Um dos alertas já emitidos à direção do clube, que fica a 35 minutos da capital no sentido Sete Lagoas, é sobre a falta de desfibrilador, equipamento indicado para manobras de ressuscitação, que deveria ter sido usado no último sábado, quando uma criança se afogou em uma das 12 piscinas do local.
A vítima foi um menino de 7 anos, que estava no complexo exatamente para comemorar seu aniversário. Bernardo França Rocha aguardava parentes descerem de um toboágua, sentado na borda de uma piscina com nível aproximado de 50 centímetros e altura equivale à sua cintura, quando se afogou, supostamente após sentir-se mal e cair.
Ele foi socorrido por um segurança do clube. Apesar de haver regulamentação da Sociedade Brasileira de Salvamento Aquático (Sobrasa) para que toda piscina seja monitorada por salva-vidas certificado pela entidade e em número suficiente, o clube admite que mantém apenas funcionários de serviços gerais com curso de primeiros-socorros atuando diretamente na vigilância dessas áreas.
E que os quatro salva-vidas de que dispõe são também enfermeiros, posicionados em um posto médico na entrada do complexo e acionados diante de casos de urgência. A direção informa também que nunca passou por fiscalização municipal relativa ao assunto.
Ele explica ainda que o tempo de resposta do salva-vidas em um princípio de afogamento deve ser de, no máximo, 30 segundos, para evitar complicações. “O princípio de afogamento deve ser identificado nos primeiros 10 segundos e o profissional tem mais 20 segundos para fazer o salvamento”, afirma.
Com esse tempo, explica o sargento, pode-se preservar e vítima de uma parada respiratória. Mas passado esse prazo, o problema evolui para parada cardíaca. “Todo guarda-vidas em alerta nunca espera ser chamado para o socorro, mas a todo tempo procura por banhistas que necessitam de sua ajuda”, destaca o bombeiro.
Em busca de explicações
Além da presença do desfibrilador, há outros equipamentos que são obrigatórios em qualquer tipo clube, segundo o Corpo de Bombeiros: cilindro e máscara de oxigênio; máscara para respiração artificial; material flutuante, tipo boia; prancha longa e colar cervical pequeno, médio e grande – para casos de trauma. O Thermas Internacional informou ter todos esses, à exceção do cilindro com máscara, para o qual não houve confirmação.
O problema é que, em um quadro em que equipamentos e tempo fazem toda a diferença, essa combinação deu errado no caso de Bernardo. Nem o clube nem a família sabe ao certo por quantos minutos o menino ficou submerso. De acordo com uma tia do garoto, a analista comercial Isabelli Lages, de 22 anos, todos brincavam na piscina, quando resolveram descer pelo toboágua. Como o brinquedo era proibido para a idade de Bernardo, a família pediu que ele aguardasse sentado na borda da piscina.
“Todo mundo só pediu isso e só permitiu isso porque ele era um menino muito obediente, de ótimo comportamento e, além de tudo, sabia nadar. A piscina era rasa. A água batia na cintura dele. Não dá para entender o que aconteceu”, conta ela. No dia do acidente, estavam no clube a mãe de Bernardo, o irmão dela, Isabelli, mulher dele, e os avós maternos da criança. “Foi a conta de a gente subir, uns dois minutos, e ver que ele não estava mais no local combinado. Aí, já ouvimos alguém dizer que havia uma criança se afogando e descemos, desesperados”, lembra, emocionada.
A família acusa o clube de negligência e denuncia a ausência de um médico para procedimentos de urgência, além da falta de desfibrilador e de salva-vidas nas piscinas. “Se havia um salva-vidas, onde ele estava então, já que foi uma outra pessoa que tirou o Bernardo da água? Estamos arrasados com tudo o que aconteceu. Saímos de casa para uma comemoração e nos vimos em meio a uma tragédia dessas”, lamenta.
CORRERIA Isabelli conta que depois de retirado da água, o menino recebeu os primeiros-socorros de uma enfermeira na beira da piscina, mas estava inconsciente. De acordo com o sargento Benedito Eduardo, ele pode ter tido um mal súbito ao entrar na água, pois vomitou muito depois de resgatado. “O vômito é normal, mas, pelo tipo de alimento que ele expeliu, sugere que ele ainda estava em processo de digestão, o que exige fluxo de sangue para o estômago. Se ele entrou na piscina e fez um movimento de pernas e braços, forçou ainda mais o deslocamento sanguíneo para essas áreas e deixou o cérebro com déficit sanguíneo. Nessas circunstâncias, ocorre o desmaio. E se ele estava na água, essa pode ser uma explicação para o afogamento”, disse.
O menino foi atendido também pelo Corpo de Bombeiros, que chegou 20 minutos depois do princípio de afogamento e pelo Samu, que chegou em 40 minutos. Após aplicar adrenalina, a equipe conseguiu resgatar o batimento cardíaco da criança. A Polícia Civil vai apurar se houve omissão de socorro médico.
A direção do clube assume a falta do desfibrilador e admite que não sabia da necessidade de manter o equipamento disponível para salvamentos. Também informou que prestou toda a assistência à família e que vai adotar todas as recomendações que forem determinadas pelo Corpo de Bombeiros para se regularizar.
Acidente e ocorro
Como foi a episódio que rovocou a morte de Bernardo
12h
A família de Bernardo França Rocha, de 7 anos, chega ao clube Thermas Internacional de Minas Gerais, em Esmeraldas (a 35 minutos de BH), para passar o dia. O passeio é para comemorar o aniversário do garoto, que havia ocorrido um dia antes.
15h30
O grupo de cinco pessoas decide descer de um toboágua permitido apenas para maiores de 10 anos. O menino é orientado a ficar sentado na borda da piscina, cuja profundidade era de 50 centímetros, na altura da barriga de Bernardo, que segundo familiares sabia nadar.
15h32
Dois minutos depois, os parentes do alto do toboágua observam que Bernardo não está no local combinado, escutam que uma criança está se afogando e descem. A criança é retirada da água, inconsciente, por um segurança do clube. Na borda da piscina, começa a receber primeiros-socorros
16h
Bombeiros são chamados e chegam em cerca de meia hora, continuando o socorro, no estabelecimento, que não tem desfibrilador. Por volta de 16h20, equipe do Samu inicia o atendimento no local. A criança segue de helicóptero para o Hospital João XXIII, em BH, onde chega no início da noite.
Domingo
Depois de exames e protocolos médicos seguidos, é constatada morte cerebral de Bernardo, que após ser recebido no hospital era mantido respirando com ajuda de aparelhos. A família decide pela doação de órgãos. O corpo será velado e enterrado hoje, em Belo Horizonte.
O número de afogamentos dos primeiros 10 meses deste ano já supera em 15% todas as ocorrências desse tipo registradas em Minas em todo o ano passado. Enquanto de janeiro a outubro de 2016 foram 434 casos, em 2015 o total foi de 378. Além de a marca já ter superado a do ano passado, o Corpo de Bombeiros estima que as ocorrências ainda aumentem, devido ao verão e diante da histórica falta de cuidado das pessoas. “Este ano superou em razão das altas temperaturas. Foi um ano quente, mas os casos tendem a aumentar”, disse o sargento Benedito Eduardo.