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Veredas de Guimarães Rosa agonizam no interior de Minas GeraisQueimadas criminosas acabam com as veredas no cerrado mineiro Câmara dos Deputados discute degradação das veredas no cerrado brasileiroSérie do EM sobre degradação das veredas em Minas motiva debate na ALMG Projetos de recuperação prometem resgatar veredas e salvar mananciaisVeredas são assoreadas por estradas construídas sem acompanhamentoSem água e com veredas secas, produtores abandonam terras no sertão mineiroDegradação das veredas complica a vida dos pequenos produtoresDe lá para cá, conta, foi só degradação: desmatamento e movimento do solo para a formação de pastagens sem nenhuma medida protetiva, produção de carvão e danos provocados pela abertura de estradas, além do fator mais perverso de todos, o fogo, seguido pela formação de pasto e pisoteio do gado.
Um exemplo da destruição está na vereda da Mutuca, a três quilômetros da sede de Urucuia. Há três anos, um incêndio atingiu a área, transformando a maior parte da paisagem num cenário de buritis queimados ou mortos, sem uma gota d’ água acumulada. “Este é um dano difícil de ser revertido”, disse Carlos Ferroni, que acompanhou o Estado de Minas até o local.
Em outro ponto do município de Urucuia, na comunidade de Barrocação, a vereda do Pulvarim era um verdadeiro reservatório de água, abrangendo uma área de 10 hectares. Também há três anos, a área foi atingida por um incêndio. Trabalhadores da fazenda e vizinhos se esforçaram para controlar as chamas, mas não conseguiram evitar os danos, cujas consequências se sentem até hoje.
O fogo se prolongou por cerca de 15 dias. As chamas provocaram estragos por cerca de quatro dos oito quilômetros de extensão da vereda e devastaram cerca de 10 hectares, atingindo a sua cabeceira, onde estão visíveis os rastros de destruição, com restos de troncos de buritis queimados no chão.
EROSÃO O ambientalista Eduardo Gomes, diretor do Instituto Grande Sertão (IGS), de Montes Claros, salienta que quando o incêndio atinge a cabeceira de uma vereda os danos são maiores porque tanto a parte superficial quanto o subsolo são afetados. O resultado é que a vereda perde sua capacidade de absorver e reter água. “Assim, mesmo chovendo, ela não retém a água, que passa a provocar um processo de erosão”, explica Gomes.
O empresário Frederico Assis, dono da fazenda onde fica situada a vereda Pulvarim, conta que quando adquiriu a propriedade, há dois anos, o incêndio na área já tinha ocorrido. Ele disse que agora se esforça num trabalho de preservação e, para isso, cercou toda a área, onde instalou câmeras para monitorar a entrada de caçadores e de outras pessoas que possam causar danos ao meio ambiente. “Minha expectativa é de que a vereda volte a ser como antes”, diz o empresário, que guarda fotos do terreno cheio d’água.
Esses não são casos isolados. Ainda na região, a reportagem encontrou várias outras áreas de antigas nascentes que hoje estão completamente secas.
“Até 10 anos atrás, este lugar tinha muita água. Agora, está esta tristeza, sem nada”, lamenta o aposentado Adão Gonçalves Machado, de 77, saudoso dos tempos em que córregos e rios da região corriam caudalosos o inteiro, garantiam os plantios de feijão, arroz e hortas mesmo durante os períodos de estiagem e matavam a sede das famílias e dos animais.
“Acho que está chovendo menos e desmataram muito a região para fazer carvão”, diz o experiente morador. “Mas tenho esperança de que um dia as veredas vão se recuperar”, acrescenta ele, lembrando que por volta de 1963 ocorreu uma grande seca, mas os danos da estiagem daquela época foram superados.
Na mesma região de Bananeiras, a reportagem flagrou outro quadro de destruição provocado pelo fogo na cabeceira de uma vereda, que ajuda a formar o Córrego da Onça. No local estão as marcas deixadas pelo fogo, com buritis queimados ou mortos e o terreno seco. O Córrego da Onça também secou.
MENOS VAZÃO No caminho dos personagens de Rosa, a reportagem do EM atravessou outros rios e córregos que tiveram a vazão drasticamente reduzida ao longo dos anos, tornaram-se intermitentes ou pararam de correr. São Judas, Campo Grande e Gameleiras são alguns dos nomes.
“Esses rios eram volumosos e corriam o ano inteiro. De uns tempos prá cá, só correm na época das chuvas”, diz Carlos Ferroni. Tamburil, Cuia, Palmeiras e Sabão, córregos que alimentavam o Urucuia, agora estão secos. No Ribeirão de Areia, no Rio Tabocas, e no próprio Rio Urucuia, o assoreamento reduziu o volume de água.
Reportagens em série
Em comemoração aos 60 anos de Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa (1908-1967), o Estado de Minas vem publicando, desde março, reportagens especiais tendo a obra do escritor mineiro como fio condutor.
A primeira foi o caderno especial Travessia, dos repórteres Gustavo Werneck, Alexandre Guzanshe e Fred Bottrel, que visitaram vários municípios ao longo do Rio São Francisco para contar a história dos “diadorins” do século 21.
Homens e mulheres, do meio urbano e rural e idades variadas, mostrando coragem e sensibilidade para tocar a vida e revelar suas trajetórias.
Em agosto, foi a vez de Guzanshe participar – e depois apresentar aos leitores – o projeto Caminho do Sertão. Em sua terceira edição, trata-se de uma viagem cultural, literária, socioambiental e com um quê de aventura.
Na verdade, um mergulho no universo de Rosa e no cerrado sertanejo, percorrendo parte dos passos trilhados pelo personagem Riobaldo, protagonista do livro ao lado de Diadorim, rumo à região do Liso do Sussuarão, na margem esquerda do São Francisco, em território mineiro.
Já no caderno Pensar, o jornalista Eduardo Murta publicou, em maio, a reportagem “Rosa: metáfora plural, seguindo os passos do escritor em Belo Horizonte e Minas e relatando sua importância para a literatura brasileira e universal..