O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) quer o fim das barragens de rejeitos da mineração que usem a técnica de alteamento a montante, mesma que era praticada na Barragem do Fundão, que se rompeu há um ano em Mariana, causando a maior catástrofe socioambiental da história do país. Para isso, o MP entrou ontem na Justiça com ação civil pública contra o governo de Minas, pedindo que o estado seja condenado a não conceder novas licenças ambientais para esse tipo de empreendimento e nem renovar as autorizações existentes.
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O promotor Carlos Eduardo Ferreira Pinto disse que manter o método de produção que varreu comunidades do mapa e enlameou a Bacia do Rio Doce é agir contra a dignidade de Minas Gerais. “Não queremos que barragens sejam construídas e implantadas com o mesmo método que originou a maior catástrofe ambiental do país. Nossa ação visa a um rigor maior e a impedir realmente a construção, fazer com que nenhum licenciamento seja concedido e nem se tolerem procedimentos que estão em andamento”, afirmou. Marcos Paulo de Souza Miranda, também integrante da força-tarefa do MP, destacou que as 37 barragens com o método de alteamento a montante que estão em processo de licenciamento em Minas são “bombas com pavio aceso”.
O representante do MP também chamou a técnica de alteamento a montante de “assassina”.
De acordo com o promotor, essas estruturas estão nos municípios de Antônio Dias, Araxá, Barão de Cocais, Brumadinho, Caeté, Congonhas, Igarapé, Itabira, Itabirito, Itapecerica, Itatiaiuçu, Nazareno, Nova Lima, Ouro Preto, Rio Acima e Tapira, além da própria cidade de Mariana. O grande problema, de acordo com o Ministério Público, é que os pedidos de licenciamento em tramitação não foram cancelados pelo Decreto Estadual 46.933/2016, que suspendeu as autorizações até a definição de regras pelo Copam. Por isso, segundo o promotor Marcos Paulo, a ação civil pede também a nulidade de um artigo do decreto que permite a tramitação dos empreendimentos já em andamento.
‘MEDIDAS COSMÉTICAS’
Ao analisar o que foi feito um ano depois da tragédia de Mariana, os representantes do MP dirigiram duras críticas à Samarco e às suas controladoras, as gigantes da mineração Vale e BHP Billiton. Carlos Eduardo Ferreira Pinto resumiu as ações da Samarco a “medidas cosméticas”, como a plantação de grama sobre a lama para tentar estabilizar os rejeitos. A força-tarefa do MP entende que a mineradora está, atualmente, provocando uma tragédia processual na Justiça, ao tentar desvincular todas as ações da Justiça de Minas Gerais e levar os casos à Justiça Federal.
“A única coisa que a Samarco faz bem é se defender nos processos, levando aos tribunais recursos protelatórios de maneira a dificultar indenização e a compensação.
Sobre a retomada das atividades da Samarco em Mariana, principalmente diante da crise que a cidade tem vivido, o chefe da força-tarefa do MP disse que a empresa faz chantagem com a população do município. “Antes de buscar uma retomada imediata das operações, é preciso que a Samarco demonstre segurança de suas estruturas e que ela se responsabilize por outros fatos semelhantes ao rompimento da Barragem do Fundão.
A Samarco apresentou novamente um plano genérico de retomada, sem garantias de que exercerá suas atividades de modo diferente do que ela exercia em 5 de novembro de 2015”, completou Carlos Eduardo Ferreira Pinto.
Semad
Sobre a ação civil pública proposta pelo MP, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento sustentável informou ainda não ter sido notificada oficialmente, o que a impossibilita se pronunciar sobre seu conteúdo. Porém, a Semad sustenta que foi do estado de Minas Gerais a primeira iniciativa do país no sentido de proibir o licenciamento ambiental de barragens que utilizem a técnica de alteamento a montante, como medida de precaução, buscando também respeitar a segurança jurídica e eventuais direitos adquiridos.
A decisão, acrescentou a Semad em nota, “ajudou a embasar a recomendação do Ministério Público Federal ao Departamento Nacional de Política Mineral (DNPM) no sentido de proibir a utilização da técnica a nível nacional, feita em julho deste ano”. “Vale ressaltar que é competência do órgão federal fiscalizar as estruturas de barragens no país. Ainda assim, a Fundação Estadual de Meio Ambiente mantém um programa permanente de fiscalização de barragens, que publica anualmente um inventário sobre a situação das estruturas no estado”, diz o texto divulgado pela Semad.
Samarco: recuperação demanda longo prazo
A Samarco informou, por meio de nota, que tem feito esforços para reparar e remediar os danos causados pelo rompimento de sua barragem, há um ano. Para isso, acrescentou que foram adotadas medidas emergenciais e iniciado o planejamento de longo prazo para recuperar os danos ambientais. A empresa lembrou a assinatura do termo de ajustamento de conduta que envolveu ainda suas controladoras, Vale e BHP Billiton, e os governos federal e de Minas Gerais e do Espírito Santo, no qual são estabelecidos programas socioeconômicos e ambientais de reparação e recuperação.
Na frente ambiental, a Samarco diz ter desenvolvido o Plano de Recuperação Ambiental Integrado, entregue às autoridades em agosto de 2016. “O plano pauta a atuação da empresa em cinco grandes frentes de trabalho: segurança das estruturas remanescentes das barragens de Fundão, Santarém e Germano; ampliação da capacidade de armazenamento de rejeitos (obras do Eixo 1, Nova Santarém, Diques S1, S2, S3 e S4); contenção e controle da erosão das áreas impactadas ao longo dos rios; embasamento científico da avaliação de riscos e do processo de recuperação; e recuperação dos rios – essa última de maior complexidade e que demandará mais tempo para conclusão”, informou a nota.
A empresa promete financiar a recuperação de 5 mil nascentes do Rio Doce, reflorestar 10 mil hectares e restaurar outros 30 mil hectares, como parte da compensação.
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