Memória afetiva, histórias de família e objetos que passam de geração a geração – sem perder a ternura, jamais. Quem assistiu ao filme Aquarius, em cartaz na capital, certamente notou uma cômoda que pertencera ao quarto de uma mulher libertária, Lúcia, e, décadas depois, à sala de visitas da sobrinha querida, Clara, interpretada pela atriz Sônia Braga. Testemunha de cenas de amor, de festas, encontros da parentada e de outras celebrações, o móvel de madeira com gavetas ganha destaque em cena para mostrar sua importância na trajetória de cada personagem. Em Belo Horizonte, a vida imita a arte e a arte imita a vida: com desvelo e senso de história, pais, filhos e netos preservam mobília e objetos de antepassados, certos de que, além de boas recordações, mantêm a unidade familiar e trazem boas energias.
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Juliana ainda não viu o filme Aquarius dirigido pelo pernambucano Kléber Mendonça Filho, mas pretende assisti-lo tão logo seja possível.
DUAS GERAÇÕES Aos 90 anos, Dóris de Jesus Lima de Sá Fortes, viúva, mantém lucidez invejável, bom humor e muita alegria de viver. Natural de Diamantina, no Vale do Jequitinhonha, e residente em BH há mais de 60 anos, a simpática senhora acomoda, na sala de visitas da casa no Bairro Gutierrez, na Região Oeste, quatro cadeiras de palhinha, com desenhos de flores em marchetaria, e um móvel decorativo de madeira escura. O conjunto de cadeiras pertenceu ao bisavô do seu marido, José Antônio de Sá Fortes, proprietário da Fazenda Monte Belo, em Barbacena, enquanto a mesa foi da mãe dela, Nayde Lobato.
“É uma lembrança de família.
RETRATOS Muitas pessoas preferem dispor de móveis e outros objetos, entregar para antiquários, enfim, passar adiante o que herdaram. Não é o caso da aposentada Therezinha Rebelo, solteira, moradora do Bairro Santo Antônio, na Região Centro-Sul. Na sala do apartamento, ela alinha cuidadosamente os porta-retratos com registros da família, sobre um móvel de peroba-do-campo, que era da mãe, Matilde.
Cada retrato traz uma história: pais e filhos juntos, passeios em meados do século passado na Avenida Afonso Pena, “em frente a Igreja de São José”, abraços nos pais Francisco e Matilde e carinho de irmãos. “O tempo passa, hoje ficamos só eu e meu irmão Hercílio”, revela, com uma pontinha de saudade.
Na sala de jantar, a aposentada mostra uma sopeira de porcelana branca com desenhos escuros. Está tudo perfeito, nada quebrado, tem a tampa e a concha. “Era um aparelho de jantar enorme. Ficaram só a sopeira e alguns pratos. Há muitos anos, meus pais ofereceram um jantar. Depois que tudo foi lavado e posto para secar, houve uma surpresa desagradável, pois a maior parte se quebrou”, conta.
O episódio, no entanto, não serve para tirar as melhores lembranças. “Era um tempo tão bom, de alegria e família reunida. O que temos hoje nos ajuda a manter a família mais perto”, faz questão de ressaltar..