Quem já teve dengue não se esquece das dores intensas no corpo, febre alta, indisposição e outros sintomas característicos da doença. Atualmente, além da enfermidade transmitida pelo mosquito Aedes aegypti há pelo menos 30 anos no Brasil, o inseto também assusta em Minas Gerais com o aumento dos casos das emergentes zika e chikungunya. Mas, desde os anos de 1850, o mosquito já assombra o país pela histórica mortandade do tipo urbano da febre amarela, doença que vitimou milhares de pessoas até 1942, quando foi erradicada.
Hoje, é a forma silvestre da doença, transmitida pelo inseto Haemagogus, que provoca no estado o maior surto da história do país, desde 1980, segundo os últimos dados do Ministério da Saúde. Mas o medo da disseminação do modo urbano da febre amarela ainda bate à porta em Minas, justamente no ano do centenário da morte de seu maior combatente: o médico Oswaldo Cruz.
O sanitarista brasileiro, que morreu em 11 de fevereiro de 1917, aos 44 anos, foi pioneiro no início do século 20 na implantação de medidas sanitárias, com brigadas que percorreram casas, jardins, quintais e ruas do Rio de Janeiro, então capital do país, para eliminar focos do Aedes aegypti.
HERANÇA
Ainda que sua atuação tenha enfrentado reação popular à época, justamente pelo caráter inovador, o trabalho capitaneado por Oswaldo Cruz desde 1901 foi capaz de erradicar a febre amarela do país pela primeira vez em 1907.
Nos dias de hoje, o olhar sobre o centenário da morte de Oswaldo Cruz e a missão cumprida por ele no combate ao mosquito revelam uma grande dualidade: por um lado, o pioneirismo e obstinação para avançar em pesquisa científica, formação acadêmica, assistência e combate à febre amarela e outras doenças de sua época.
Uma das heranças desse trabalho é a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que tem em Belo Horizonte o Centro de Pesquisas René Rachou, no Barro Preto, na Região Centro-Sul da capital. Mas, por outro, levanta a discussão sobre o que retrocedeu nesse centenário.
Ou seja, o que falhou para que doenças velhas conhecidas da ciência, como é a febre, deixassem de ficar apenas nos registros do passado para continuar exigindo esforços e investimentos das redes de saúde e ainda provocar surtos como o que se vê agora em Minas Gerais.
No caso da febre amarela, por exemplo, a morte de macacos contaminados na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH) alerta para a circulação do vírus da doença na capital e em cidades vizinhas e para a necessidade de reforço vacinal na região.
A Secretaria de Estado da Saúde de Minas Gerais (SES-MG) confirmou na quinta-feira resultados positivos para a doença em animais que morreram na capital, Betim e Contagem.
Os casos da doença notificados até o momento no estado são de febre amarela silvestre, transmitida pelo mosquito Haemagogus, que leva os vírus do hospedeiro – o macaco infectado – para o homem. Mas a confirmação de que o vírus está circulando na Grande BH reforçou um temor que ronda o surto desde o princípio: o da disseminação do tipo urbano da doença.
Nesse caso, a contaminação se dá na triangulação ser humano/Aedes/ser humano. Ou seja, o medo é que o mosquito que infesta as cidades pique um eventual paciente de febre amarela e leve a doença a outras pessoas, ressuscitando a febre amarela urbanas contra a qual combateu Oswaldo Cruz e que permanece enterrada desde 1942 no Brasil..