Mariana – A força da onda de rejeitos que desceu após o rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana, na Região Central de Minas, foi capaz de causar efeitos que impressionam até quem está acostumado a enchentes e enxurradas, inclusive especialistas em fenômenos hidrológicos. Além de atingir mais de 15 metros de altura, o tsunami, ao invadir o Rio Gualaxo do Norte, não apenas desceu pela calha, como se poderia prever: ignorou a correnteza do curso d’água que nasce em Ouro Preto, subindo por mais cinco quilômetros e meio e destruindo uma ponte que estava no caminho. Para mostrar a extensão desse estrago, a equipe do Estado de Minas percorreu o leito, passando por curvas formadas por matas densas, até o ponto máximo em que a lama subiu, a uma elevação de 21 metros do local onde a onda atingiu o Gualaxo do Norte, em Bento Rodrigues, distrito mais arrasado de Mariana. Para se ter uma ideia, esse tipo de evento corresponde a um cheia com período de retorno de 10 mil anos. Ou seja, a cada ano há chance de 0,01% de uma concentração de chuvas conseguir reunir tanta água, segundo dados do Ibama.
No local de impacto da onda de rejeitos, a lama ainda é espessa e por isso não há como transitar com segurança. Para encontrar o ponto máximo de avanço da cheia, é preciso seguir pela antiga estrada que ligava Mariana aos distritos de Bento Rodrigues e Camargos, rio acima, e só então descer em uma das pontes de madeira sobre o curso d’água. Esse ponto se encontra a aproximadamente 12 quilômetros da nascente, localizada na área da Mina de Timbopeba, da Mineradora Vale.
Nos primeiros metros de avanço, em um dia de estiagem do último mês chuvoso (abril), a profundidade da água variava de 30cm a cerca de meio metro. O fundo do rio é pedregoso, composto por seixo rolado, fragmentos de rocha que foram arrendondados pela correnteza ao longo dos anos. Uma areia espessa ainda contém alguma concentração de minério de ferro, abundante na região e que torna a água turva em alguns pontos. Apesar disso, há trechos de água límpida, onde se vê com facilidade o fundo do rio. A flora aquática visível é composta por algumas concentrações de líquens e algas verde-escuro, principalmente nos remansos e curvas.
Peixes e outros animais aquáticos não foram vistos, apenas aranhas e insetos que cruzam as águas pela superfície. Nas margens, por outro lado, na areia fina se avistam pegadas de animais de vários portes. Há também lixo, ainda que em pequena quantidade, preso às raízes de árvores e bancos de areia, como garrafas de plástico, calçados velhos e até um pneu.
Depois de um quilômetro descendo entre gargantas de pedras que sustentam uma mata fechada é que se começa a ver marcas da lama da mineração, de coloração mais escura e mais fina que a areia, por esse motivo mais movediça. Nos pontos mais altos, parece que a própria força do rio conseguiu limpar a sujeira que se depositou já sem força, deixando apenas alguns bolsões pelo caminho.
Uma cerca de madeira retirada da própria vegetação, usando arbustos e folhas como uma espécie de rede, foi construída – não se sabe por quem – aparentemente na esperança de deter o avanço da sujeira. Mais alguns metros abaixo e a lama já é evidente, tomando completamente as margens e a calha do rio. A partir daí, o avanço a pé se torna muito difícil, uma vez que o material depositado em grande volume não suporta o peso do corpo, que atola até os joelhos, tanto nas margens quanto no fundo do rio. Depois de cerca de 200 metros, o avanço só pode se dar a nado, mas é nítida a devastação que a lama provocou, tornando inviável prosseguir. Nesse ponto, nada mais de sinais de animais ou vegetação: o rio se torna um caminho de lama homogênea e sem vida.
Consultoria definirá ações de recuperação
A Samarco informou que uma empresa especializada em impactos ambientais foi contratada para traçar um plano de recuperação ambiental das áreas degradadas pela lama de rejeitos de minério. “A empresa realiza análises do material ao longo do rio, para determinar a melhor solução ambiental para o rejeito. Isso é preciso, porque não existem acessos em algumas situações. Se tentarmos remover o rejeito da margem, podemos causar um impacto ainda maior. Por isso, pode ser mais interessante procurar plantios, conformações, recuperar sem remover. Em outros locais, vamos retirar e decidir como e para onde levar o rejeito”, disse o diretor de Projetos e Ecoeficiência da mineradora, Maury de Souza Júnior.
O trabalho dos especialistas, segundo o diretor, começou em dezembro e deve ficar pronto em julho. “Está dentro do acordo firmado com a União e os estados de Minas Gerais e do Espírito Santo. Após apresentarmos os estudos é que será definido em quanto tempo retiraremos rejeitos e recuperaremos outras áreas”, acrescentou.
Algumas medidas já vêm sendo tomadas, como o plantio em baixadas e planícies onde o rejeito se espraiou pela Bacia do Gualaxo do Norte. “Identificamos áreas críticas e fizemos plantio de vegetação de leguminosas e gramíneas, que têm crescimento rápido e podem ajudar a estabilizar esse material, para que não corra com enxurradas para dentro do rio novamente. Plantamos 740 hectares, do total de 800 hectares identificados no rio”, disse o representante da mineradora. A Samarco destaca ainda que, dentro do acordo com estados e União, foram traçados 41 programas, sendo 18 iniciativas ambientais e 23 de cunho social.