A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) publicou ontem no Diário Oficial do Município (DOM), decreto que regulamenta a Lei Municipal 10.119/2011, que estabelece normas para a atividade dos carroceiros na capital mineira. O chamado Veículo de Tração Animal (VTA) terá que ser cadastrado e licenciado pelo poder público a cada três anos. “O problema da classe são os clandestinos. Já tenho a carteira da BHTrans, o documento com as vacinas do Dominique (o cavalo) e o papel da carroça”, informou Noel Melo de Oliveira, de 58 anos, há 10 na atividade. Ele faz questão de apear do meio de transporte, mostrar a estrutura recém-pintada e também a placa da carroça TA 1852. “Acabei de ver um carroceiro irregular abandonar um sofá na frente de uma casa. Se tivesse placa, poderia denunciar”, compara.
O decreto apresenta algumas condições para que o animal e a carroça sejam usados. O solicitante do licenciamento deve ter mais de 18 anos, ser dono do animal, comprovar participação em curso básico de regras de circulação promovido pela BHTrans e ter boa saúde física e mental, comprovadas por atestado médico. Na Avenida dos Andradas, na Região Central, pelo menos dois dos carroceiros que usavam na tarde de ontem o depósito da Superintendência de Limpeza Urbana (SLU) para despejar os resíduos recolhidos admitiram ser menores de idade.
Além disso, o decreto traz uma lista equipamentos obrigatórios ao VTA, como freios do tipo tambor acoplados às rodas, tiras refletivas na carroça e placa de identificação. Somente o condutor poderá ocupar a carroça, sendo que o peso da carga e do condutor não pode passar de 550 quilos. Na prática, os carroceiros calculam uma carga de 400 quilos, descontado o peso do condutor. “Você acha que vou maltratar a criação, que me dá até R$ 200 por dia e me ajuda a criar meus quatro filhos?”, conta Amauri Socorro Bonifácio, que afirma gastar em torno de R$ 500 mensais com alimentação do animal. Antes de posar para a foto, ele ajeita a crina de Thompson, nome inspirado no filme Cavalo de guerra, que já o fez chorar umas três vezes. “Este aqui é inteligente demais. Abaixa a cabeça para passar pelo portão das garagens, você precisa ver”, elogia o homem.
A prefeitura ainda vai buscar parcerias com o governo de Minas Gerais e União para fazer valer as novas regras, além de encontrar soluções para casos de maus-tratos. O decreto começa a valer a partir de 29 de junho, 90 dias após a publicação.
Avanços com questionamentos
A integrante do Movimento Mineiro pelos Direitos Animais (MMDA) Adriana Araújo comemora a regulamentação para a atividade dos carroceiros, mas afirma que principal luta é pela proibição desse tipo de transporte. “O nosso ideal é a proibição definitiva da escravização do cavalo, mas nós sabemos que isso é um processo. Belo Horizonte ainda está muita atrasada se comparada a outras capitais brasileiras onde esse tipo de transporte é proibido”, afirma.
Sobre o suporte máximo de 550 quilos que a lei exige, Adriana admite avanço, mas também questiona. “Esse peso é muito para os animais que circulam pela capital. Os cavalos de Belo Horizonte são, na sua maioria, esquálidos, com um dos olhos furados, ferraduras impróprias e equipamentos precários, o que não contribui para suportar essa carga. O ideal para a saúde deles é no máximo 350 quilos”, disse.
Adriana frisa que o problema é complexo e abrange o campo social, que também é uma preocupação do movimento. “Nós queremos o melhor para o carroceiro e para o animal. Políticas públicas precisam proporcionar alternativas de trabalho para esse tipo de cidadão. São pessoas com condição de renda muito difícil.”
Para ela, é preciso a conscientização das pessoas sobre esse tipo de serviço, observando se as carroças estão no padrão apropriado pela pela lei. “A população tem que fazer a sua parte. Se você quer contratar o serviço, busque saber se a carroça é regulamentada. Se não, denuncie.”