Jornal Estado de Minas

Ônibus que param fora do ponto lideram queixas de passageiros em BH

Clebson Gomes, com quase uma década de profissão, também já abandonou veículo depois de bate-boca - Foto: Alexandre Guzanshe/EM/DA PressUsuário do sistema de transporte de Belo Horizonte, o músico Jone Camargo, de 41 anos, não concorda em embarcar fora do ponto nos ônibus que circulam pela cidade. Está longe de ser uma voz isolada: faz coro com ele uma multidão de passageiros na capital, entre eles a mulher que entrou em um dos veículos da linha SC02A na quarta-feira e bateu boca com o motorista. O atrito levou o condutor a largar o volante e a abandonar o coletivo cheio de passageiros na Savassi, no quinto episódio do tipo na cidade desde 2012. “Tem que respeitar o ponto”, defende o cantor.

Na verdade, balanço da BHTrans revela que o item chamado “Descumprimento de ponto de embarque e desembarque” – o que inclui ônibus que passam direto ou param em local inadequado – foi o campeão de reclamações de passageiros no primeiro semestre de 2016, com 3.226 registros (veja quadro). Por trás da estatística há várias situações, como o despreparo de motoristas – tanto de coletivos como de veículos particulares e a serviço de empresas.

Isso porque a quantidade de carros e até de caminhões estacionados nas baias reservadas aos coletivos muitas vezes obriga o condutor de ônibus a parar fora do ponto. De acordo com a BHTrans, 6.648 infratores foram multados por esse motivo na capital apenas em 2015. O número superou o de 2014 (6.352 registros).

A infração, considerada de gravidade média, está prevista no artigo 181 do Código de Trânsito Brasileiro. Quem a comete está sujeito a multa de R$ 85,13, além da perda de quatro pontos no prontuário da Carteira Nacional de Habilitação.

Ontem, em poucos minutos, a equipe do Estado de Minas flagrou vários casos de desrespeito à lei na Região Centro-Sul da cidade.

Em uma das esquinas da Avenida Getúlio Vargas e Rua dos Inconfidentes, na Savassi, um caminhão que dava suporte a uma obra estacionou em local proibido, à frente da placa do ponto de ônibus, dificultando as manobras dos motoristas dos coletivos. O mais prejudicado foi um cadeirante. O rapaz precisou fazer um esforço maior, pois o veículo de transporte parou distante do passeio.

- Foto: Arte/Paulinho Miranda
Situações como essa deixam Clebson Gomes, de 38, indignado. Ele é motorista de ônibus há quase uma década e já passou por situação idêntica à do condutor da linha SC02 que abandonou o veículo cheio de passageiros. Há cinco anos, quando trabalhava em Betim, na Grande Belo Horizonte, deparou-se com uma van – possivelmente conduzida por um perueiro – estacionada no ponto. Clebson parou o coletivo poucos metros atrás.

A sequência foi parecida com a do atrito registrado em Belo Horizonte na última quarta-feira: “Uma passageira não gostou e embarcou reclamando. Minutos depois, outras mulheres engrossaram o coro.

Ficaram xingando, dizendo que comunicariam ao dono da empresa. Por fim, de tão estressado, saí do ônibus, que estava cheio de gente”. E aquela não foi a única vez em que ele teve problemas com passageiros: há um ano, diz ter sido agredido por um homem com um soco, depois de um atrito originado por um problema mecânico, o que expõe a rotina tensa vivida atrás do volante.

Mas tanto ele quanto colegas de profissão fazem questão de dizer que a esmagadora maioria dos passageiros respeita quem ganha a vida no trânsito. O motorista Uiliam Rodrigues Santos, de 36, conta que, quase diariamente, leva pelo trajeto da SC04 uma senhora de aproximadamente 70 anos. “Toda semana ela me presenteia com um chocolate. Uma vez, me deu um jogo de cama”, recordou o rapaz, há quase 10 anos na profissão.

RANKING As reclamações dos usuários de ônibus na capital somaram 11.231 registros no acumulado dos seis primeiros meses deste ano. Apesar de chamar a atenção, o número é 37% menor do que o apurado em igual período de 2015 (17.816). No ano passado, o descumprimento de ponto de embarque e desembarque também liderou o ranking, com 4.990 registros.

A BHTrans informou que, quando há reclamações contra alguma linha, “o trabalho é realizado em contato direto com os concessionários, no sentido de enquadrar o serviço nos padrões”.

Destacou ainda que “as reclamações relacionadas diretamente aos operadores – motoristas e agentes de bordo – são tratadas com especial atenção. Por isso, periodicamente eles passam por treinamento”.

O Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (Setra-BH) informou que “para combater os efeitos dos desgastes decorrentes das atividades diárias dos motoristas e agentes de bordo, toda empresa do sistema de transporte coletivo tem um departamento médico, que observa atenta e rigorosamente o estabelecido pelo Programa de Controle Médico e Saúde Ocupacional, como a realização de exames periódicos e o acompanhamento de seus resultados”.

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