Moradores de cidades sem ligação asfáltica vivem isolados por lama e poeira

Moradores de municípios que não dispõem de ligação asfáltica são privados de acesso a serviços, abastecimento e desenvolvimento, além de ter de se sujeitar ao transporte pirata

Mateus Parreiras
Linhas regulares desistiram do trecho, abrindo caminho a transportadores alternativos - Foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press
Berilo, Chapada do Norte e Minas Novas – Cidades que dependem de estradas não pavimentadas podem ser consideradas praticamente “isoladas” e de difícil atração de investimentos, considera o especialista em transporte e trânsito Silvestre de Andrade Puty Filho. Contudo, o engenheiro alerta que, para a burocracia do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), essas não são prioridades. “Quando um administrador olha para uma planilha e vê que apenas cinco dos 853 municípios mineiros não têm asfalto, considera que o dado é positivo. Mas quem mora nessas cidades tem prejudicados seus acessos a serviços, escoamento de produção, abastecimento da população, escola e saúde, trabalho. Para uma gestão que nem sequer consegue duplicar a BR-381, que é repleta de tragédias, imagine que interesse haverá numa rodovia do Vale do Jequitinhonha”, compara. Uma das soluções, segundo o especialista, seria conceder as rodovias à administração do estado. “Só que o estado também não vai querer arcar com esse investimento, principalmente com a crise atual”, observa.


As dificuldades em se transitar na rodovia BR-367, entre Minas Novas e Berilo, no Vale do Jequitinhonha, trouxeram um enorme prejuízo aos moradores e prestadores de serviços da região. Devido à precariedade da estrada, uma das empresas que faziam o trajeto desistiu de continuar, alegando à Prefeitura de Chapada do Norte que as condições da estrada a impediam de cumprir o quadro de horários, o que por contrato levaria a multas, além de sujeitar seus veículos à revolta de usuários.

Ainda de acordo com a administração municipal, a empresa de ônibus que fazia o transporte de passageiros para Minas Novas, Berilo, Virgem da Lapa e Araçuaí interrompeu a rota no fim de janeiro. O Estado de Minas tentou contato com a linha de ônibus, mas ninguém na empresa se dispôs a comentar o assunto. Responsável por regular o transporte intermunicipal de passageiros, o Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DER-MG) mantém até rotas alternativas previstas em contrato com as empresas, passando por Diamantina e outros destinos, em caso de as condições da BR-367 impossibilitarem o tráfego normal e seguro.

Aproveitando-se disso, várias empresas clandestinas resolveram colocar ônibus para rodar no trajeto, cobrando os preços que lhes convêm, sem respeitar horários regulamentados pelo DER-MG e deixando de rodar quando a estrada está ruim, do mesmo jeito que as empresas com concessão formalizada. Uma passagem de Minas Novas a Berilo pela BR-367 custava R$ 15 numa linha formal, enquanto os genéricos, como costumam ser chamados, cobram até R$ 30. Um desses motoristas foi encontrado pela reportagem quando descarregava mercadorias e desembarcava passageiros no povoado de Morro Branco, em Chapada do Norte.

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Segundo o DER-MG, o homem de 34 anos não tem autorização para esse tipo de transporte, mas o condutor não tem qualquer pudor em dizer que cumpre o trajeto irregularmente, inclusive preferindo não dirigir quando julga não haver condições. “Essa estrada é complicada demais. Quando chove, é uma tristeza, mas é ruim na seca também. Tem vez que é preferível nem passar aqui. Tem lugar com ponte, lugar sem ponte. As empresas de ônibus até pararam de passar por causa disso mesmo. Não tem ônibus que resista. Não sobra um embuchamento (das molas e sistemas de amortecimento) de tanto bater lata na estrada”, disse.

Segundo o especialista e consultor técnico em manutenção de veículos pesados Alberto Vidal Guimarães, os pneus são os componentes que mais sofrem numa estrada não pavimentada em más condições. “Ocorrem cortes nos pneus com frequência, quebra de peças da suspensão em função dos impactos.

No caso dos veículos de carga, podem ocorrer trincas de chassi e quedas das longarinas devido ao peso da carga”, afirma.

Para evitar esses prejuízos, o especialista recomenda reduzir a velocidade. “Cair no buraco freando provoca um tipo de dano muitas vezes pior. Causa um efeito de alavanca sobre as peças da suspensão”. No barro, os pneus precisam estar em bom estado e ser adequados para não atolar. “A calibragem também é importante: pneus muito cheios não têm aderência correta e por isso também atolam”, afirma. Por outro lado, Guimarães aponta a poeira como um grande problema para quem trafega diariamente sob essas condições. “A poeira exige mais manutenção dos filtros de ar, filtro de cabine, aumenta o consumo excessivamente e diminui a vida útil do motor.”
- Foto: Arte EM

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