento de lama e minério continuava representando para os córregos. Contudo, as estruturas não tem funcionado a contento, de acordo com o MP. Um dos diques, o segundo, chegou a se romper com as chuvas, foi reerguido, mas acabou sendo engolido pela lama e mais uma vez teve de ser refeito. O MP informou que tomará medidas judiciais na tentativa de cessar os danos contínuos.

Nas imediações de Bento Rodrigues, tratores empurram pedras e caminhões pesados transportam terra em ritmo acelerado, na tentativa de adequar o sistema de três diques e impedir que a lama e os rejeitos minerários continuem a poluir os rios. Mas, mesmo no atual estágio, no qual a empresa considera que os reservatórios estejam prontos e retendo a água contaminada para que decante, o líquido que continua a escorrer é barrento e deposita um pó cinzento e brilhante nos leitos e margens dos cursos em que desemboca, como constatou a reportagem do EM.

O córrego vermelho que desce da terceira estrutura de contenção, construída quase em cima de Bento Rodrigues, é apenas uma fração do rio que costumava passar pelo subdistrito, já que um lago enorme se formou a partir do barramento e libera pouco volume. O reservatório criado para melhorar a qualidade da água inundou pastagens e bosques que estavam cobertos pelos rejeitos.

CONTENÇÃO REFORÇADA Questionada sobre a eficácia dos diques, a Samarco informou que eles tiveram construção concluída em fevereiro e avalia que têm “contribuído para a melhoria dos aspectos de cor e turbidez dos rios afetados”. “No período anterior à implantação do dique S3 (próximo a Bento Rodrigues), por exemplo, o Córrego Santarém seguia para os cursos hídricos à jusante (abaixo) com elevada carga de sólidos suspensos, da ordem de 20% em peso”, diz nota da empresa, acrescentando que, após a implantação, a lama passou a ficar sedimentada no reservatório do dique. A mineradora sustenta também que planeja novas estruturas para diminuir a atual concentração de sedimentos.

Ainda segundo a empresa, está sendo feito plantio emergencial de gramíneas nas margens dos rios atingidos, para conter sedimentos. Até agora, garante, foram plantados mais de 500 hectares dos 800 hectares previstos. Também há intervenções como a colocação de pedras (enroncamento) e aplicação de mantas em áreas marginais dos cursos d’água, parte do plano de recuperação entregue ao Ibama. A empresa acrescentou que trabalha na dragagem do reservatório da usina de Candonga, em Santa Cruz do Escalvado, que reteve grande quantidade de rejeitos após o desastre. A ação contribuirá para a melhoria da qualidade da água na Bacia do Rio Doce, diz a Samarco. “Também já está em andamento a reabertura dos canais dos pequenos afluentes dos rios Doce e Gualaxo, permitindo que a água chegue mais limpa aos rios”, informou.


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