Aproveitando o semáforo ainda verde, o ônibus articulado do BRT/Move acelera na descida em curva e, ao passar repleto de passageiros pela rampa da Avenida Dom Pedro I, dá a sensação de que seus dois segmentos vão se desprender com o impacto da manobra. No visor do radar de velocidade, o coletivo marca 73km/h, 22% acima dos 60km/h máximos fixados na sinalização da avenida. Dois anos e 27 dias depois da pior falha construtiva viária de Belo Horizonte, quando o Viaduto Batalha dos Guararapes ruiu, matando duas pessoas, ferindo 23 e fechando a Pedro I por mais de seis meses, aquele trecho da avenida, entre as ruas General Olímpio Mourão Filho e Moacyr Froes, ainda traz perigo para passageiros do transporte coletivo, motoristas e pedestres. Mas, agora, pela imprudência dos condutores. Um comportamento que tem sido alvo de reclamações e foi comprovado pela reportagem do Estado de Minas tanto em corredores exclusivos e pistas normais quanto praticado pelos demais ônibus da BHTrans, pelos metropolitanos e até os da Conexão Aeroporto (Confins).
De acordo com a BHTrans, os coletivos que trafegam nos corredores exclusivos do BRT/Move devem respeitar o mesmo limite de velocidade que os motoristas das pistas mistas. Mas a existência de apenas seis radares de controle de velocidade nos 54,46 quilômetros de vias exclusivas não tem inibido o desrespeito a essas regras. Na Avenida Pedro I, os únicos ônibus que trafegam dentro da velocidade permitida são os que arrancam de semáforos para subidas, os que se encontram em comboio ou que ficam retidos no tráfego do Move.
A situação é ainda mais grave nos locais onde a velocidade máxima não pode ultrapassar os 40km/h. No corredor da Avenida Presidente Antônio Carlos, por exemplo, os veículos devem desacelerar a até 40km/h para fazer a curva fechada que leva à Estação de Integração Pampulha, mas muitos coletivos entram tão rápido na pista que dão a impressão de que vão tombar. No sentido contrário, a placa de velocidade reduzida serve para auxiliar a travessia de pedestres pela avenida, mas da mesma forma o limite é completamente ignorado pelos motoristas de ônibus. Nesses dois trechos, a equipe do EM constatou ônibus chegando a desenvolver 57km/h, 42,5% acima do limite estabelecido pela BHTrans.
Ameaça
Nos bairros, as vias estreitas, curvas fechadas e locais de travessias para escolas, creches, igrejas e outros pontos de concentração de pedestres também não têm os limites respeitados pelos condutores de coletivos. No Padre Eustáquio, na Região Noroeste, por exemplo, tanto na via principal que leva o mesmo nome do bairro quanto na Rua Rio Pomba, uma das mais movimentadas, os limites de 40km/h em locais sensíveis para travessias de pedestres são solenemente ignorados. “A gente sai sacudindo dentro dos ônibus e tem de se segurar firme para não bater o rosto no banco da frente ou até cair. Mulher com criança pequena no colo tem de se agarrar rápido e sentar, porque os motoristas mal esperam a porta do ônibus fechar e já arrancam com tudo”, reclama a publicitária Mariana Ocelli, de 28 anos.Enquanto falava, ela reagia com reprovação ao observar os ônibus passando em alta velocidade no trecho estrito em frente de uma escola na Rua Rio Pomba. Ali, a velocidade não deveria passar de 40km/h, mas a equipe de reportagem chegou a registrar 72km/h, 80% acima do permitido. “Estamos precisando de fiscalização. Os ônibus correm tanto que vira e mexe nos deixam para trás nos pontos, para não ter de reduzir. Para os idosos é pior ainda, porque não têm tempo de reação. E este é um bairro de idosos que tem muitos centros de atendimento de saúde e do INSS. Acidentes também são frequentes, já que os carros que cruzam a rua precisam entrar bastante na via”, critica Mariana.
No Bairro Eymard, Região Nordeste, a Rua Janete Helena tem uma descida de inclinação tão forte que, de acordo com a BHTrans, não pode sequer ter um quebra-molas instalado. Contudo, a via, que corta uma das únicas praças com brinquedos para crianças e equipamentos de ginástica, uma escola e uma creche, se tornou ponto de aceleração para os coletivos. A reportagem chegou a registrar um ônibus descendo a 57km/h no trecho de 40km/h, superando em 42,5% o limite regulamentado. “Os ônibus descem diariamente a rua em alta velocidade. Ontem mesmo (segunda-feira) meu menino estava soltando papagaio na praça. O papagaio caiu na rua, ele correu para pegar e quase foi atropelado pelo ônibus, que nem freou. Na minha casa são quatro filhos e não tenho sossego para ficar com eles na pracinha. E não adianta falar, porque todo mundo que tem filhos já reclamou com a empresa, com os motoristas e eles continuam a abusar”, disse o ajudante de pedreiro Edson Carvalho Vieira, de 43.