“Ontem foi a Mirella, mas amanhã poderá ser eu a vítima de um crime bárbaro como este. O Brasil é o país que mais mata travestis e transexuais de todo o mundo e estamos aqui para mostrar que lutamos. Todo mundo tem o direito de viver e as pessoas precisam entender que nós somos seres humanos como qualquer outro”, afirmou Anyky Lima, de 61, vice-presidente do Centro de Luta pela Livre Orientação Sexual de Minas Gerais (Cellos).
Ela pontua que os crimes de caráter transfóbico são cruéis e a investigação da polícia é lenta: “São assassinatos bárbaros. Assim como ocorreu com a Dandara, que, inclusive, foi filmada durante a agressão, os casos se tornam banais para a sociedade. Ninguém se mexe... Além do mais, se o crime tivesse sido cometido por uma travesti, ela estaria presa. Nós (travestis e transexuais) somos uma carne barata para o mundo”, disse.
O crime ocorreu em 19 de fevereiro. No boletim de ocorrência da Polícia Militar (PM) consta que Mirella, garota de programa e defensora dos direitos de pessoas trans, foi sufocada com uma toalha de banho dentro do quarto, no apartamento onde morava, no Bairro Carlos Prates. Além do esganamento, o corpo da vítima apresentava marcas de agressão física. Uma amiga que dividia o apartamento com ela relatou à PM que na noite anterior ao crime saiu para uma festa por volta de 1h e achou Mirella com um semblante triste.
Segundo a corporação, em resposta à amiga, ela assegurou que estava tudo bem, disse apenas que se sentia cansada e que iria dormir e descansar. No dia seguinte, a mulher chegou em casa pela manhã e viu a porta do quarto fechada. Quando entrou no cômodo, achou que Mirella ainda estava dormindo. Depois de sete horas fechada no quarto, sem fazer barulhos, a testemunha estranhou e resolveu checar se a companheira de apartamento estava bem. Ao abrir a porta, viu a travesti morta com uma toalha enrolada no pescoço.
Dados divulgados pela ONG Transgender Europe (2016) apontam que o Brasil ocupa o 1º lugar em crimes por transfobia no mundo. Em Belo Horizonte, 96,4% dessa população já sofreu algum tipo de violência física, 74,5% suportou ameaças e 46,8% foi estuprada. São os números mais recentes da pesquisa “Direitos e violência na experiência de travestis e transexuais na cidade de Belo Horizonte: Construção de um perfil social em diálogo com a população”, do Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT (NUH), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Os dados foram tabulados em 2015.
Protesto em Fortaleza
Ato cultural em Fortaleza relembrou o caso Dandara e pediu o fim da transfobia no fim de semana. Música, cinema, dança e performances marcaram a programação do Centro Cultural Bom Jardim no sábado em homenagem a Dandara dos Santos, travesti que foi torturada e morta em Fortaleza. Intitulado Dandaras Vivem, o evento chamou a atenção para a brutalidade do caso, ocorrido em 15 de fevereiro e reivindicou o fim da LGBTfobia.
O assassinato de Dandara ganhou repercussão internacional depois que o vídeo com a sequência da tortura a que foi submetida circulou nas redes sociais. Ela foi espancada, colocada em um carrinho de mão e morta com disparos de arma de fogo. Oito pessoas foram detidas acusadas de participar do crime, sendo quatro adultos e quatro adolescentes.