Pouco mais de 12 horas de chuvas intermitentes foram o bastante para espalhar o caos por Belo Horizonte, gerar enxurradas capazes de causar pânico e morte, além de arrastar a capital para um quadro de alerta permanente. Entre a noite de segunda-feira e a tarde de ontem, tempestades deixaram ilhados motoristas e passageiros do transporte público na Avenida Vilarinho, em Venda Nova, e provocaram a primeira morte oficialmente registrada nesta estação na capital: uma estudante de 11 anos não resistiu após ser levada pela correnteza com a irmã de 10 e outras duas colegas, quando iam para a escola, no Bairro Conjunto Felicidade, na Região Norte. A irmã mais nova está internada em estado grave. A prefeitura reagiu ao quadro, que incluiu desmoronamentos e dezenas de outros alagamentos, decretando situação de emergência diante dos temporais, que em alguns locais da cidade já superaram a média histórica esperada para dezembro e prometem castigar a cidade pelo menos nos próximos dois dias. Sem soluções a curto prazo, resta ao belo-horizontino correr da chuva, como aconselha a própria Defesa Civil, que reforça a recomendação para que se fuja dos 80 pontos de inundação mapeados na cidade.
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O mês de dezembro em Belo Horizonte é o período em que historicamente mais chove na capital. Na Região de Venda Nova, por exemplo, a chuva já alcançou 91% do esperado para todo o mês.
Sobre as recentes ocorrências nessas regiões, o coronel Alexandre Lucas explica que o problema é resultado da grande impermeabilização, que causa sobrecarga do sistema de drenagem, associado às intensas precipitações. “Com isso, o risco e os desastres se potencializam. Um grande volume de chuva em curto espaço de tempo é uma grande ameaça em um local vulnerável. As pessoas têm que respeitar o perigo nessas áreas e não tentar atravessar enxurradas, a pé, de carro ou em qualquer outro meio de transporte”, afirma.
Ele disse que haverá uma reunião para apurar por que o ônibus do Move ficou ilhado na Avenida Vilarinho na segunda-feira, para saber se o motorista foi surpreendido ou tentou avançar. Na ocasião, o sistema de monitoramento hidrológico de BH registrou 53,6 milímetros de água em apenas 30 minutos em Venda Nova, segundo a Sudecap. “A precipitação verificada neste curto espaço de tempo caracteriza uma chuva de intensidade alta e não frequente para a região”, informou a Sudecap, em nota.
Na avaliação do professor Nilo de Oliveira Nascimento, do Departamento de Engenharia Hidráulica da UFMG, a prefeitura precisa avaliar bem qual medida será adotada para enfrentar os problemas de inundação na cidade.
A Sudecap admite a insuficiência da infraestrutura para drenar a água da região, mas aponta a interferência de outras duas questões: o crescimento dos níveis de ocupação na bacia, além do comprometimento do funcionamento dessas estruturas pelo acúmulo de lixo e entulho. De fato, ontem havia muito lixo preso nas grades que separam a linha férrea da pista destinada aos carros na Avenida Vilarinho, bem em frente aos terminais de transporte de passageiros do metrô e do Move. Funcionários da prefeitura fizeram uma força-tarefa para dar conta de toda a sujeira.
Na conta da Sudecap, para resolver o problema estão três intervenções. Uma delas é a implantação da bacia de detenção do Córrego Lareira, que, além do piscinão, inclui a construção de redes de esgoto, complementação do sistema viário, áreas de uso social, desapropriações, e remoção de famílias, avaliada em R$ 64 milhões. Porém, como empresas entraram na Justiça e travaram a licitação, a Sudecap preferiu cancelar o edital e fazer outro, com previsão de relançamento no primeiro semestre do ano que vem. Outra ação complexa necessária é a ampliação do canal da Avenida Vilarinho e também da Rua Doutor Álvaro Camargos, até o trecho abaixo da Avenida Cristiano Machado. Além disso, é necessário ampliar a microdrenagem, aumentando as redes de condução da água da chuva.
“A população de Venda Nova está abandonada. Você só escuta a prefeitura falar que não tem dinheiro”, diz Rodrigo Araújo, de 44 anos, o dono de uma fábrica de ferramentas na Vilarinho, bem perto de onde um ônibus do Move ficou ilhado. Entra ano e sai ano o resultado é o mesmo, segundo ele. Na semana passada, ele contou que a água atingiu uma de suas máquinas e até hoje ele não conseguiu ligá-la.