O conjunto moderno da Pampulha agora faz parte de um grupo seleto formado por centenas de bens culturais mundo afora. Merecem destaque nesse grupo as Muralhas da China, as Pirâmides do Egito, o Palácio de Versalhes, na França, o Taj Mahal, na Índia, e a cidade de Cuzco, no Peru. No Brasil, há agora 20 sítios destacados pela Unesco – 12 na categoria patrimônio cultural e sete na de patrimônio natural. Minas é o estado com maior número de bens inscritos. Entre os representantes mineiros, a Pampulha, única modernista, está agora ao lado dos centros históricos de Ouro Preto e Diamantina e do Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas.
O primeiro impacto do título de Patrimônio Cultural da Humanidade obtido pela Pampulha deverá ser no turismo, prevê o arquiteto e historiador Leônidas Oliveira, presidente da Fundação Municipal de Cultura (FMC) e Belotur, ambos vinculados à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH). “Desde que aumentou a mobilização em torno da candidatura do conjunto moderno, a visitação aumentou 35%”, constata. Ele diz que, conforme pesquisa, 60% das pessoas que chegam à capital visitam a Pampulha, com destaque para a Igreja de São Francisco de Assis, uma das joias projetadas por Oscar Niemeyer, com jardins planejados por Burle Marx, murais e quadros da via-sacra, interna, de Cândido Portinari, além dos mosaicos externos de Paulo Werneck. No caso dos estrangeiros, o número sobe para 83%.
Empenhado na campanha de candidatura da Pampulha iniciada já quatro anos – em 1996 houve uma tentativa, embora sem resultados –, Leônidas explica que a decisão da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) representa um cartão de visitas para a cidade. “É um título muito potente, vigoroso e poderoso para atrair turistas e isso ocorre em todos os bens culturais reconhecidos. Pela importância para a humanidade, a Pampulha está no mesmo patamar das pirâmides do Egito e da arte barroca de Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, presente em Congonhas e Ouro Preto”, afirma.
O destino de muitos turistas que chegam a Minas é Ouro Preto, mas, ao ter um “patrimônio do mundo” reconhecido, a situação de BH pode mudar. No mundo, há apenas 8% de bens modernos protegidos e a Pampulha tem os projetos de Niemeyer, que deixou registrado, como lembra Leônidas: “A Pampulha foi onde tudo começou”. Para garantir a proteção, especialmente quanto às construções no entorno, ele ressalta que os bens são tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e artístico Nacional (Iphan), Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha) e Conselho Deliberativo Municipal do Patrimônio cultural, além de a Pampulha ser uma Área de Diretrizes Especiais (ADE).
DE PERTO De ônibus de turismo, de carro, a pé ou de bicicleta. Sozinhos, em família ou em grupos enormes. A todo momento, visitantes chegam à Pampulha e não se cansam de enaltecer suas características modernistas. As pernambucanas Marlene José dos Santos, funcionária pública, e Lígia Andrade Sukar, professora universitária, se prepararam bem antes de chegar a BH. “Li um livro sobre a história de Juscelino Kubitschek, e, de perto, vejo esse conjunto como uma obra grandiosa”, disse Lígia, com o semblante que demonstra encantamento. “É minha primeira vez aqui e estou admirada com a arborização e as construções da década de 1940”, acrescentou Marlene. No mesmo grupo, a alagoana Nelita Maria da Silva não se cansava de admirar a capela à beira do lago e comentar sobre sua beleza.
Vindas de Santa Catarina, as amigas Deyse Koth, arquiteta, e Bárbara Nasato, designer de interiores e estudante de arquitetura, gostaram do que viram. Para Deyse, que visita pela segunda vez o conjunto moderno, o título é muito importante para BH. Bárbara, pela primeira vez no complexo, acrescenta: “É muito bom chegar caminhando, sentir o impacto de um lugar tão lindo”.
Aos olhos dos estrangeiros, a Pampulha ganha outra dimensão. Atenta aos detalhes da Igreja de São Francisco, a norte-americana Lee Ann Custer, de 29, faz pesquisas para a tese de doutorado em história da arte, na Universidade da Pensilvânia. “A obra de Niemeyer é muito famosa. Acho tudo muito bonito, a Casa do Baile, a igreja... Cada edificação é única, não há um lugar no mundo igual a este”, constatou a jovem de olhos verdes, também fazendo estudos sobre a arte colonial mineira.
VALOR Representante da Unesco no Brasil, o francês Lucien Muñoz também acredita em aumento do turismo: “O valor excepcional e universal suscita de imediato o interesse da comunidade internacional – e também nacional – em conhecer e visitar determinado bem. Há novos holofotes sobre o sítio e essa mudança na forma de ver o bem certamente desperta novos fluxos de turismo que, por sua vez, geram possibilidades para a cidade que o detém”. Segundo Muñoz, com bom planejamento e práticas sustentáveis é possível potencializar alternativas de desenvolvimento local, aliadas a práticas integradas de promoção, educação e preservação patrimonial.
Muñoz explica que o fato de a cidade ou país ter um bem inscrito na lista do Patrimônio Mundial gera de imediato contrapartidas do poder público e seu comprometimento oficial com a preservação do sítio em harmonia com os critérios que o tornaram excepcional. “Enfatizando fortemente o papel das comunidades locais, a inscrição funciona como uma ferramenta eficaz para o monitoramento de diversos desafios contemporâneos, especialmente a urbanização acelerada, que pode acarretar descaracterização.”
EM MINAS Centro Histórico de Ouro Preto, Santuário do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas, Centro Histórico de Diamantina e, agora, o conjunto arquitetônico da Pampulha, em BH.
NO BRASIL Centro Histórico de Olinda (PE), Missões Jesuíticas Guarani, Ruínas de São Miguel das Missões (RS e Argentina), Centro Histórico de Salvador (BA), Plano Piloto de Brasília (DF), Parque Nacional Serra da Capivara, em São Raimundo Nonato (PI),Centro Histórico de São Luiz (MA), Centro Histórico de Goiás (GO), Praça de São Francisco, na cidade de São Cristóvão (SE) e Rio de Janeiro, paisagens cariocas entre a montanha e o mar.
Água: dádiva e desafio
Lançamento de esgoto, lixo, poluição de toda sorte e por todo canto. O espelho d’água da Pampulha nunca refletiu um bom estado de conservação – tanto que, na primeira tentativa de candidatura ao título de Patrimônio Cultural da Humanidade, há 20 anos, a sujeira foi empecilho para levar o sonho adiante, ao lado da degradação do patrimônio. A expectativa da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) é de que, até o fim do ano, as águas estejam na classe 3, o que permite a prática de esportes náuticos.
Em março, a PBH iniciou os trabalhos de recuperação da qualidade da água do reservatório e a análise das primeiras amostras, feitas em abril e em maio, demonstrou que os três primeiros meses de trabalho produziram bons resultados. Foram verificadas reduções importantes nos parâmetros estabelecidos para a avaliação, como o DBO (indicador de presença de matéria orgânica), coliformes termotolerantes (indicador de presença de esgoto e micro-organismos patogênicos), clorofila-A (algas) e fósforo total (esgoto). Em três parâmetros avaliados foram obtidos valores que já atendem às exigências de classe 3.
O objetivo da ação é livrar a lagoa de florações de algas, de mau cheiro e da mortandade de peixes, enquadrando-a totalmente na classe 3, conforme normatização do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Isso permite, por exemplo, a recreação de contato secundário (prática de atividades em que o contato com a água seja esporádico ou acidental e a possibilidade de sua ingestão seja pequena, tais como a pesca amadora e o iatismo).
PRECEDENTE Em 2003, uma ameaça grave pairou sobre Ouro Preto, na Região Central, primeira cidade brasileira declarada Patrimônio Cultural da Humanidade (1980) pelo Unesco, devido à falta de políticas e ações para proteger aquele que é considerado o maior conjunto arquitetônico colonial do país. A população se manifestou, vestiu-se de preto em sinal de luto, até que o trem da preservação voltou aos trilhos. Com o título não é garantia eterna, a administração de Belo Horizonte tem outro grande desafio pela frente: resolver a questão do Iate Tênis Clube, que abriga um anexo de 4 mil metros quadrados inaugurado em 1984 (para abrigar garagem, academia de ginástica e salão), quatro décadas após a construção do clube.
A situação do Iate, que foi desapropriado pela Prefeitura de Belo Horizonte em fevereiro, está sendo analisada pelo Ministério Público de Minas Gerais. O certo mesmo é que, se em três anos o anexo não for demolido, a Pampulha pode perder o título conquistado. “Vamos resolver a questão do Iate e vai ser tudo preto no branco”, avisa o prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda. A direção do clube diz que está aberta à negociação e que sempre apoiou a candidatura da Pampulha. “O Iate foi projetado como clube e deverá continuar assim, embora sem o anexo que o descaracteriza”, observa o presidente da Fundação Municipal de Cultura, Leônidas Oliveira.
O primeiro impacto do título de Patrimônio Cultural da Humanidade obtido pela Pampulha deverá ser no turismo, prevê o arquiteto e historiador Leônidas Oliveira, presidente da Fundação Municipal de Cultura (FMC) e Belotur, ambos vinculados à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH). “Desde que aumentou a mobilização em torno da candidatura do conjunto moderno, a visitação aumentou 35%”, constata. Ele diz que, conforme pesquisa, 60% das pessoas que chegam à capital visitam a Pampulha, com destaque para a Igreja de São Francisco de Assis, uma das joias projetadas por Oscar Niemeyer, com jardins planejados por Burle Marx, murais e quadros da via-sacra, interna, de Cândido Portinari, além dos mosaicos externos de Paulo Werneck. No caso dos estrangeiros, o número sobe para 83%.
Empenhado na campanha de candidatura da Pampulha iniciada já quatro anos – em 1996 houve uma tentativa, embora sem resultados –, Leônidas explica que a decisão da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) representa um cartão de visitas para a cidade. “É um título muito potente, vigoroso e poderoso para atrair turistas e isso ocorre em todos os bens culturais reconhecidos. Pela importância para a humanidade, a Pampulha está no mesmo patamar das pirâmides do Egito e da arte barroca de Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, presente em Congonhas e Ouro Preto”, afirma.
O destino de muitos turistas que chegam a Minas é Ouro Preto, mas, ao ter um “patrimônio do mundo” reconhecido, a situação de BH pode mudar. No mundo, há apenas 8% de bens modernos protegidos e a Pampulha tem os projetos de Niemeyer, que deixou registrado, como lembra Leônidas: “A Pampulha foi onde tudo começou”. Para garantir a proteção, especialmente quanto às construções no entorno, ele ressalta que os bens são tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e artístico Nacional (Iphan), Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha) e Conselho Deliberativo Municipal do Patrimônio cultural, além de a Pampulha ser uma Área de Diretrizes Especiais (ADE).
DE PERTO De ônibus de turismo, de carro, a pé ou de bicicleta. Sozinhos, em família ou em grupos enormes. A todo momento, visitantes chegam à Pampulha e não se cansam de enaltecer suas características modernistas. As pernambucanas Marlene José dos Santos, funcionária pública, e Lígia Andrade Sukar, professora universitária, se prepararam bem antes de chegar a BH. “Li um livro sobre a história de Juscelino Kubitschek, e, de perto, vejo esse conjunto como uma obra grandiosa”, disse Lígia, com o semblante que demonstra encantamento. “É minha primeira vez aqui e estou admirada com a arborização e as construções da década de 1940”, acrescentou Marlene. No mesmo grupo, a alagoana Nelita Maria da Silva não se cansava de admirar a capela à beira do lago e comentar sobre sua beleza.
Vindas de Santa Catarina, as amigas Deyse Koth, arquiteta, e Bárbara Nasato, designer de interiores e estudante de arquitetura, gostaram do que viram. Para Deyse, que visita pela segunda vez o conjunto moderno, o título é muito importante para BH. Bárbara, pela primeira vez no complexo, acrescenta: “É muito bom chegar caminhando, sentir o impacto de um lugar tão lindo”.
Aos olhos dos estrangeiros, a Pampulha ganha outra dimensão. Atenta aos detalhes da Igreja de São Francisco, a norte-americana Lee Ann Custer, de 29, faz pesquisas para a tese de doutorado em história da arte, na Universidade da Pensilvânia. “A obra de Niemeyer é muito famosa. Acho tudo muito bonito, a Casa do Baile, a igreja... Cada edificação é única, não há um lugar no mundo igual a este”, constatou a jovem de olhos verdes, também fazendo estudos sobre a arte colonial mineira.
VALOR Representante da Unesco no Brasil, o francês Lucien Muñoz também acredita em aumento do turismo: “O valor excepcional e universal suscita de imediato o interesse da comunidade internacional – e também nacional – em conhecer e visitar determinado bem. Há novos holofotes sobre o sítio e essa mudança na forma de ver o bem certamente desperta novos fluxos de turismo que, por sua vez, geram possibilidades para a cidade que o detém”. Segundo Muñoz, com bom planejamento e práticas sustentáveis é possível potencializar alternativas de desenvolvimento local, aliadas a práticas integradas de promoção, educação e preservação patrimonial.
Muñoz explica que o fato de a cidade ou país ter um bem inscrito na lista do Patrimônio Mundial gera de imediato contrapartidas do poder público e seu comprometimento oficial com a preservação do sítio em harmonia com os critérios que o tornaram excepcional. “Enfatizando fortemente o papel das comunidades locais, a inscrição funciona como uma ferramenta eficaz para o monitoramento de diversos desafios contemporâneos, especialmente a urbanização acelerada, que pode acarretar descaracterização.”
EM MINAS Centro Histórico de Ouro Preto, Santuário do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas, Centro Histórico de Diamantina e, agora, o conjunto arquitetônico da Pampulha, em BH.
NO BRASIL Centro Histórico de Olinda (PE), Missões Jesuíticas Guarani, Ruínas de São Miguel das Missões (RS e Argentina), Centro Histórico de Salvador (BA), Plano Piloto de Brasília (DF), Parque Nacional Serra da Capivara, em São Raimundo Nonato (PI),Centro Histórico de São Luiz (MA), Centro Histórico de Goiás (GO), Praça de São Francisco, na cidade de São Cristóvão (SE) e Rio de Janeiro, paisagens cariocas entre a montanha e o mar.
Água: dádiva e desafio
Lançamento de esgoto, lixo, poluição de toda sorte e por todo canto. O espelho d’água da Pampulha nunca refletiu um bom estado de conservação – tanto que, na primeira tentativa de candidatura ao título de Patrimônio Cultural da Humanidade, há 20 anos, a sujeira foi empecilho para levar o sonho adiante, ao lado da degradação do patrimônio. A expectativa da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) é de que, até o fim do ano, as águas estejam na classe 3, o que permite a prática de esportes náuticos.
Em março, a PBH iniciou os trabalhos de recuperação da qualidade da água do reservatório e a análise das primeiras amostras, feitas em abril e em maio, demonstrou que os três primeiros meses de trabalho produziram bons resultados. Foram verificadas reduções importantes nos parâmetros estabelecidos para a avaliação, como o DBO (indicador de presença de matéria orgânica), coliformes termotolerantes (indicador de presença de esgoto e micro-organismos patogênicos), clorofila-A (algas) e fósforo total (esgoto). Em três parâmetros avaliados foram obtidos valores que já atendem às exigências de classe 3.
O objetivo da ação é livrar a lagoa de florações de algas, de mau cheiro e da mortandade de peixes, enquadrando-a totalmente na classe 3, conforme normatização do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Isso permite, por exemplo, a recreação de contato secundário (prática de atividades em que o contato com a água seja esporádico ou acidental e a possibilidade de sua ingestão seja pequena, tais como a pesca amadora e o iatismo).
PRECEDENTE Em 2003, uma ameaça grave pairou sobre Ouro Preto, na Região Central, primeira cidade brasileira declarada Patrimônio Cultural da Humanidade (1980) pelo Unesco, devido à falta de políticas e ações para proteger aquele que é considerado o maior conjunto arquitetônico colonial do país. A população se manifestou, vestiu-se de preto em sinal de luto, até que o trem da preservação voltou aos trilhos. Com o título não é garantia eterna, a administração de Belo Horizonte tem outro grande desafio pela frente: resolver a questão do Iate Tênis Clube, que abriga um anexo de 4 mil metros quadrados inaugurado em 1984 (para abrigar garagem, academia de ginástica e salão), quatro décadas após a construção do clube.
A situação do Iate, que foi desapropriado pela Prefeitura de Belo Horizonte em fevereiro, está sendo analisada pelo Ministério Público de Minas Gerais. O certo mesmo é que, se em três anos o anexo não for demolido, a Pampulha pode perder o título conquistado. “Vamos resolver a questão do Iate e vai ser tudo preto no branco”, avisa o prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda. A direção do clube diz que está aberta à negociação e que sempre apoiou a candidatura da Pampulha. “O Iate foi projetado como clube e deverá continuar assim, embora sem o anexo que o descaracteriza”, observa o presidente da Fundação Municipal de Cultura, Leônidas Oliveira.