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Estado de Minas

Colégio de BH cria dia de conscientização e combate ao bullying

Escola quer incentivar alunos sobre o problema, além de incentivá-los a cuidar uns dos outros. Objetivo é evitar agressões físicas ou psicológicas na rotina de crianças


postado em 03/05/2016 06:00 / atualizado em 03/05/2016 09:53

Mariana Beatriz e Gabriel Souza leem as palavras deixadas no varal do colégio depois de passarem pela experiência de se transformarem em
Mariana Beatriz e Gabriel Souza leem as palavras deixadas no varal do colégio depois de passarem pela experiência de se transformarem em "anjos" dos colegas (foto: Rodrigo Clemente/EM/D.A PRESS)
No varal de cartinhas, palavras positivas. Nos abraços e afagos entre colegas, o sentimento é de companheirismo. No ambiente escolar, a arma para combater ataques gratuitos, ofensas e achaques é a informação. Afinal, isso não é brincadeira. Pelo contrário. Na luta para combater o bullying e a violência na escola, um colégio de Belo Horizonte instituiu o Dia B: Dia do Bem contra o bullying, com várias ações para conscientizar os alunos sobre o problema e incentivá-los a perceber e a cuidar do outro. Somente no ano passado, a Safernet Brasil, organização não-governamental (ONG) referência nacional no enfrentamento aos crimes e violações aos direitos humanos na internet, registrou transgressões envolvendo 1.862 crianças, adolescentes e adultos.


A primeira atividade na escola foi um sorteio entre os alunos, que dava a cada um uma nobre missão. Ao tirar o papel, eles assumiam o compromisso de ser o “anjo” do colega ali indicado e, assim, a obrigação de prestar atenção em cada passo e atitude dele. Era preciso identificar características positivas e ver no outro o melhor. No segundo dia, os estudantes levaram brinquedos. Proibido qualquer eletrônico. A ideia era juntar a meninada e fazer a farra juntos. No terceiro dia, escreveram mensagens que permitissem aos outros identificar o amigo secreto. Por fim, ele foi finalmente revelado durante um lanche coletivo, em que cada menino levou algo para ser compartilhado com toda a turma.

“É preciso que eles entendam que a minha ação gera no outro uma sensação que pode ser boa ou ruim. Brincadeira é quando todos se divertem e são felizes. Se uma pessoa não gosta, não é mais brincadeira”, afirma a coordenadora de formação do 4º e do 5º ano do ensino fundamental do Colégio Magnum Nova Floresta, Carolina Fontana, idealizadora da iniciativa. Segundo ela, não há registros de casos de bullying na escola. “Trabalhamos na mediação de conflito entre os alunos para ele não se tornar algo mais sério”, diz.

Uma das atividades no Magnum, na Região Nordeste de BH, foi a palestra do policial federal Johnny Wilson Batista Guimarães, mestrando em processo penal. Com material da Safernet Brasil e sua experiência em campo, ele falou sobre o ciberbullying e o sexting (envio e compartilhamento de conteúdo erótico na rede mundial de computadores). Ele explica que, no primeiro caso, não necessariamente uma característica especial do adolescente, serve como ponto de partida para o achaque. Basta que a pessoa “caia nas graças dos outros” para o problema começar.

“Antes, isso ocorria em grupo reduzido. Hoje, com as redes sociais, é potencializado. É um problema mundial”, diz. Ele chama a atenção, no entanto, para os excessos: “É necessário saber orientar os meninos para evitar a prática, mas não pode vulgarizar, dizendo que tudo no dia a dia no universo estudantil é ciberbullying”. Sobre o sexting, a dica também é valiosa: “Sem ser repressor, abordo nas palestras o cuidado e o filtro que os adolescentes devem ter na divulgação de imagem de si próprios. Não podem aceitar qualquer amigo como amigo, pois é diferente curtir o amigo na vida real e virtual. É preciso se proteger no ambiente virtual, não se expor demais”.

O levantamento da Safernet mostra que o maior número de casos recebidos pelo serviço é relacionado a imagens de nudez e sexo compartilhadas sem consentimento (Nudes). Ano passado, foram 322 casos, um aumento de 43,75% em relação a 2014.

JUSTIÇA Na Polícia Civil, o titular da Delegacia de Combate aos Crimes Cibernéticos, Júlio Wilker, lembra que bullying é um termo genérico e ganha no código penal as devidas tipificações, como injúria, difamação, calúnia. Mas, mesmo atos não considerados crimes, como uma ofensa, podem ter a reparação buscada por meios judiciais na esfera cível. “Os crimes cometidos na internet e nas redes sociais têm aumentado muito, porque houve a popularização desses instrumentos. O mundo digital acaba sendo de fácil e livre acesso. Como o indivíduo não está diante de alguém pessoalmente, se sente mais confortável para emitir opinião ou ofensa”, afirma. O delegado ressalta ainda os vários casos de constrangimento de adolescentes que tiveram fotos nas quais estavam nus vazando pela internet. “A relação com a escola é grave, pois esse é o ambiente onde essa foto está circulando”, diz. A corporação não tem levantamento de casos de bullying, pois as ocorrências são tratadas com as devidas tipificações.

Maria Antônia (em pé) revela características de seu protegido, Lucas Chaves (à esquerda, entre a meninas):
Maria Antônia (em pé) revela características de seu protegido, Lucas Chaves (à esquerda, entre a meninas): "Descobri alguém muito legal" (foto: Rodrigo Clemente/EM/D.A PRESS)


Anjos que ensinam


A menina Maria Antônia Nunes Resende Cota, de 10 anos, aluna do 4º ano do Colégio Magnum, não tinha proximidade com o colega Lucas Soares de Miranda Chaves, de 9. Mas foi o anjo dele durante alguns dias. E, ao revelar seu protegido, os colegas logo o identificaram quando ela mencionou algumas características, como “uma pessoa divertida e que faz piada toda hora na sala”. “Nunca falei muito com ele nem brincávamos juntos. Descobri alguém muito legal”, disse. Ele logo suspeitou que seu anjo era uma menina, por causa da grafia dos bilhetinhos gentis deixados em sua mesa: “Não a conhecia, mas acho que poderemos ser amigos agora”.

Estudante do 5º ano, Mariana Beatriz Lara e Souza, também de 10, já tinha lido sobre bullying no livro de português, porém confessa que aprendeu muito mais. Ela, que já foi chamada em outra escola de “rainha dos macacos”, por adorar comer banana todos os dias, conseguiu, enfim, ver a diferença: “Isso nunca me incomodou, mas agora tenho certeza que era uma brincadeira e não algo mais sério”. Para a novata do Magnum, ser anjo foi uma experiência e tanto: “Tirei um menino que eu não conhecia bem. Sou mais amiga dele depois disso”.

PRESAS FÁCEIS Gabriel Souza, da mesma idade, aluno do 4º ano, diz que o pai fica no pé para saber o que ele vê na internet e com quem conversa. “Na internet, as pessoas colocam coisas falsas, que podem ser bullying. Fazem isso por acharem que não há ninguém olhando as crianças, que podem ser presas fáceis”. O anjo de Gabriel foi um de seus melhores amigos. Ele, por sua vez, protegeu e prestou atenção num novato. “Comecei a conversar mais com ele. Isso foi muito profundo e uma grande descoberta.” (JO)

Enquanto isso...

… Lei não estabelece sanção


Sancionada no fim de 2015 e em vigor desde o início de fevereiro, a Lei Federal 13.185 estabelece o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying) em todo o país. A nova norma caracteriza claramente as situações de agressão física, psicológica e moral que podem ser consideradas bullying e estabelece regras para definir casos de intimidação promovidos por meio da internet. Escolas terão que notificar as autoridades os casos de intimidações sistemáticas ocorridos no ambiente educacional, cabendo aos estados e municípios produzir relatórios bimestrais sobre essas ocorrências. A legislação abrange também clubes recreativos. Mas não estabelece punição aos agressores nem a quem deixar de cumprir a notificação. Já em Minas, está em andamento na Secretaria de Estado de Educação proposta de criação de um módulo dentro do Sistema Mineiro de Administração Educacional (Simade) para o registro dos casos de violência pelas escolas, inclusive do bullying, por meio do qual poderá ser feito o monitoramento e acompanhamento das instituições de ensino.


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