Apenas a capital tem as seções especializadas e acumula hoje 25 mil processos, ou seja, mais de 6 mil causas, cada uma. No interior, onde os casos de agressão sexual conseguem ultrapassar a vergonha da vítima, eles vão para varas comuns e são julgados com todos os demais processos, como os de homicídio, latrocínio, tráfico de drogas, roubos, furtos, entre outros. Somados com os feitos da capital, Minas tem hoje cerca de 110 mil processos de todo tipo de violência, inclusive os casos de abuso sexual.
Outro agravante: mesmo em Belo Horizonte, onde as medidas protetivas são concedidas em até no máximo 48 horas, há o gargalo para executar a decisão judicial, tendo em vista que são apenas oito oficiais de justiça para comunicar todos os agressores da proibição de aproximação da vítima, entre outras regras determinadas pelo juiz. “É um número pequeniníssimo diante de uma região tão grande.
Tivemos uma reunião recente com eles, que nos relataram rodar quase 200 quilômetros por dia para intimar o agressor, que muitas vezes nem é encontrado. Isso porque, quando ele descobre que tem alguém procurando por ele, esse homem desaparece”, afirma a superintendente da Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (Comsiv) do TJMG, desembargadora Evangelina Castilho Duarte. Ela ainda afirma que ao saber da decisão judicial, muitos agressores ficam ainda mais violentos.
A Lei Maria da Penha (Lei 11.340) foi criada em 2006 e aumenta o rigor das punições de crimes domésticos de toda natureza, incluindo estupros. A legislação foi um marco na proteção das mulheres vítimas de violência e também para a implantação das varas especializadas, apesar de elas só começarem a ser criadas a partir de 2012 em BH.
Evangelina Castilho conta que o TJ tem um projeto em tramitação para ampliar a rede, mas ainda sem data para ser colocado em prática. “A proposta é para especialização de uma das varas criminais – onde houver no mínimo duas – para que uma delas seja específica para a Lei Maria da Penha. Isso permitiria uma ampliação em cerca de 80 varas”, afirma a desembargadora. O processo, no entanto, ainda está em análise na Comissão de Organização Judiciária do TJ e depende de manifestação da Corregedoria de Justiça, bem como do aval da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Além disso, o avanço do sistema ainda esbarra no corpo técnico. “Para tudo isso e muito mais acontecer é preciso investimento, concursos públicos para juízos, delegados e muitos outros profissionais. Também são necessários recursos para criação de mais órgãos especializados, como delegacias de mulheres espalhadas pelo estado”, diz.
De olho no cenário atual, Evangelina admite a fragilidade no atual modelo de distribuição dos processos de violência sexual, bem como no julgamento dessas ações. Na capital, o tempo médio para a sentença é de um ano, o que pode ser mais demorado no interior. “São casos que não podem esperar. E, no interior, principalmente, são levados para um único juiz que tem milhares de outras ações. Com isso, a agilidade do julgamento fica comprometida. Outro problema é que os próprios juízes têm dificuldades para julgar processos comuns e os da Lei Maria da Penha”, destaca a magistrada. Segundo ela, o tribunal tem feito cursos e treinamentos presenciais e a distância com juízes, para minimizar esse problema.
A especialização das varas para atender melhor a mulher agredida torna-se ainda mais urgente diante de uma nova realidade. Com base no número de feitos distribuídos na varas especializadas, Evangelina diz perceber que cada vez mais as mulheres estão tendo certeza de que podem buscar proteção na Justiça.
INEFICAZ Ao falar sobre as medidas protetivas, a desembargadora afirma que as decisões são muito boas, mas o controle delas ainda é ineficaz. Em Minas, o homem usa uma tornozeleira que indica a aproximação dele dos locais por onde a vítima circula habitualmente, como sua casa ou o trabalho. “Isso é monitorado pela polícia. Mas, o ideal é que ela tenha um botão do pânico”, defende..