Jornal Estado de Minas

Samarco admite falha na barragem que causou tragédia em Mariana

- Foto: Arte EMDez meses após o rompimento da Barragem do Fundão, as causas da tragédia foram apresentadas ontem pela Samarco, dona do reservatório localizado em Mariana, na Região Central de Minas. O estudo feito por um corpo técnico de quatro especialistas foi contratado pela mineradora e pelas empresas Valle e BHP Billiton e apontou uma série de erros iniciados em 2009, que não foram solucionados, apesar de obras, que se mostraram ineficientes. Os problemas têm início no sistema de drenagem da barragem, o que levou à entrada de lama em áreas não previstas, e são agravados pelas obras de alteamento do maciço. Por causa da lama acumulada na ombreira esquerda, o recuo foi feito nesse ponto sobre uma base de lama, portanto instável. Por fim, três pequenos abalos sísmicos ocorridos 90 minutos antes da tragédia funcionaram como gatilho para o processo de rompimento, que já estava bastante avançado, como ficou constatado na investigação particular, nomeada de Painel de Revisão da Barragem de Rejeitos de Fundão. De acordo com o Ibama, 50 milhões de metros cúbicos de rejeitos vazaram da barragem varrendo comunidades e causando inúmeros danos ambientais na Bacia do Rio Doce, até chegar ao Oceano Atlântico. Dezenove pessoas morreram vítimas da tragédia e mais de 700 ficaram desabrigadas.

O resultado do painel foi apresentado ontem por meio de videoconferência e as informações foram repassadas pelo engenheiro civil responsável pelas investigações, Norbert Morgenster, que está no Canadá. As conclusões do estudo contêm semelhanças com as causas apontadas no inquérito da Polícia Civil, apresentado em fevereiro, e se baseiam em três perguntas chaves: por que ocorreu o fluxo fluido de rejeitos?; por que ele ocorreu naquele local?; por que o rompimento ocorreu naquele 5 de novembro de 2015.?

Como resposta aos questionamentos, o especialista explicou que os problemas começaram no sistema de drenagem da barragem, com entrada de lama em áreas não previstas.
O projeto original era depositar areia atrás do dique de partida e depois realizar o alteamento pelo método à montante para aumentar, de forma progressiva, a capacidade de armazenamento da barragem. A areia deveria conter a lama depositada de forma que os dois materiais não se misturassem e, para isso, uma “praia de areia”, de 200 metros de extensão, foi criada. Essa era a largura necessária para evitar que a lama chegasse próximo à crista da barragem, onde impediria a drenagem.

Os primeiros erros começaram a surgir em 2009, um ano após o início da construção de Fundão. Na época, foram constatados defeitos de construção no dreno de fundo, que resultaram em revisão do projeto inicial para reparo, em 2010. O novo projeto previa a construção de um tapete drenante destinado a controlar a saturação do reservatório.

Ainda assim, em 2011 e 2012, enquanto o novo projeto estava sendo construído, houve um segundo incidente com a lama, com água chegando a apenas 60 metros da crista da barragem e não a 200 metros, como estava previsto com a criação da “praia de areia”. Com isso, a lama novamente se depositou em áreas indevidas. No final de 2012, mais problemas durante o processo de alteamento da barragem.
Quando uma galeria do sistema de drenagem se mostrou estruturalmente deficiente e incapaz para suportar mais carga e, por isso, precisaria ser preenchida de concreto e desativa, o alinhamento da barragem na ombreira esquerda foi deslocado de sua posição para que as operações em Fundão fossem mantidas. Esse processo colocou o maciço diretamente em cima das lamas depositadas anteriormente, o que criou condições para que o processo de liquefação ocorresse.

Mesmo assim, as obras para alteamento continuaram e, em 2013, novas intervenções precisaram ser feitas para reparo de trincas na ombreira esquerda. No ano seguinte, o tapete drenante construído ao longo de 2011 e 2012 chegou à sua capacidade máxima e as lamas por baixo do maciço aceleraram o processo de liquefação da massas de areia depositadas acima desse material.

Murilo Ferreira, Dean Valle e Roberto Carvalho lamentaram mortes e prometeram assistência às vítimas e recuperar o meio ambiente - Foto: Juarez Rodrigues/EM/DA PressABALOS Em 5 de novembro, um fator a mais contribuiu para o rompimento. De acordo com o resultado do painel, três pequenos abalos sísmicos registrados 90 minutos antes da tragédia funcionaram como gatilho para que a barragem se rompesse. “A modelagem do computador mostrou que as forças do terremoto produziram um incremento adicional de movimento horizontal nas lamas, que afetou de forma correspondente as areias sobrepostas. Esses movimentos adicionais, embora bem pequenos, e associados a grandes incertezas, provavelmente aceleraram o processo de rompimento, que já estava bastante avançado”, informa o documento, que segundo as contratantes, não apontou responsáveis ou atribuiu culpa, nem mesmo fez apontamentos se a Samarco seria capaz de evitar a tragédia.

Os representantes das três empresas estiveram presentes durante a apresentação do resultado do inquérito, mas não deram entrevista à imprensa. Diretor-presidente da Samarco, Roberto Carvalho se limitou a dizer que lamentava os danos causados ao meio ambiente e às vítimas e a comentar o trabalho. “Estamos empenhados em analisar os resultados e compartilhar com outras empresas para que tragédias dessa natureza possam ser evitadas em todo o mundo”.
Assim como ele, o diretor-presidente da Valle, Murilo Ferreira, pediu desculpas às famílias das vítimas e afirmou que todas as empresas estão comprometidas com a recuperação ambiental e a assistência aos atingidos pela tragédia.
.