Ataque a fisioterapeuta mostra descontrole sobre flanelinhas em Belo Horizonte

Mulher levou 15 pontos no braço após ser agredida por flanelinha na Savassi. Guardador foi indiciado apenas por "extorsão".

Pedro Ferreira Valquiria Lopes
Janine Lima se revolta com a previsão de que agressor em breve voltará à rua - Foto: Juarez Rodrigues/EM
O descontrole oficial sobre flanelinhas em Belo Horizonte – onde o número de “guardadores” cadastrados só diminui, enquanto a extorsão contra motoristas aumenta dia após dia – produziu sua vítima mais grave na Savassi. A fisioterapeuta Janine Damasceno Lima, de 33 anos, recebeu 15 pontos no braço, depois de se recusar a pagar antecipadamente pelo “serviço” e ser agredida com uma espátula. A Prefeitura de Belo Horizonte não foi capaz de informar ontem se o agressor é ou não inscrito no cadastro do município. Já a Polícia Militar sustenta ter detido 50 clandestinos em ruas da capital em um mês e meio, mas o trabalho não dá resultado, pois em pouco tempo eles estão de volta às ruas.

O ataque contra Janine, ocorrido na noite de sábado na Rua Sergipe com Fernandes Tourinho, endereço nobre do bairro da Região Centro-Sul de Belo Horizonte, vai deixar outras marcas que não apenas a grande cicatriz na altura do ombro esquerdo. Além do trauma, a fisioterapeuta está revoltada. O agressor, João Vicente Ângelo Custódio, de 72, que usava colete e credencial da prefeitura, foi preso e autuado apenas por “extorsão”. Para a vítima, o crime praticado foi lesão corporal e poderia até mesmo ser enquadrado como tentativa de homicídio. Traumatizada, ela conta que não volta mais à Savassi, mesmo porque considera que o criminoso sairá impune e brevemente estará de volta às ruas “para cometer outras barbaridades”.
A Polícia Civil não explicou o motivo de o flanelinha ter sido indiciado por extorsão. Informou somente que ele foi encaminhado ao sistema prisional.

Janine conta que havia saído de uma confraternização e pretendia passar em um bar na Savassi apenas para abraçar uma amiga que comemorava o aniversário. Acompanhada da filha de 2 anos e da afilhada de 11, ela conta que, ao chegar, subiu com o carro em um ponto onde o passeio é recuado, com espaço para estacionamento. Nesse momento, foi abordada pelo flanelinha. “Ele disse que eu somente poderia parar ali se pagasse R$ 5 antecipadamente. Falei que não ia demorar, e que o pagaria na volta, como costumo fazer. Mas ele disse que, se eu não pagasse naquele momento, encontraria os quatro pneus furados”, relata a vítima.

Segundo ela, um motorista a serviço do aplicativo Uber presenciou a ameaça e se ofereceu para retirar o carro dele, que estava estacionado do outro lado da rua, e ceder a vaga. “Entrei no meu carro e, quando dei ré, o flanelinha começou a dar socos na parte traseira. Eu me assustei e desci. Disse que ele estava louco fazendo aquilo, que eu estava com duas crianças no carro. As meninas ficaram assustadas e a minha filha começou a chorar. Eu disse que o denunciaria à prefeitura”, conta a vítima.

Quando deu as costas para voltar ao carro, ela conta que sentiu o golpe, antes que o agressor fugisse. “Olhei e vi o sangue escorrendo.
O porteiro do prédio em frente chegou correndo e disse que eu tinha sido esfaqueada. Eu comecei a gritar, e as pessoas do bar próximo correram atrás do flanelinha. Conseguiram pegá-lo e o dominaram até a chegada da PM”, conta a vítima. Testemunhas teriam agredido o homem antes da prisão. Por se queixar de dores, ele foi levado a uma Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) antes da prisão. Janine foi levada por policiais militares ao Hospital de Pronto-Socorro João XXIII (HPS), onde levou 15 pontos.

MEDO Apesar de considerar extorsão a forma de abordagem dos guardadores de carro, a fisioterapeuta conta que nunca teve problemas com nenhum deles, e acrescenta que tem o costume de pagar ao voltar para o veículo. “Já cheguei a pagar até mais, por medo. Se você não paga, corre o risco de ter o carro depredado. A cidade faz campanhas para não pagar, há faixas no entorno do Mineirão para a gente dizer não à extorsão, mas não temos proteção”, disse.

O que mais a revolta, segundo Janine, é saber que não vai demorar para que o agressor volte às ruas. “A impunidade só aumenta.
A polícia prende, a Justiça solta. Eu poderia estar morta neste momento. Tenho medo de voltar à Savassi e encontrar aquele homem de novo. Ele pode querer se vingar. Estou traumatizada. Quem poderia imaginar que um senhor de 72 anos, com um metro e meio de altura e cabelos brancos, poderia fazer uma coisa dessa, levar uma arma branca para a rua e agredir as pessoas? Só fico pensando que poderia ter sido pior. Podia ter sido uma tragédia. Ele poderia ter me golpeado no pescoço, e eu não estaria aqui para contar a história”, preocupa-se. “Tomara que ele não faça o mesmo com outras pessoas. Testemunhas disseram que ele sempre aborda motoristas de forma agressiva, principalmente mulheres”, conta..