Dizem que o cultivo de orquídeas é demorado e requer paciência. Se o criador se esforçar bastante, poderá ter a companhia pela manhã de uma Cattileya walkeriana, espécie do cerrado mineiro que, exatamente às 10 horas, exala cheiro adocicado de mel. Há também orquídeas que florescem em cachos e outras, mais raras, que medem menos de três milímetros de pura delicadeza. Ontem, a convite da Sociedade Orquidófila de Belo Horizonte, alguns dos integrantes da Associação Família Down circularam com muita naturalidade em meio à sofisticação e exuberância da 67º Exposição de Orquídeas, a maior deste tipo no país, aberta até domingo no Minascentro, com entrada franca.
Depois de assistir a uma oficina básica de criação de orquídeas, a estudante Down Paula Maria Franco Dias, de 19 anos, qualificou como sendo “fácil” tratar das orquídeas, uma das flores de cultivo mais exigentes e que brota uma única vez no ano. “Precisa molhar todos os dias. É só isso”, conta a jovem. Ao lado dela, estava a espevitada Isabella Zollini, de 29, que tampouco vê segredos na natureza. “Vamos supor que daqui (do Minascentro) eu vou para a academia. Depois, chego em casa e já vou molhar as plantas”, conta ela, que mantém todos os compromissos firmados – uma característica dos portadores da síndrome –, segundo a mãe Luzia Zollini, presidente da Família Down.
Mais calada, a dançarina Stephanie Mary Costa, de 23, costuma ajudar a mãe dela, a dona de casa Cleide Maria Gonçalves Costa, a cuidar do quintal da casa onde moram, no Bairro Belmonte. “Minha filha tem muito capricho com o jardim, mas, às vezes, tenho de segurar para não jogar muita água”, afirma a mãe. Após prestar atenção na palestra sobre orquídeas, que orientou basicamente sobre a importância de dosar a água, a luz e a comida das plantas, Stephanie finalmente decide dar sua opinião. “Acho mais bonitas as flores da minha casa”, disse ela, com especial preferência pelo canteiro de rosas brancas, amarelas e cor-de-rosa, lembrando que tem de ter cuidado com os espinhos.
Em vez de ficarem impressionados com as orquídeas, os especialistas nas flores raras é que se mostraram encantados com as atitudes das pessoas com Down. “Sou palestrante há mais de 10 anos e já dei palestras para mais de 10 mil pessoas, mas nunca tinha lidado com uma plateia assim, de tamanha pureza, com tanta transparência”, entregou o palestrante Luiz Carlos Valentini, colecionador de orquídeas ao longo de 27 anos, com mais de 1 mil unidades. Ele afirma ter herdado o “dedo verde” da mãe, que costumava criar plantas em dedais. “Cuidar de uma planta requer muita atenção, exercício da tolerância e o cultivo da paciência”, ensina.