Povoados devastados em Mariana ganham proteção

Perto de completar seis meses do maior desastre socioambiental do país, o Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de Mariana (Compat) decidiu tombar Bento Rodrigues e Paracatu varridos pela lama da mineradora Samarco

Gustavo Werneck
Povoado de Bento Rodrigues, varrido pelo rompimento da barragem da Samarco - Foto: Leandro Couri EM/D.A Press
Proteção total para os subdistritos de Bento Rodrigues e Paracatu, afetados pela tragédia provocada pelo rompimento da barragem da Samarco em Mariana, na Região Central. Perto de completar seis meses do maior desastre socioambiental do país, o Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de Mariana (Compat) decidiu, por unanimidade, tombar as duas localidades que guardam a memória das famílias atingidas pela lama de minério e parte de um patrimônio cultural que remonta ao século 18, auge da extração do ouro. “Trata-se de uma iniciativa muito importante, pois, a partir de agora, todas os projetos públicos e particulares deverão passar pelo crivo do conselho, que tem caráter consultivo e deliberativo. Isso inclui, por exemplo, uma eventual construção de barragens de rejeitos na região ou empreendimentos maiores”, disse, ontem, a presidente do Compat, Ana Cristina de Souza Maia.

O tombamento contempla as áreas urbanas de Bento Rodrigues, vilarejo que se tornou inabitável desde 5 de novembro, dia do rompimento da Barragem do Fundão, e de Paracatu, igualmente devastado, somando-se o entorno de 100 metros. Um dos objetivos é que as terras se transformem em Museu do Território, modalidade já existente em outros municípios mineiros, como Itabira e seus Caminhos Drummondianos. A criação de um memorial também está nos planos. “Serão feitos todos os estudos necessários. O próximo passo será o levantamento georreferenciado, trabalho cartográfico, delimitações e outros aspectos técnicos”, acrescenta Ana Cristina, que presidiu a reunião extraordinária realizada na quinta-feira.


O coordenador da Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Histórico, Cultural e Turístico de Minas Gerais (CPPC), Marcos Paulo de Souza Miranda, ressalta a implantação do Museu do Território como fundamental para manter viva a memória das localidades, e vai além: “Os dois lugares devem ser objeto também de pesquisas sobre tecnologias avançadas em mineração e recuperação de áreas atingidas”, afirma. “A próxima quinta-feira (quando se completam seis meses da tragédia) será de lembranças muito tristes, mas a data se torna histórica e memorável, tendo em vista esse desastre sem precedentes na história do país”, diz o coordenador da CPPC.

ENTUSIASMO
A decisão de tombar os subdistritos encheu de entusiasmo um dos ex-moradores de Bento Rodrigues, José do Nascimento de Jesus, conhecido como Zezinho do Bento. Atuante na mobilização em favor da comunidade atingida, ele se mostrou satisfeito. “A proteção pelo Compat é fundamental para se preservar o que restou, bem como a memória do lugar onde vivemos durante tantos anos. O mais importante é que, desde o início, temos lutado para que em Bento Rodrigues não seja construída uma nova barragem”, afirmou Zezinho, que mora com a família em um imóvel alugado pela mineradora em Mariana.

Em nota, a Samarco informou que desconhece o tombamento. “No entanto, dentro do escopo do acordo assinado entre a Samarco, seus acionistas (Vale e BHP) e os governos federal, de Minas Gerais e do Espírito Santo, está contemplada a criação de um memorial na área do antigo Bento Rodrigues. A ação se encontra em fase inicial de tratativas junto à Prefeitura de Mariana e demais órgãos públicos.”.