Ponte Nova e Viçosa – A falta de vegetação nas áreas de preservação permanentes (APPs) traz reflexos severos ao abastecimento de água de várias regiões, como a Zona da Mata. Para se ter uma ideia, a população de 78 mil habitantes de Viçosa enfrenta rodízios e racionamentos desde 2013. “Aqui chovia até 1.400 milímetros por ano e nos últimos quatro anos caiu para 900mm. E o pior é que essas chuvas não recarregam mais os lençóis, pois não existem mais florestas. Sem a vegetação para amortecer a chuva e reter a água mais tempo para ser absorvida pelo solo, as nascentes param de minar água e os rios mínguam”, avalia o coordenador técnico da Área de Meio Ambiente da Emater-MG em Viçosa, Marcelo Caio Libânio Teixeira. “Já é um desastre ecológico. Estamos no fim do período chuvoso e os reservatórios estão secos. A previsão é de que vamos enfrentar racionamento pelo quarto ano consecutivo”, afirma Teixeira.
Segundo dados da Emater, nos 19 municípios da regional de Viçosa restam 7% de cobertura vegetal original, enquanto nos 22 pertencentes à região de Ponte Nova, o índice é de 12% – em ambas o predomínio é de mata atlântica. “O problema na região de Viçosa é o desmatamento para abrir espaço para as pastagens e a forte pressão de constituição de chácaras e condomínios, muitos deles sem qualquer licenciamento. Em Ponte Nova, a mata é derrubada para fazer carvão. O índice é um pouco melhor em Ponte Nova, porque o carvoeiro acaba permitindo que algumas áreas se regenerem para que sejam cortadas depois”, afirma o coordenador da Emater. Daí a importância do CAR como uma base de dados que vai ditar qual o tamanho de área a ser recomposta em cada terreno.
Mas a utilização da base de dados do CAR para a recuperação de APPs só deve ocorrer num terceiro momento, de acordo com o IEF. Findada em dezembro a fase de cadastro declaratório, feita pelos responsáveis pelos terrenos rurais, começa a verificação e a validação dos cadastros, que pode ser feita de forma remota, com o uso de satélites, por exemplo, ou fiscalizada. A etapa seguinte consiste nas fiscalizações e nos esforços para a conformidade das propriedades, que pode ser por meio do Programa de Regularização Ambiental (PRA) a ser definido por cada estado.
ÔNUS De acordo com dados do IEF, a recuperação de APPs é cara, com um custo médio de R$ 10 mil por hectare e essa responsabilidade é do proprietário, algo que causa grande controvérsia. Mantendo-se essa média, para recompor os cerca de 270 mil hectares de APPs degradas em Minas Gerais seria necessário um investimento de R$ 2,7 bilhões. “Estão sendo acertadas linhas de crédito do Banco Mundial, do BDMG e do BNDES. Outras estratégias, como a utilização de espécies com aproveitamento econômico também são estudadas, como por exemplo a macaúba, que produz um coco cujo óleo tem bom valor de mercado”, afirma o gerente de reserva legal do IEF, Gustavo Luiz Godoi de Faria Fernandes.
Contudo, segundo o secretário-geral da Comissão Estadual de Meio Ambiente da OAB/MG, Bernardo Campomizzi Machado, a responsabilidade ambiental do proprietário, do possuidor ou do responsável direto pelo imóvel rural será sempre objeto de discussões jurídicas. “A Constituição Federal determina a reparação integral do dano causado ao meio ambiente, mas também a dignidade humana e da ordem econômica. Preocupa-nos sempre a pequena propriedade rural de onde o produtor retira o sustento de sua família. A situação de cada imóvel deverá ser levada em consideração no ato da assinatura do PRA”, afirma.
Naquele estágio, a revegetação não seria a melhor solução, já que o crescimento da mata é lento e só ocorre no médio prazo. “A situação é tão crítica que o melhor a se fazer é abrir um valetamento – perfurar valas de 50 centímetros nas curvas do terreno – para que a água de chuva se empoce e penetre no solo até o aquífero”, afirma Teixeira.
O destino dos cursos d’água, o Ribeirão São Bartolomeu, se tornou uma série de barramentos de água parada dentro do campus da Universidade Federal de Viçosa (UFV), onde é feita a captação pública e da instituição. Uma ironia estar num centro de excelência tecnológica e de manejo um problema que não é solucionado por falta de ação.
Em Ponte Nova, as áreas são devastadas dentro das grandes propriedades e as táticas para impedir denúncias e fiscalizações é a de se manter uma faixa de vegetação intacta, funcionando como uma barreira visual para o desmatamento que ocorre atrás e transforma a selva em pastos e a madeira removida em carvão..