Sebastiana Cunha é parte das duas estatísticas. Ao tocar no assunto, ela faz questão de dizer que se sente desprotegida. Em 2012, recorda que a dupla armada entrou na farmácia quando os funcionários já haviam abaixado as portas. O crime ocorreu à noite, num bairro na Região Noroeste cujo nome ela prefere não mencionar. Em 2016, se tornou vítima na Savassi, na Região Centro-Sul da capital, no período da manhã. “Eu havia largado o serviço (era cuidadora de idosos) às 7h”, conta. Receosa, Tiana deixou o emprego.
Histórias semelhantes podem ser contadas em todas as partes da capital. Formado em administração de empresas, Ângelo Antônio Nogueira de Souza, de 32, enfrentou a situação no ano passado. “Estacionei o carro, por volta das 19h de um domingo, na porta do prédio de minha noiva, no Conjunto Califórnia (Região Noroeste). Chegaram dois rapazes, um deles parecendo drogado, e anunciaram o assalto. Eles me empurraram e levaram o carro, o laptop e aparelhos de celular”, conta.
Segundo ele, o policial que atendeu a ocorrência havia dito que a dupla era suspeita de assaltar outras pessoas na mesma região. Poucos dias se passaram e uma reportagem na televisão chamou a atenção de Ângelo. Um dos criminosos que o abordaram morreu ao assaltar uma padaria e trocar tiros com um policial à paisana que lanchava no estabelecimento. Até hoje, confessa, o rapaz sente insegurança ao rodar pela região em que foi assaltado.
Graciana Pimentel, de 35, vítima de três roubos, enfrentou no primeiro uma situação parecida com a relatada por Ângelo. “Eu e meu namorado havíamos estacionado em frente à casa de minhã mãe, no Bairro Ipanema (Noroeste), e fomos abordados por dois rapazes armados, que levaram o carro. Depois, no Coração Eucarístico (mesma região), quatro rapazes me tomaram o celular. Por fim, no Padre Eustáquio (também Noroeste), novamente me levaram o carro”, enumera.
Na última ocorrência, em 2015, ela foi abordada por um homem com um facão. “Eu estacionei e o ladrão abriu a porta, me mostrou a arma e me mandou ficar calada. Desci e ele levou o carro e minha bolsa com dinheiro e vários documentos. Também o telefone, do qual eu tinha pago só quatro das 10 parcelas que financiei.”
Polícia critica leis que põem infratores de novo nas ruas
Um dos desafios das instituições de segurança pública para reduzir as ocorrências de roubos em Belo Horizonte está na chamada repetência criminal, representada por pessoas que retornam ao mundo do crime logo depois de serem soltas pela Justiça. Na capital, segundo informações da Polícia Militar, esse indicador ultrapassa os dois dígitos. Em 2015, por exemplo, foi de aproximadamente 42%. “Em 2016, a taxa foi de 33%. Nos dois primeiros meses de 2017, já ultrapassa os 10%”, informou o Comando de Policiamento da Capital, em nota. No texto, a corporação avalia que o quadro se deve, além de outros fatores, a uma legislação “que permite a soltura do infrator, mesmo que contumaz”.
O avanço dos crimes contra o patrimônio também é atribuído pela PM, em parte, aos eventos ocorridos a partir de 2012, que atraíram uma população flutuante a Belo Horizonte. É o caso, por exemplo, da Copa das Confederações, em 2013, e da Copa do Mundo, no ano seguinte. O crescimento do carnaval na cidade também é outro ímã para turistas. “A Polícia Militar se preocupa com a vida, a integridade física e com o patrimônio das pessoas, independentemente dos índices apresentados. Essa realidade dos números trazidos para Belo Horizonte é de semelhante evolução na maioria das capitais dos estados brasileiros no período”, sustentou a PM. Até o fechamento desta edição, a Sesp não se pronunciou sobre o assunto.