Jornal Estado de Minas

Famílias que perderam moradias com a chuva em BH ainda esperam indenização

Retirados de imóvel ameaçado no Taquaril, mãe e dois filhos vivem em abrigo na região leste de bh e reclamam de condições ruins - Foto: Paulo Filgueiras/EM/DA PressDos bairros às favelas, a agonia de quem perdeu seu teto devido às chuvas não se restringe à correria de se salvar e procurar local seguro. Muitas vezes por lentidão no andamento de processos judiciais ou na adoção de medidas por parte do poder público, essas famílias acabam atiradas à incerteza de anos vivendo em moradias provisórias, casas de parentes e abrigos. Os anos de estiagem prolongada (2013, 2014 e 2015) fizeram muitos belo-horizontinos esquecer essas situações, mas a temporada de chuvas vigorosas retornou este ano e já fez com que 11 famílias deixassem residências ameaçadas – há 10 casos em vilas e favelas e um no Bairro Buritis (Região Oeste de Belo Horizonte).


No interior de Minas, a temporada de chuvas também tira pessoas de casa. Somente em Resplendor, no Vale do Rio Doce, ao menos 284 pessoas estão fora de suas residências depois que um temporal atingiu a cidade na madrugada de sábado, provocando quatro mortes (leia mais na página 14). Os desabrigados da temporada atual de chuvas começam um calvário enfrentado há anos, por exemplo, pelas nove famílias dos dois edifícios condenados no Bairro Buritis no fim de 2011 – um foi demolido e outro caiu, em 2012 –, e pelas cinco de um prédio do Caiçara (Região Noroeste de BH), que desabou também em 2012, matando uma pessoa e ferindo outra. Hoje, todos vivem de forma provisória, seja nas casas de parentes ou em moradias alugadas.

É o caso da supervisora de call center Rita de Cássia Piumbini, de 56 anos. Os problemas delas começaram com a interdição do edifício Vale dos Buritis, em 22 de outubro de 2011. Desde então, não tem mais uma casa própria e diz arcar com muitos prejuízos, incluindo os reajustes anuais dos alugueis que no caso dela chegaram a R$ 2,2 mil, enquanto o teto concedido pela Justiça para pagamento da construtora é de R$ 2 mil.
“Sinto muita frustração. Você sonha em ter uma casa própria para o conforto na velhice e para os filhos. O segundo sentimento é o de revolta com a passividade da Justiça no Brasil, já que até hoje o juiz de primeira instância não deu uma sentença num processo de 5 anos”, reclama.

No local onde ficava o edifício de Rita, que caiu, e o vizinho, que foi demolido, a Prefeitura de Belo Horizonte construiu emergencialmente dois muros de arrimo e fez uma cobertura de concreto no terreno de baixo que vinha sendo aberto para a construção de mais empreendimentos. Em um terceiro prédio que foi interditado, onde ninguém chegou a morar, o muro da rua ainda tem as trincas da época do desabamento. Das janelas e garagens, é possível ver ferragens retorcidas, madeiras entulhadas e tubulações empilhadas. Moradores da vizinhança, agora, em vez de se preocuparem com a estabilidade do solo, temem que a edificação acabe invadida ou seja utilizada por usuários de crack e ladrões.

Também no Buritis, a dona de casa Elisabeth Lemguber, de 68, foi “expulsa” em 12 de novembro deste ano do apartamento em que vive na Rua Iracy Manata e espera não ter de enfrentar problemas por tanto tempo. Desde que o muro de arrimo do condomínio desabou e uma grande quantidade de lama e pedras invadiu parte do apartamento, ela buscou refúgio na casa de parentes.
“É muito triste passar essa época deslocada e sem saber como vai ser o ano que entra, o que vai ser de mim e da minha casa”, lamenta. “Já entrou água na minha casa e está ameaçando móveis e outros quartos”, completa Elisabeth, que aguarda solução para que seu patrimônio não se deteriore. “O prédio de cima já assumiu os danos. Disseram que vão acionar o seguro deles para me ressarcir e falaram para a minha síndica que vão consertar (o apartamento), mas me pediram três orçamentos para retirar o entulho”, conta.

- Foto: Paulo Filgueiras/EM/DA Press - 16/01/2012ABRIGO Para quem não tem casas de familiares para se acomodar, a saída é se instalar em locais públicos oferecidos para acolher atingidos pela chuva. No Abrigo Granja de Freitas, no Taquaril, Região Leste, oito dos 10 desabrigados de vilas e favelas de BH este ano encontraram um lugar para viver enquanto suas casas estão sendo avaliadas e podem sofrer intervenções para que suas estruturas já ameaçadas não sejam mais comprometidas ou acabem desabando. A demora por essas definições também é grande. Além das pessoas que tiveram de sair de casa este ano, há quem esteja no local há mais tempo. A auxiliar de limpeza Darlete Martins, de 31 e sua mãe já estão há dois anos abrigadas desde que a casa delas, no Morro das Pedras (Oeste de BH), começou a desabar pela cozinha e foi interditada pela Urbel.

“Não dá para morar lá.
Mas, enquanto nada é feito, o lote está acumulando lixo e sendo destruído pelas pessoas. A gente quer ver se vai ser tudo demolido ou se vamos receber outra casa. Vamos levando a vida até que isso seja resolvido”, afirma Darlete. A irmã dela, Zilande Monteiro, de 30, que foi morar no mesmo abrigo com os dois filhos, de 2 e 4 anos, reclama das infestações a que estão sujeitos na morada provisória. “Estamos morando no meio de muitos ratos que roem os cobertores, os colchões, os móveis, comem os alimentos e ameaçam nossos filhos. Os quartos também estão cheios de percevejos e de besouros. Está difícil viver nessas condições”, afirma.

De acordo com a Secretaria Adjunta de Assistência Social, a infestação de besouros é comum em períodos chuvosos e os insetos estão aparecendo em vários pontos da cidade. Sobre os ratos, a secretaria informa que “houve uma programação para o ano de 2016 de dedetização e desratização. Ao longo de todo o ano, foram realizadas ações de combate e prevenção. No dia 11 deste mês a dedetizadora contratada aplicou o produto nos cômodos vazios e no dia 18 ocorreu a aplicação apropriada os cômodos ocupados.
No próximo dia 7 haverá nova dedetização”. A secretaria informou não ter recebido queixas sobre percevejos.

PROBLEMAS NO BURITIS E CAIÇARA

Casos na 1ª instância

Uma ação dos moradores do edifício Vale do Buritis, no Bairro Buritis (Região Oeste de BH) contra a Construtora Estrutura foi movida antes de o prédio cair, pedindo reparação de danos. Cinco anos depois, o caso ainda está na primeira instância. Com o desabamento, caberá ao juiz arbitrar uma indenização, caso condene a empresa. O advogado da construtora, Eduardo Cordeiro, sustenta que a culpa não foi da Estrutura. “Foram danos sofridos pela rede de drenagem e vazamento da Copasa”, disse. O caso do prédio do Caiçara também está em primeira instância. O advogado das 12 famílias, Adriano Cardoso, quer que a Copasa e a Prefeitura de BH paguem indenizações de R$ 300 mil por danos materiais e outros R$ 100 mil de danos morais a cada um. “Espero que a sentença saia em um ano”, disse. Os moradores afirmam não receber aluguel.
“Tivemos que arcar com os prejuízos”, disse Helvécio José Tibães, de 53 anos.

.