Moradores temem que norma que libera música ao vivo prejudique lei do silêncio

Estabelecimentos comemoram regra da PBH que permite som ao vivo em bares e restaurantes, enquanto moradores se preocupam com a falta de fiscais para inibir os altos volumes

João Henrique do Vale
População do entorno de áreas com concentração de bares com música ao vivo está preocupada com fiscalização - Foto: Túlio Santos/EM/D.A PRESS - 09/10/2015
Ao que tudo indica, a instrução normativa que libera a música ao vivo e outras manifestações culturais em bares e restaurantes não vai colocar um ponto final nas discussões entre os donos desses estabelecimentos e seus vizinhos. Enquanto empresários do setor e músicos comemoraram a medida da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), moradores que têm casas próximas aos estabelecimentos temem perder o sono por causa do som alto. A administração municipal promete mais rigor na fiscalização dos comércios, que terão que cumprir o que determina a Lei 9.505/2008, legislação municipal de emissão de ruídos. Mesmo assim, os vizinhos se mostram descrentes e lembram que há poucos fiscais e muitos locais para serem visitados na cidade.

Com a publicação do documento, que deve ocorrer nos próximos dias, os estabelecimentos do setor em BH  se enquadram na atividade de entretenimento, conforme a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (Cnae), fugindo das imposições do Código de Posturas, que, entre outras exigências, impunha a realização de estudos de impacto na vizinhança para permitir atividades culturais como música ao vivo, saraus, dança, entre outras.


Após a publicação, qualquer bar ou restaurante poderá ter atividades de entretenimento, como músicas ao vivo. Possibilidade que já preocupa quem vive no entorno da Rua Alberto Cintra, na Região Nordeste de Belo Horizonte. Concentrando vários estabelecimentos, a via já foi alvo de polêmicas por causa do barulho, que até levou os moradores e comerciantes a celebrar um acordo para evitar a música na região.

Porém, com a medida da PBH, moradores temem que a situação se descontrole.“Irresponsabilidade. É uma palavra que resume. Como aprovam um regulamento sendo que não tem fiscalização suficiente para verificar (seu cumprimento)? Se houvesse fiscalização,  o problema não seria na música.

Não atendem às demandas da população”, afirma Pablo Ramos, diretor de um hotel na região. “Não atuam na fiscalização. Fazemos ligações quase diariamente e nunca tem fiscal disponível. Temos que ligar e saber o dia que tem fiscal de plantão para fazer a vistoria”, completou.

O presidente da Associação de Moradores da Praça Marília de Dirceu e Adjacências (Amalou), Jeferson Rios Domingues, também teme que a normativa piore o barulho. “Não somos a favor. Somos contra e temos um acordo com a Abrasel desde 2011 para que os estabelecimentos não coloquem som acima do limite de decibéis determinados por lei até as 23h. Tem dado certo até agora”, comentou. Depois da divulgação da normativa, a Amalou já convocou uma reunião para a próxima semana para reforçar o acordo.

Referência para os bares e restaurantes liberados pela norma para adotar programações musicais, a Lei 9.505/2008 determina que entre as 19h e as 22h o limite de ruídos permitido é de 60 decibéis; das 22h até meia-noite, de 50 decibéis; e, na madrugada, entre meia-noite e as 7h, o máximo permitido é de 45 decibéis. A PBH afirmou que vai agir com mais rigor na fiscalização, inclusive contra carros de som que ficam próximos aos bares e restaurantes.

Mesmo com a previsão de mais fiscalização, os moradores não acreditam que a medida dê certo. “A fiscalização não tem sido feita. São poucos fiscais para muitos bares e restaurantes. A não ser que coloquem mais fiscais. Eles só aparecem quando são chamados e quando há denúncia.
Não há muitas pessoas para fazer o trabalho. Então, acho que vai ser uma baderna total”, reclamou Jeferson Domingues.

MAIS PUNIÇÕES O número de punições a estabelecimentos que descumpriram a legislação de poluição sonora aumentou no ano passado em relação a 2015. Foram aplicadas 328 advertências e multas em 2016. Já no período anterior, foram 250 advertências e multas. Vale ressaltar que não apenas bares e restaurantes estão incluídos, mas também igrejas e serviços de construção civil, entre outros. Os valores das multas, de acordo com sua gravidade, variam de R$ 140,33 a R$ 17.576,64.

‘CIDADE VIVA’ Enquanto os moradores demonstram preocupação, os comerciantes comemoram a instrução normativa. “Da forma antiga, não havia condição de propagação da cultura, de ter apresentações teatrais, manifestações culturais, e até voz e violão em bares e restaurantes, pois tudo isso só era permitido em casas de shows. O que a administração percebeu é que, igualando o Código de Postura ao Cnae nacional, é possível ter intervenções culturais no dia a dia da cidade”, afirma o presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes em Minas Gerais (Abrasel-MG), Ricardo Rodrigues. “A prefeitura não está fazendo uma cidade barulhenta. Está fazendo uma cidade viva”, completou.

Outro ponto a favor, segundo Ricardo Rodrigues é que, com a nova regra, serão gerados cerca de 5 mil empregos no setor, não apenas com a contratação de artistas, mas com o aumento de pessoal no antendimento e infraestrutura dos bares e restaurantes.

O QUE MUDOU

Como era:

O alvará da atividade de bar/restaurante não contemplava a execução de música de nenhum tipo.
A fiscalização municipal aplicava notificações e multas, ainda que a música fosse ambiente. O entretenimento musical só era permitido para as atividades de casa de festas e boate/casa de shows, que dependiam de um licenciamento urbanístico considerado inviável pelos bares e restaurantes.

Como fica:

Com a instrução normativa da Secretaria Municipal de Regulação Urbana, os fiscais passam a aceitar a atividade de música como entretenimento. No entanto, o estabelecimento deve ter o alvará de bar/restaurante válido e respeitar os limites de emissão de ruídos estabelecidos pela Lei 9.505/08.

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