Bonito de Minas, Chapada Gaúcha, Urucuia e Arinos – Vereda seca. Escassez de água. Lavoura morta. Desesperança. A encruzilhada da degradação ambiental imposta pelo homem aprofunda as dificuldades naturais do Norte e Noroeste de Minas e fomenta o abandono do campo diante da falta de meios de sobrevivência.
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Ali perto, na comunidade de Bom Jesus, Jordelina Gomes Cavalcante conta que a lavoura cultivada por seu marido, Ernestino Francisco dos Santos, de 53 anos, teve que ser abandonada. Arroz, feijão e outras culturas, tudo ficou para trás depois que a Vereda da Bananeira secou, há cerca de 10 anos.
Os plantios eram feitos em brejos abaixo vereda. Não houve saída. Ernestino passou de produtor a empregado. Ganha em torno de R$ 40,00 a R$ 45,00 por dia como lavrador.
Em companhia de Heleno, a reportagem visitou, também em Arinos, o agricultor Júlio Leite Barbosa, que, ao lado da mulher, Hilda Alves Barbosa, labutava próximo a um tacho na produção de rapadura. Hilda reclamou da dificuldade de acesso à água, pois há dois anos a Vereda do Aleixo, vizinha de sua casa, começou a secar.
Em efeito cascata, um córrego que passa pelo local teve sua vazão muito reduzida. Hoje, o casal faz a captação de água por uma bomba em um poço. “Vou falar a verdade. Já tivemos muita água. Reduziu muito. Se ela acabar de vez, não sei o que será da gente”, afirmou.
Órfãos das veredas, para muitos a salvação é a chegada do caminhão-pipa, que fornece água potável, ainda que apenas o suficiente para matar a sede e cozinhar.
O caminhão-pipa também leva água potável para a família do agricultor Ilídio de Oliveira Rodrigues, de 67, morador da comunidade de Tamburil, na zona rural de Urucuia. Ilídio recorda que há poucos anos o Córrego Tamburil era cheio o ano inteiro perto de sua casa, mas agora só corre em época de chuva. “O córrego era fundo, com muito peixe. Depois, foi minguando. Hoje, nem piaba tem, pois não há água”.
A agricultora Isabel Cristina Durães Lisboa, de 63, mora perto do córrego da Cuia, que era caudaloso o ano inteiro e secou depois da degradação nas veredas que o alimentam. O marido dela, Adailton Durães Alves, busca água em uma carroça, a cinco quilômetros de distância, para abastecimento da família e para manter os animais. “Não imaginava que a gente fosse enfrentar uma situação dessa”, alarma-se a agricultora, que atribui o “fim das águas” ao desmatamento, à produção de carvão e ao plantio de eucaliptos nas cabeceiras dos rios e nas veredas.
Drama semelhante é vivido por Joaquina José de Almeida, de 83, da comunidade de Esconta, ainda na zona rural de Urucuia. Ela usa a água retirada de uma cisterna. A 100 metros da casa dela há uma vereda, também conhecida como Esconta, que há quatro anos secou completamente.
Quem veio de longe para tentar a vida na região também se assusta. Natural de Patos de Minas, no Alto Paranaíba, há 10 anos o ex-caminhoneiro Antônio Carlos de Souza comprou uma fazenda cortada pelo Rio Tamburil no município de Urucuia. Ele conta que a princípio tudo correu bem. Mas a situação degringolou há cinco anos, quando o Tamburil –que até então corria o ano inteiro – “cortou”. No início de outubro, quando a reportagem visitou a região, estava completamente vazio.
Com a falta d’água, Antônio Carlos abriu um poço em sua propriedade no fim do ano passado. Mesmo assim, teve prejuízos com a seca. “Vou esperar mais um pouco. Se não chover, vou abandonar a fazenda e trabalhar como caminhoneiro”, anuncia.
Agonia das veredas
Na primeira reportagem da série, publicada na edição de ontem, o Estado de Minas mostrou que os oásis do cerrado retratados na saga de Riobaldo agonizam junto com os rios e córregos. A reportagem percorreu 2,1 mil quilômetros em 11 cidade do trajeto de Guimarães Rosa.