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Estado de Minas

Infiltrações ameaçam Igrejinha da Pampulha; ainda não há data para restauro

Infiltrações ameaçam a São Francisco de Assis, ícone do conjunto moderno de Niemeyer declarado patrimônio cultural da humanidade


postado em 20/12/2016 06:00 / atualizado em 20/12/2016 07:46

Funcionária enxuga a água da chuva que jorrou na madeira de parede da igreja e empoçou no piso(foto: Cristina Horta/EM/DA Press)
Funcionária enxuga a água da chuva que jorrou na madeira de parede da igreja e empoçou no piso (foto: Cristina Horta/EM/DA Press)
De 10 em 10 minutos, uma funcionária passa o pano sobre os azulejos e depois no chão. Mas não adianta muito – logo, logo a água vai inundar novamente o ambiente e empoçar no piso da Igreja de São Francisco de Assis, ícone do conjunto moderno da Pampulha, em Belo Horizonte, declarado há exatos cinco meses patrimônio cultural da humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Com as chuvas fortes deste mês, o monumento projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012) na década de 1940 sofre muito com as infiltrações, que apodrecem as placas curvas de madeira do forro original da nave. Os turistas veem o cenário com tristeza e pedem às autoridades pelo menos intervenções emergenciais para impedir a deterioração do templo, que abriga obras de Cândido Portinari (1903-1962), Paulo Werneck (1903-1962) e Alfredo Ceschiatti (1918-1989), rodeado pelos jardins do paisagista Burle Marx (1909-1994).


É impressionante e doloroso ver a água jorrando na madeira, como ocorreu durante a tempestade na tarde de quarta-feira: no lado direito de quem olha para o altar, a placa já se abriu tanto entre os quadros pintados por Portinari que ficou à mostra a podridão escura. Nesse ponto está o perigo maior e, para evitar danos aos quadros da via-sacra, a funcionária da igreja protege cada um com capa de couro. O piso volta a encharcar e outro funcionário avisa não ser permitido colocar baldes para recolher a água, pois poderia causar danos aos azulejos de autoria de Portinari. Já no lado esquerdo, fazem barulho os pingos batendo sobre o assentos das cadeiras dos fiéis. “O problema está exatamente na junta de dilatação. Houve uma restauração em 2005, mas isso não foi resolvido. Quando chove demais, como agora, a situação piora”, informa o funcionário.

A restauração da Igreja de São Francisco de Assis, que começaria no mês passado e foi adiada para 2018, se tornou um enigma difícil de decifrar até mesmo para as instituições envolvidas. Nas tardes de sexta-feira e de ontem, a promotora de Justiça de Defesa do Meio Ambiente e do Patrimônio Histórico e Cultural de BH, Lilian Marotta Moreira, se reuniu com representantes do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), da Cúria Metropolitana de Belo Horizonte e da Fundação Municipal de Cultura (FMC) para encontrar uma solução. O ponto nevrálgico é que, para deslanchar o projeto, que terá recursos de R$ 1,4 milhão do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) das Cidades Históricas, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) precisa do templo liberado, tarefa difícil diante dos 215 matrimônios marcados para o período de janeiro a dezembro de 2017. Em 30 de outubro, inconformado com um possível fechamento da São Francisco de Assis no ano que vem, vários casais de noivos fizeram uma manifestação na porta da igreja. Na manhã de ontem, técnicos do Iphan estiveram no local para fazer uma vistoria.

PREOCUPAÇÃO Mesmo com os temporais, o casal Solón Ramos, enfermeiro, e Ingrid Rísia, fotógrafa, residente em Itabuna (BA), fez questão de visitar o cartão-postal de BH. “Já vi uma vez, ela é a primeira”, disse Solón baixinho, enquanto Ingrid olhava atentamente a água brotando na rachadura na madeira. “Esta igreja valoriza o patrimônio de Minas, ajuda a contar a história do estado, então é preciso preservar”, afirmou Solón. Ele lembrou ainda que é preciso urgência para evitar danos maiores e, sempre, ações de prevenção.

O presidente da Fundação Municipal de Cultura (FMC), arquiteto e historiador Leônidas Oliveira, confirmado para continuar no cargo pelo prefeito eleito Alexandre Kalil, diz que a deterioração da igrejinha da Pampulha, como é popularmente conhecida, preocupa cada vez mais. “As lajes estão apodrecendo e o projeto de restauro contempla a parte estrutural, os elementos artísticos, enfim, todo o templo”, informa Leônidas, ressaltando que o serviço não pode esperar em detrimento da integridade do bem cultural e religioso. Estrutura de concreto armado, a igreja, construída entre 1943 e 1945, é formada por lajes que se emendam e têm entre si as juntas de dilatação, por onde passa a água.
Obras de arte tiveram que ser cobertas numa tentativa de evitar que se estraguem com as infiltrações(foto: Cristina Horta/EM/DA Press)
Obras de arte tiveram que ser cobertas numa tentativa de evitar que se estraguem com as infiltrações (foto: Cristina Horta/EM/DA Press)

O projeto para recuperar o templo custou R$ 200 mil e foi bancado pela PBH via Sudecap. Leônidas alerta que ele foi feito especificamente para obras que começariam em novembro, devendo, portanto, ser realizado outro se a intervenção começar em 2018. “A degradação está avançando e fizemos até a licitação para escolher a firma que fará a obra”, destaca. E acrescenta que a FMC e a PBH avisaram, por ofício, a Cúria Metropolitana a respeito do início das obras, havendo também reunião no Ministério Público de Minas Gerais sobre o assunto.

Marcas do templo

Em 23 de janeiro de 2014, o Estado de Minas mostrou a situação do templo católico, considerado joia da arquitetura brasileira e atrativo para visitantes que, todos os dias, mesmo sob temporais, se enfileiram na calçada para tirar fotos ou simplesmente contemplar. Tombado pela União, estado e município, o templo já trazia as marcas das infiltrações, queda de reboco na marquise e muita sujeira nas pastilhas externas, além de espécies invasadoras no jardim planejado pelo paisagista Burle Marx (1909-1994). Na época, a reportagem mostrou que, no interior e exterior da Igreja de São Francisco de Assis, havia problemas: falhas na calçada de pedras portuguesas, representando um perigo especialmente para idosos e crianças; e desprendimento, perto da torre, de parte da pintura, dando o aspecto de desleixo. Dentro da nave, onde artistas de renome imprimiram a beleza de seu trabalho, havia partes escuras, de alto a baixo, no revestimento de madeira, fruto das águas que entram pelas juntas de dilatação da estrutura abobadada.


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