Jornal Estado de Minas

Corte no financiamento aumenta fila de espera por cirurgias eletivas em BH


A realização de cirurgias de varizes, hérnias, catarata, hemorroidas e outras que podem ser programadas, as chamadas eletivas, tornaram-se um desafio para o poder público em Belo Horizonte. Com problemas de financiamento para realização dos procedimentos no Sistema Único de Saúde (SUS), a Secretaria Municipal de Saúde manteve ao longo de 2016 uma lista de espera equivalente ao total de operações feitas no ano. Em outubro, quando 28.416 cirurgias haviam sido feitas, a fila era ainda maior e já somava 29.174 pessoas de BH e do interior aguardando. A previsão é de fechar dezembro com 34 mil eletivas realizadas, mas o número está distante do total de procedimentos alcançados no ano passado, quando foram feitas 39.540 cirurgias. Também é 20% menor do que o montante de 42.751 operações executadas em 2013, quando o município atingiu sua maior marca de eletivas desde os anos 2000. Para piorar, a estratégia de cofinanciamento do estado para o ano que vem ainda não é uma certeza: “Está em estudo”, afirma a Secretaria de Estado de Saúde.

O problema que resultou na queda dos procedimentos teve início em março de 2015, como explica o secretário municipal de Saúde, Fabiano Pimenta. Segundo ele, foi nessa época que o Ministério da Saúde anunciou a suspensão do repasse ao programa de incentivo para cirurgias eletivas, o que resultou no corte de 50% do financiamento total. Com recursos próprios para realizar apenas metade dos procedimentos, a Prefeitura deixou de receber pedidos de eletivas para pacientes do interior e tentou junto ao governo do estado o cofinanciamento para retomar a programação, o que foi concretizado em junho.
“Os (pacientes) que estavam na fila continuaram. Mas, como tinha o recurso do ministério, foi necessária a suspensão para receber novos. A diferença passou a ser suprida pelo estado em junho. Então, a diferença (queda) no total de cirurgias em 2015 se refere a esses dois meses”, afirma Fabiano.

E mesmo com o aporte do governo de Minas, a situação não se normalizou em 2016. Apesar de reconhecer o esforço da Secretaria de Estado da Saúde para cofinanciar as eletivas em Belo Horizonte (que também atende pacientes do interior por meio de pactuações), o secretário explica que problemas no fluxo de caixa do estado fizeram com que os financiamentos não fossem continuados e isso também resultou na retração das eletivas. “Muitas resoluções para liberação de recursos foram publicadas posteriormente à realização das cirurgias. Houve muita descontinuidade, mês em que o financiamento não estava garantido e, com isso, os hospitais que realizam os procedimentos colocaram ‘o pé no freio’, desmontaram equipes, diante da falta de regularidade e da incerteza de receber os pagamentos”, explicou Fabiano.

Para procedimentos de urgência e emergência, no entanto, o secretário afirma que não houve impacto.
E completa dizendo que, com o início do funcionamento do Hospital do Barreiro, a tendência é que a situação melhore. A PBH conseguiu recursos para manter a realização de 400 cirurgias eletivas na unidade, em 12 de dezembro, no aniversário de Belo Horizonte. E há, segundo o secretário, uma perspectiva, a depender ainda de entendimento com o governo federal, de se chegar a 700 cirurgias/mês no hospital. Também por problemas de financiamento para custos operacionais, a unidade funciona com menos da metade de sua capacidade. “A situação de crise é generalizada no país. Estamos vivendo uma limitação de recursos geral neste momento”, defende.

Dados da fila de espera para realização das cirurgias eletivas em BH, mostram o perfil do problema: das 29.174 pessoas (63,3%) que aguardavam em outubro deste ano, 18.483 são referenciados do SUS-BH, enquanto 10.691 (36,4%) são do interior. Os dados do ano passado revelam um quadro semelhante: do total de 22.10 pessoas aguardando, 14.281 pacientes eram de BH (64,8%) e 7.729 (35,1%) de outros municípios mineiros.

De acordo com o secretário, apesar da representatividade do interior nos dados, a Saúde municipal já constatou que essa parcela é ainda maior e tem parte embutida nos números da capital. “Há uma evidência já captada em centros de saúde de áreas no limite de BH com cidades da região metropolitana de que ocorreu a migração de uma demanda maior de pacientes, justamente pela perda de cotas dessas cidades para realização de cirurgias na capital.
Com isso, esses pacientes podem ter ‘dado entrada’ no sistema como moradores de BH. “Não sabemos dimensionar o quanto isso representa, mas com os problemas de fluxo de caixa nos repasses do governo do estado para os municípios, muitos se recusaram a fazer o cadastramento para realizar os procedimentos.

PREJUÍZO


Na fila de espera por uma cirurgia para reconstrução do tendão do pé direito, considerada de média complexidade, a dona de casa Conceição Sibele do Carmo, de 53 anos, está usando uma bota ortopédica há 60 dias e não tem ideia de quando vai ser operada. Essa foi a previsão que recebeu depois de percorrer um caminho que começou no posto de saúde do Bairro Caiçara, Região Noroeste de BH, passou pelo PAM do Bairro Padre Eustáquio, também na Região Noroeste, e chegou até o Hospital São José, na área hospitalar, onde veio o diagnóstico da cirurgia em setembro. “Não adiantaram nenhuma data e falaram apenas que entrariam em contato comigo. Estou com bastante dificuldade para andar e essa situação me deixa muito insegura”, afirma a dona de casa.

Conceição explica que a obesidade agravou um problema que já vinha ocorrendo havia cerca de dois anos, com torções frequentes do tornozelo, mas que evoluíram para uma situação que beira o rompimento do tendão. “Estou fazendo o possível e o impossível para pagar um plano de saúde e tentar essa cirurgia no particular. Mas o que mais me incomoda é o fato de ter gente pior do que eu nessa espera, que por outros motivos talvez não consiga manter um pouco da qualidade de vida que ainda tenho”, afirma. (colaborou Guilherme Paranaiba)

Teto de gastos preocupa


A Proposta de Emenda à Constituição (PEC 55), que estabelece limites de gastos federais pode ser um novo complicador para a realização de cirurgias eletivas em BH. Isso porque
o texto prevê que aumentos nas despesas só poderão ser feitos de acordo com a inflação acumulada conforme o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) a partir de 2017 e pelos próximos 20 anos. “Essa é também uma grande preocupação, porque a inflação do setor de saúde é maior que a inflação geral, já que engloba custos de tecnologia, novos medicamentos mais caros, entre outros fatores”, afirma o secretário municipal de Saúde de Belo Horizonte, Fabiano Pimenta.
As regras valem para os orçamentos Fiscal e da Seguridade Social e para todos os órgãos e poderes. Dentro de um mesmo poder, haverá limites por órgão. A PEC foi aprovada
e promulgada pelo presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL) em 15 de dezembro. Com isso, ela já está valendo..