Luciano Dias, de 35 anos, conta que há três décadas o avô pescava no córrego paralelo à Rua Coletora, na Vila Pinho, no Barreiro. “A água que um dia foi limpa, cheia de peixes, hoje é um esgoto a céu aberto, criatório de ratos e baratas”, constata. O leito imundo e outros problemas que prejudicam a saúde da vizinhança, como bota-fora irregular, puxam a Vila Pinho para o fim da fila de um ranking sobre a longevidade em Belo Horizonte. Quem nasce lá tem expectativa de vida de 69,85 anos. O topo da lista é ocupado pelos bairros Belvedere e Mangabeiras: 82,04 anos – uma diferença de 12,19 anos. A título de comparação, a média no Brasil é de 73,94 anos.
“O índice não abrange todos os aspectos de desenvolvimento humano e não é uma representação da ‘felicidade’ das pessoas. Nem indica o melhor lugar no mundo para se viver, mas sintetiza três das mais importantes dimensões do desenvolvimento humano. Amplia e fomenta o debate, instrumentalizando a sociedade sobre o estado da qualidade de vida nas unidades federativas, municípios, regiões metropolitanas, estimulando a concertação de atores de forma a protagonizar atividades e políticas inovadoras para a superação dos desafios locais rumo ao desenvolvimento humano”, disse Mônica Galupo, pesquisadora do Centro de Políticas Públicas da FJP.
No trabalho, os pesquisadores agruparam bairros e vilas de BH em unidades de desenvolvimento humano (UDH). Em seguida, calcularam a esperança de vida para cada uma delas. A Vila Pinho é um dos aglomerados que fazem parte da UDH Vila Ecológica Águas Claras, que compreende ainda a Vila Formosa e os bairros Castanheira, Santa Cecilia, Vila Formosa, Jardim do Vale, Santa Rita, Vitória da Conquista, Águas Claras e o Distrito Industrial do Jatobá.
Trata-se de uma área típica de ocupação irregular. Por isso, casas como a de Maria de Lourdes Soares, natural de Montes Claros, no Norte de Minas, têm condições precárias. A mineira vive às margens do poluído córrego paralelo à Rua Coletora. Quando chove, a água sobe e invade parte do terreno onde ela planta ora-pro-nóbis, chuchu e cebolinha. Ao lado da pequena horta fica o fogão a lenha em que ela cozinha feijão – “porque é mais demorado e botijão de gás está caro para danar”, como comenta.
Maria de Lourdes mora com a filha, Poliana, de 33. A renda da família é de um salário mínimo, bancado pelo governo como benefício devido ao tratamento de saúde que Poliana faz na capital. “Deixamos o Norte para que ela pudesse se tratar”, conta a mãe, que ajuda a filha a cuidar do neto, Artur, de 2.
A família é vizinha de Luciano, o rapaz que se lembra da pescaria no leito hoje poluído. Casado com Maria Erlândia Ribeiro, de 29, ele tem quatro filhos. “Eu e ela somos garis, mas perdemos o emprego no ano passado devido à crise. Não somos beneficiários do Bolsa-Família, mas somos brasileiros, ou seja: não perdemos a esperança de dias melhores”, disse o morador da Vila Pinho.
Outro morador da vizinhança, o servente de pedreiro Renato Ribeiro, de 26, também está à caça de uma vaga no mercado de trabalho. Sua meta, contudo, é voltar para o interior. “Sou de Padre Paraíso (no Vale do Jequitinhonha) e decidi colocar minha casa à venda. Está anunciada por R$ 20 mil”, contou ele.
Assim como a região da qual a Vila Pinho faz parte, três UDHs da capital têm a mesma expectativa de vida de 69,85 anos, todas na Região do Barreiro: Bonsucesso/Novo das Indústrias/São João, Itaipu/Vila Piratininga Especial e Vila Átila de Paiva.
No topo da lista dos bairros onde a longevidade é maior, depois do Belvedere e Mangabeiras (82,04 anos) aparecem a UDH Santo Agostinho/Lourdes (81,88 anos), a UDH Savassi/Funcionários (81,82 anos) e a UDH Cidade Jardim/Santa Lúcia/São Bento (81,59 anos) – todas na Região Centro-Sul de BH.