No projeto Ler é viver, promovido pelo Instituto Gil Nogueira, uma organização não governamental, a viagem pelo mundo da imaginação começa com uma caixa de livros distribuídos no início de cada semestre às turmas participantes. O kit tem 50 obras do universo infantil. Os alunos são estimulados pelos professores a ler e interpretar as obras. Mas não basta ler.
A premiação é feita por categorias. Aqueles que leram e interpretaram de 8 a 22 livros recebem o bronze. Os que alcançarem a marca de 23 a 44 livros, a medalha de prata. E quem lê entre 45 a 50 livros leva o ouro para casa. As crianças que lerem e interpretarem todos os 50 livros disponibilizados no semestre recebem ainda uma medalha de “campeão de leitura”. Caso de Maria Cecília, que participa desde o 1º ano do projeto na Escola Estadual Emília Cerdeira, no Bairro Betânia, e que só não recebeu a honraria máxima no ano passado, quando conseguiu contar a história de 45 livros. Nos anos anteriores, ela interpretou todos os 50. “Eu me sinto num conto de fadas. Gosto muito de ler contos e aventuras. Às vezes, leio quatro vezes o mesmo livro. Dá para viajar”, conta a garotinha, fã da Turma da Mônica. Ela, que sonha ser advogada e empresária, gosta de inventar histórias e escrever.
A mãe, Deise Barbosa Otoni, de 36, tem o maior orgulho da filha leitora e diz que a pequenininha, Marcela, de 3, vai pelo mesmo caminho, sempre folheando os livros que têm em casa. “A Maria Cecília fica empolgada, quer contar as histórias e se a irmã atrapalha, fica brava. Quando não tem nada para ler, ela pega o dicionário. Tomara que esse contato com os livros agora dê um bom resultado no futuro”, diz a auxiliar de apoio à inclusão de uma Unidade Municipal de Educação (Umei).
TRANSFORMAÇÃO O Ler é viver é promovido entre crianças de 6 a 11 anos. De acordo com a presidente do Instituto Gil Nogueira, Patrícia Nogueira, o foco no ensino fundamental tem como premissa o fato de, nessa faixa etária, ser mais fácil despertar o gosto pela leitura nas crianças. “Os números (do projeto) são muito expressivos em um país onde a cada quatro brasileiros um é analfabeto funcional. Acreditamos na transformação pela educação e o incentivo à leitura é um importante começo”, ressalta. Ela destaca ainda que os resultados de cada escola são acompanhados semestralmente, havendo crescimento da média de livros lidos a cada ano.
Caso dos estudantes Fernanda Kellen Pereira da Fonseca e Sandro Márcio Dias, ambos de 16 anos. Os dois estão no ensino médio e, em 2012, o Estado de Minas contou suas histórias por meio dos livros. Então com 11 anos e aluna do 6º ano do ensino fundamental, Fernanda faturou na época a medalha de diamante ao ler 60 livros e contar a história de 58 – categoria e média que distinguiam quem lia mais quantidade de obras até 2011.
Naquele ano, a menina, que hoje sonha ser juíza e ainda conserva a voz doce e meiga, encontrou nas obras literárias o refúgio para superar um drama familiar: a perda da irmãzinha, de apenas dois anos e 8 meses. “Pelo que passei na época, os livros foram meu grande incentivo. E ainda são”, relata ao lado dos pais, o vigilante Walter Luiz da Fonseca, de 43, e a doméstica Cláudia Pereira da Fonseca, de 42. O pai relembra o empenho da filha: “Pelo momento que estávamos passando, não acompanhamos muito esse processo. Ficávamos preocupados, pois ela passava o tempo todo trancada no quarto, até o dia em que descobrimos que era por causa do projeto”, relata.
Sandro vê nos pés seu grande futuro, mas também não abandonou a leitura. Aos 11 anos, tentava o bicampeonato para repetir o feito de 2011, quando leu 51 livros. Inspirado no irmão, João Pedro, quatro anos mais velho e que também havia participado do projeto, alcançando a marca de 41 obras, e contando sempre com a ajuda do pai, o diretor de autoescola Nilton Batista Dias, de 58, também teve nas histórias a ajuda para superar a tristeza da mãe doente. Com um olho nas páginas e outro no futebol, ele segue em frente em busca do sonho de ser um grande jogador, se dedicando ao esporte numa escola especializada. Ele ainda considera a leitura algo importante. E o pai, sempre presente, não perde o foco: “Com leitura eles estão sempre desenvolvendo. Continuo com o mesmo orgulho dos meus filhos”.
Ação para presentear livros
Fazer a criança ter um livro para chamar de seu e, a partir disso, mudar a própria história. Acreditando nessa transformação por meio das letras, uma empresa mineira lançou recentemente uma plataforma digital inédita e inovadora para ajudar a minimizar os efeitos do que considera ser o maior problema social do país: a educação precária. Por meio do projeto 1book4life (Um livro para a vida), pessoas comuns, empresas e investidores sociais são estimulados a presentear com livros estudantes carentes de diversas partes do Brasil. No processo, têm a oportunidade de acompanhar, permanentemente, o trajeto das obras e os resultados da iniciativa.
Pesquisa divulgada pelo Instituto Pró-Livro (IPL) no ano passado mostra que a leitura é um hábito de 56% da população brasileira. Para ser considerado um leitor, pela metodologia do estudo, é necessário ter lido ao menos um livro três meses anteriores ao levantamento. O percentual de leitores variou pouco em relação aos dois últimos estudos feitos: 55% em 2007, e 50% em 2011. Em média, os entrevistados disseram ter lido 2,54 livros no intervalo de tempo pesquisado, sendo 1,06 do começo ao fim. Entre os que têm o hábito da leitura, a média é de 4,54 obras no período, com 1,91 inteira.
O programa convida escolas públicas dos municípios brasileiros com indicadores sociais, geográficos e educacionais (menores índices de desenvolvimento da educação básica, o Ideb) mais críticos para ingressar. São 6.310 instituições de ensino já cadastradas, com 2,3 milhões de alunos. Como numa grande história de transformação, a ideia é mudar vidas. Todos os alunos da escola atendida recebem livros de presente. Presentes de verdade, com direito a embrulho especial. Cada um ganha dois livros diferentes e é estimulado a trocá-los com seus colegas para, dessa forma, ter um grande acervo compartilhado. Os livros são dos alunos, que os levam para casa. A ideia é que o hábito da leitura alcance irmãos, pais, amigos, vizinhos, mudando a história de uma comunidade inteira.
Em Minas Gerais, estão na lista instituições de 17 cidades, sendo duas delas da Região Metropolitana de Belo Horizonte – Betim e Ribeirão das Neves. “Ter livros em casa, pais que leem, ser exposto ao fato de a família tratar a leitura com naturalidade é muito marcante no momento em que o aluno é dono do livro. Hoje, ele é dono do livro na escola, onde lê livros de formação e não de literatura, que são os que induzem à leitura e, consequentemente, ao aprendizado”, afirma o diretor do Instituto do Gesto Bom, responsável pelo 1Book4Life, Mário Herkenhoff Coelho..