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Estado de Minas

Vagão exclusivo divide opiniões até mesmo entre as mulheres

Há passageiras que são contra a separação por sexo no metrô de Belo Horizonte, ao defender que o ideal é ser respeitada pelos homens


postado em 27/11/2016 06:00 / atualizado em 27/11/2016 08:09

Júlia Fernanda Fabiano, de 17 anos, diz que pegou o metrô durante toda a semana e apenas um homem deixou o vagão ao verificar que estava na unidade destinada às mulheres(foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
Júlia Fernanda Fabiano, de 17 anos, diz que pegou o metrô durante toda a semana e apenas um homem deixou o vagão ao verificar que estava na unidade destinada às mulheres (foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)

“Quem nunca levou uma 'encoxada' no metrô?”, comenta uma jovem na plataforma do metrô Santa Efigênia, na Região Leste de Belo Horizonte, enquanto aguarda a chegada do trem, às 17h22 de quinta-feira, no sentido Vilarinho, em Venda Nova. Na roda de quatro amigas, o assunto é o vagão exclusivo para elas.

 

“Não acho que resolva o problema (de assédio), mas me sinto muito mais segura se tiver uma mulher ao meu lado”, responde a outra. “Pois fui pegar o vagão para mulheres e só tinha homens”, rebate a terceira. Quando a composição chega, em coro elas dizem: “De novo, aí. Tudo misturado”. E entram, resignadas, para mais uma viagem de volta para casa.

Na Estação Vilarinho, pouco depois das 18h, logo na saída do metrô em direção ao Eldorado, em Contagem, na região metropolitana, duas mulheres não deixam por menos e travam um embate com os homens sentados próximo a elas. “Esse vagão é só para mulheres, vocês têm que respeitar”, diz uma. “Vou andar agora com uma agulha para espetar todos vocês na entrada”, comenta a outra.

Alguns passageiros se mostram constrangidos com os puxões de orelha, outros lançam olhares de incredulidade e fazem cara de quem diz “quanta bobagem!”. Dois entram na discussão e um deles alega até que a lei está em vigor, mas falta regulamentação.

O funcionário público Newton Fábio, de 33 anos, jura que era a primeira vez, no período de duas semanas, que entrava no segundo vagão. “Sei o que as mulheres passam, porque tenho esposa e irmã. Minha esposa fala que só o dia em que for mulher e for assediada saberei o que é isso. Sou totalmente a favor dessa medida, mas está muito desorganizado”, diz.

Também funcionário público, Juarez Moreira, de 60, critica a forma como a lei está sendo divulgada nas estações. “Devia ter gente informando. Nem um cartaz foi afixado na porta dos trens para deixar clara a regra.”

A administradora pública Gabriele Silva, de 24, concorda que apenas um aviso sonoro não é suficiente. “Muita gente não escuta, ou finge que não escuta”, diz. Ela conta que entrou no segundo vagão durante toda a semana, na ida e na volta do trabalho, e não houve um dia sequer em que ele estivesse ocupado apenas pelo público feminino.

“Tem que fiscalizar, entrar aqui e tirar todos os homens”, esbraveja. “A lei por si só não resolve o assédio, mas minimiza”, diz, sendo acompanhada pelos homens que fazem sinal de cabeça, concordando. “Entrar e saber que não vai ter homem para te assediar dá mais segurança. É um caminho, pois a medida real é a educação e a conscientização, começando em casa”, afirma.

“Se não consegue controlar por educação, tem que ter multa”, rebate Juarez. “Mas, respeitar só se punir... É uma lógica muito perversa”, relata a jovem, a favor de uma posição contundente das autoridades logo no início para garantir que a lei se faça valer. “Se não forem firmes agora, não pega.”

ROTINA


A técnica em enfermagem Luciele dos Santos Gomes, de 32, não escolhe vagão e se diz “radicalmente contra a separação”. “Faço como sempre fiz. Fico na plataforma e pego o vagão que dá. Fazer um vagão exclusivo é escancarar o problema e, ao mesmo tempo, aceitá-lo. Vamos separar e pronto. Não é por aí”, diz.

 

A estudante Ana Paula Dias, de 21, também questiona: “Quer dizer que se viajar num vagão misto, até porque não há lugar para todas no espaço exclusivo, estou dizendo que quero ou posso ser assediada?”.

Na sexta-feira, às 17h30, a estudante Júlia Fernanda Fabrino, de 17, fechava mais uma semana de sua rotina – da estação Santa Tereza, na Região Leste, à Calafate, na Oeste – na volta da escola para casa, com uma novidade: viajava num vagão que, teoricamente, devia ter apenas mulheres. Mas o que se via era algo totalmente diferente: um entra e sai de gente dos dois sexos.

“Peguei o segundo vagão esta semana toda e está tudo como antes. Nesses cinco dias, um homem saiu ao ver que entrava no segundo vagão. Mas foi o único”, conta, com ar decepcionado. A garota é contra a segregação, mas acha que, existindo, a lei deve ser cumprida. “Não é separando que os homens deixarão de fazer isso. Tem que conscientizar.”

Quase às 18h30, pouco depois de o metrô deixar a estação Eldorado no sentido Vilarinho, o único aviso sonoro presenciado pela reportagem dentro do trem lembra a determinação da lei municipal. A viagem era feita no modelo novo, articulado, que permite passar de uma composição para outra. Com ou sem fones nos ouvidos, a indiferença falou mais alto. Nenhum homem se levanta para trocar de vagão. Ninguém ao menos se constrange.

Lei 10.989/16

» O segundo vagão de cada trem (total de 4 vagões) deve ser ocupado exclusivamente por mulheres no período das 6h30 às 8h30 e das 17h às 19h

» O objetivo é evitar que as mulheres sejam assediadas

» Pouco antes da chegada do trem na plataforma, um aviso sonoro informa sobre a regra. Não há diferenciação da cor
do vagão, cartazes nem seguranças para orientar
os passageiros

» Em vigor desde segunda-feira passada, a lei não está sendo cumprida. O vagão exclusivo continua sendo frequentado também pelos homens


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