O risco desse tipo de proximidade ficou evidente no início do mês passado, quando um escoteiro de 10 anos morreu vítima de febre maculosa, após frequentar o Parque Ecológico Promotor Francisco José Lins do Rêgo Santos, na orla da Pampulha, e ser picado por carrapato infectado com a bactéria Rickettsia rickettsii, causadora da doença. Desde então, nenhuma medida objetiva foi tomada para controle das capivaras, que são hospedeiras do carrapato-estrela, transmissor da maculosa.
No início da tarde de ontem, houve desencontro de informações na Prefeitura de BH, quando a assessoria de imprensa disse não haver sido notificada sobre a determinação assinada na sexta-feira pelo desembargador. Sobre isso, Souza Prudente foi categórico: “A notificação foi enviada na sexta-feira mesmo, por fax, do meu gabinete, tanto ao secretário de Meio Ambiente quanto à direção do Ibama. Esse documento já está valendo, trata-se de uma determinação especial, urgente”, afirmou.
Mais tarde, às 16h29, a PBH enviou nota ao Estado de Minas explicando que “foi notificada da decisão nesta segunda, por e-mail, após informar os endereços corretos para que o despacho do TRF fosse entregue”. E acrescentou: “A prefeitura agora analisa a melhor forma de cumprir a decisão judicial. Não há prazo para isso”.
RESPONSABILIDADE A decisão do desembargador, em caráter liminar, foi proferida em apelação proposta pela Associação Pró-Interesses do Bairro Bandeirantes (Apibb), da Região da Pampulha. O despacho diz que os animais devem ser isolados “do alcance da população, evitando-se, assim, os riscos de sérios danos à saúde e à própria vida humana, mormente em face dos óbitos já ocorridos em virtude de contaminação decorrente da picada do carrapato-estrela, de que são hospedeiros os animais”.
No texto, o desembargador destacou os impactos causados pela presença das capivaras na Pampulha, como a destruição dos jardins planejados na década de 1940 pelo paisagista Roberto Burle Marx (1909-1994), que compõem o conjunto arquitetônico, e, “principalmente, o risco de contaminação dos moradores e frequentadores da Lagoa da Pampulha pela doença infecciosa causada pelo carrapato-estrela”.
O embate judicial em torno das capivaras da Pampulha começou na 20ª Vara da Justiça Federal em Belo Horizonte, no ano passado, em ação proposta pelo município contra o Ibama. A Prefeitura de Belo Horizonte defendia o recolhimento dos animais, com indicação do instituto sobre onde deveriam ser mantidos. Já o órgão federal era contra a manutenção em cativeiro, entendendo que os espécimes deveriam ser libertados e manejados de forma sustentável. Foi concedida liminar favorável ao isolamento. Porém, quando o mérito da ação foi julgado improcedente, a liminar caiu e a prefeitura teve de libertar os roedores.
No despacho de sexta-feira, o desembargador concluiu: “Defiro o pedido de tutela de urgência, para restabelecer os efeitos da medida liminarmente proferida nestes autos, e mantida, ainda que em sede provisória, por este tribunal, devendo o município de Belo Horizonte, por intermédio da sua Secretaria do Meio Ambiente, manter confinados os animais em referência, isolando-os do alcance da população, em local apropriado para essa finalidade, notadamente no que pertine à preservação de sua saúde, até o julgamento do recurso de apelação interposto nestes autos”.
CRÍTICAS O magistrado, que determinou a notificação imediata da Prefeitura de BH, critica a postura de diferentes representantes do poder público de tentar transferir responsabilidades no enfrentamento do problema, que entende ser urgente. “Os órgãos públicos não podem ficar empurrando a responsabilidade em uma questão de interesse de toda a população”, afirmou em entrevista ao Estado de Minas. Souza Prudente, que também é professor de direito ambiental e sustentabilidade do mestrado da Universidade Católica de Brasília, classificou a decisão como uma aplicação dos princípios da precaução e responsabilidade social, visando ao desenvolvimento urbano sustentável, consagrados em nível mundial por vários órgãos, convenções e fóruns de debate internacionais.
Ambientalistas resistem à remoção
O Movimento Mineiro pelos Direitos dos Animais lançou a campanha “SOS Capivaras”. De acordo com a coordenadora, Adriana Araújo, o Ibama autorizou, no passado, a retirada de roedores de Viçosa, na Zona da Mata mineira, e Campinas (SP) e o “insucesso dessa ação”, segundo ela, resultou em dinheiro publico jogado fora e risco à população. “Os carrapatos migraram para outros hospedeiros e outros grupos de capivaras chegaram. Em Belo Horizonte, trabalhamos responsavelmente articulados, resistindo à retirada”, afirmou. Segundo ela, a meta é buscar diálogo e tentar convencer o Ministério Público estadual e federal e a Justiça Federal de que o melhor a ser feito é manter os animais na Pampulha e, se for o caso, no Córrego do Onça, sob manejo ético, impedindo a reprodução descontrolada.