Jornal Estado de Minas

Capivaras devem ser retiradas da Pampulha até sexta-feira

Quatro dias na contagem regressiva para remoção das capivaras que vivem no entorno da Lagoa da Pampulha, segundo decisão da Justiça Federal que almeja garantir a proteção de moradores da região e de turistas que visitam diariamente o conjunto arquitetônico reconhecido como Patrimônio Cultural da Humanidade, em Belo Horizonte. O desembargador federal Souza Prudente, da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), de Brasília, advertiu ontem que os animais devem ser retirados até sexta-feira. “A população não pode correr mais riscos”, afirmou.


Preocupado com a situação na capital mineira, Souza Prudente disse, por telefone, que a determinação deve ser cumprida de imediato, no prazo de cinco dias após a notificação – que, segundo a Prefeitura de BH, ocorreu ontem. “É preciso fazer um tratamento veterinário, enfim, tomar as providências, retirar os animais”, disse o magistrado, cujo despacho foi emitido na última sexta-feira. No fim de semana, enquanto nenhuma providência era adotada, foi intenso o movimento nas áreas turísticas da Pampulha, especialmente no entorno da Igreja de São Francisco de Assis, onde os visitantes eram vistos no gramado, bem perto dos animais que pastavam na orla.

O risco desse tipo de proximidade ficou evidente no início do mês passado, quando um escoteiro de 10 anos morreu vítima de febre maculosa, após frequentar o Parque Ecológico Promotor Francisco José Lins do Rêgo Santos, na orla da Pampulha, e ser picado por carrapato infectado com a bactéria Rickettsia rickettsii, causadora da doença. Desde então, nenhuma medida objetiva foi tomada para controle das capivaras, que são hospedeiras do carrapato-estrela, transmissor da maculosa.

No início da tarde de ontem, houve desencontro de informações na Prefeitura de BH, quando a assessoria de imprensa disse não haver sido notificada sobre a determinação assinada na sexta-feira pelo desembargador. Sobre isso, Souza Prudente foi categórico: “A notificação foi enviada na sexta-feira mesmo, por fax, do meu gabinete, tanto ao secretário de Meio Ambiente quanto à direção do Ibama. Esse documento já está valendo, trata-se de uma determinação especial, urgente”, afirmou.

Mais tarde, às 16h29, a PBH enviou nota ao Estado de Minas explicando que “foi notificada da decisão nesta segunda, por e-mail, após informar os endereços corretos para que o despacho do TRF fosse entregue”.
E acrescentou: “A prefeitura agora analisa a melhor forma de cumprir a decisão judicial. Não há prazo para isso”.

RESPONSABILIDADE A decisão do desembargador, em caráter liminar, foi proferida em apelação proposta pela Associação Pró-Interesses do Bairro Bandeirantes (Apibb), da Região da Pampulha. O despacho diz que os animais devem ser isolados “do alcance da população, evitando-se, assim, os riscos de sérios danos à saúde e à própria vida humana, mormente em face dos óbitos já ocorridos em virtude de contaminação decorrente da picada do carrapato-estrela, de que são hospedeiros os animais”.

No texto, o desembargador destacou os impactos causados pela presença das capivaras na Pampulha, como a destruição dos jardins planejados na década de 1940 pelo paisagista Roberto Burle Marx (1909-1994), que compõem o conjunto arquitetônico, e, “principalmente, o risco de contaminação dos moradores e frequentadores da Lagoa da Pampulha pela doença infecciosa causada pelo carrapato-estrela”.


O embate judicial em torno das capivaras da Pampulha começou na 20ª Vara da Justiça Federal em Belo Horizonte, no ano passado, em ação proposta pelo município contra o Ibama. A Prefeitura de Belo Horizonte defendia o recolhimento dos animais, com indicação do instituto sobre onde deveriam ser mantidos. Já o órgão federal era contra a manutenção em cativeiro, entendendo que os espécimes deveriam ser libertados e manejados de forma sustentável. Foi concedida liminar favorável ao isolamento. Porém, quando o mérito da ação foi julgado improcedente, a liminar caiu e a prefeitura teve de libertar os roedores.

No despacho de sexta-feira, o desembargador concluiu: “Defiro o pedido de tutela de urgência, para restabelecer os efeitos da medida liminarmente proferida nestes autos, e mantida, ainda que em sede provisória, por este tribunal, devendo o município de Belo Horizonte, por intermédio da sua Secretaria do Meio Ambiente, manter confinados os animais em referência, isolando-os do alcance da população, em local apropriado para essa finalidade, notadamente no que pertine à preservação de sua saúde, até o julgamento do recurso de apelação interposto nestes autos”.

CRÍTICAS
O magistrado, que determinou a notificação imediata da Prefeitura de BH, critica a postura de diferentes representantes do poder público de tentar transferir responsabilidades no enfrentamento do problema, que entende ser urgente.

“Os órgãos públicos não podem ficar empurrando a responsabilidade em uma questão de interesse de toda a população”, afirmou em entrevista ao Estado de Minas. Souza Prudente, que também é professor de direito ambiental e sustentabilidade do mestrado da Universidade Católica de Brasília, classificou a decisão como uma aplicação dos princípios da precaução e responsabilidade social, visando ao desenvolvimento urbano sustentável, consagrados em nível mundial por vários órgãos, convenções e fóruns de debate internacionais.

Ambientalistas
resistem à remoção

O Movimento Mineiro pelos Direitos dos Animais lançou a campanha “SOS Capivaras”. De acordo com a coordenadora, Adriana Araújo, o Ibama autorizou, no passado, a retirada de roedores de Viçosa, na Zona da Mata mineira, e Campinas (SP) e o “insucesso dessa ação”, segundo ela, resultou em dinheiro publico jogado fora e risco à população. “Os carrapatos migraram para outros hospedeiros e outros grupos de capivaras chegaram. Em Belo Horizonte, trabalhamos responsavelmente articulados, resistindo à retirada”, afirmou. Segundo ela, a meta é buscar diálogo e tentar convencer o Ministério Público estadual e federal e a Justiça Federal de que o melhor a ser feito é manter os animais na Pampulha e, se for o caso, no Córrego do Onça, sob manejo ético, impedindo a reprodução descontrolada.

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