A constante movimentação de caminhões-pipa, que chegam até a danificar o asfalto, não incomoda moradores de duas cidades da Região do Vale do Rio Doce. Já é rotina em Resplendor e em um bairro da vizinha Aimorés. Passados 17 meses do rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana, na Região Central de Minas Gerais, a cerca de 400 quilômetros dali, o que ainda incomoda e preocupa a população das duas comunidades é a água do Rio Doce, que foi atingida pelos rejeitos de mineração. Por isso, eles fecharam suas torneiras a ela. “A água do rio está alaranjada. Nem mesmo meu cavalo bebe”, afirma o pescador Ezequiel Gomes, de 43 anos. Depois de perder uma briga judicial, famílias dos dois municípios se revoltaram, fizeram manifestações e desde dezembro de 2015 estão sendo abastecidas pela água transportada de outros mananciais, mesmo com alguns episódios de falta, enquanto obras estão sendo feitas para captação em córregos e poços artesianos. A expectativa é que essa rede alternativa seja usada por 30 anos.
Das cidades atingidas pela tragédia ao longo do Rio Doce, Resplendor é a única que ainda não voltou, nem em parte, a captar água no Rio Doce. Os moradores temem ser contaminados por metais pesados e outras impurezas que desceram da barragem na maior tragédia socioambiental do país, que matou 19 pessoas.
Diante dessa constatação, moradores da cidade se recusam, desde o rompimento da barragem, a consumir água do Rio Doce e ganharam apoio da prefeitura. A administração municipal entrou com um pedido de liminar na Justiça para impedir a captação, que foi concedido. Mas a Copasa, responsável pela captação e abastecimento de água da cidade, conseguiu reverter a decisão no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). Depois do anúncio da nova decisão judicial, a população se revoltou e colocou fogo nas bombas que captavam água no manancial. Outros equipamentos foram instalados, o que levou as famílias a fecharem a linha do trem que liga Minas Gerais ao Espírito Santo, em protesto, em dezembro de 2015.
Diante do impasse, foi celebrado um acordo com a Samarco, proprietária da barragem que se rompeu em Mariana, para que o abastecimento fosse feito por caminhões-pipa. A movimentação dos veículos é intensa. Eles se abastecem em dois córregos de Resplendor, o Barroso e o Santaninha, e também no Rio Manhuaçu, em Aimorés. Depois, a água é levada até a central de abastecimento, que a distribui para todos os bairros. “O trânsito complicou um pouco, mas é preciso usar os caminhões”, resigna-se o funcionário público Marco Aurélio Nunes de Oliveira, de 44. Esquema semelhante é visto no Bairro Mauá, em Aimorés, o único abastecido por caminhões-pipa na cidade..