O homicídio ocorreu às 9h, na Avenida Tereza Cristina, Bairro Calafate, Região Oeste de BH. O motivo, segundo a testemunha: uma briga de trânsito que envolve o primeiro-sargento Ronildo da Silva, do Batalhão de Choque da Polícia Militar (BPChoque). Em trajes civis e fora do horário de serviço, o militar, de 48 anos, teria se irritado depois de ser fechado pelo veículo de Anderson. Depois de deixar o local e mais tarde se entregar na unidade onde trabalha, Ronildo foi preso em flagrante. Ele já tem passagem por outro homicídio, ocorrido na década de 1990 no Sul de Minas Gerais, e cumpriu pena de dois anos em regime fechado.
Em depoimento ontem, ele alegou ter atirado por suspeitar de uma tentativa de assalto. O caso chama a atenção para as discussões ocorridas no trânsito que resultam em lesão corporal dos envolvidos. Dados da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp) mostram que neste ano, até abril, foram 20 ocorrências do tipo no estado. No ano passado, esse tipo de delito somou 95 ocorrências.
Apesar da alegação do policial sobre a suspeita de assalto, dados colhidos pela Polícia Militar com testemunhas do crime confirmam a versão de discussão de trânsito.
“Ele observou um indivíduo de estatura mediana, moreno, trajando camisa de cor azul, que caminhava entre os veículos, e imaginou que fosse um vendedor de balas. O indivíduo se aproximou da Ford Ranger (da vítima) e escutou um barulho como se fosse um tapa no vidro do veículo. O indivíduo de camisa azul saiu correndo, entrou no Polo de cor preta e evadiu do local”, descreve a ocorrência policial, sobre o depoimento da testemunha.
A versão foi confirmada pelo bombeiro hidráulico que acompanhava a vítima na caminhonete. “Foi uma briga de trânsito. O Anderson pediu passagem, porque precisávamos fazer um retorno para pegar o sentido Contagem da Via Expressa. Quando ele entrou na frente do carro, o policial não gostou, desceu e já deu o tiro”, relata. Ele conta que o colega ainda colocou a mão no peito, após o disparo, e pediu socorro. “O trânsito estava parado. Então o deitei no chão, mas ele morreu nos meus braços, ainda no local”, lamenta.
Segundo a testemunha, os dois voltavam de uma clínica veterinária onde haviam pegado a cachorrinha da mulher de Anderson e voltariam para o Bairro Califórnia, onde moram, antes de ir para o trabalho, uma obra na Avenida Cristiano Machado. “Estou chocado com o que aconteceu, porque Anderson só pediu passagem para fazer um retorno. Ele sempre foi uma pessoa tranquila, alegre e do bem. Era evangélico e não tinha vícios.
O policial militar foi detido em flagrante e prestou depoimento ontem no Departamento de Investigação de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). Com 27 anos de atuação na PM, atualmente ele trabalhava na Sala de Operações do BPChoque. O primeiro homicídio que cometeu também foi um crime comum, com arma particular, cometido na cidade de Cruzília. Na época, o militar ficou preso entre os anos 1998 e 2000. “Ele cumpriu pena, e aí é uma questão judicial a manutenção dele nas fileiras da corporação”, afirmou o major Flávio Santiago, chefe da Sala de Imprensa da PM, questionado em coletiva de imprensa, ontem, sobre o fato de um militar ter permanecido na corporação após a sentença.
Anderson Cardoso Inácio foi atingido na região do tórax, perto do pescoço, de acordo com o major. “Segundo a testemunha da Ford Ranger, em um primeiro momento ele ouviu só um disparo, não conseguiu enxergar o ocorrido em si.
A Polícia Militar levanta outras informações.
EMOCIONAL
Para o professor aposentado da Escola de Medicina da UFMG João Gabriel Marques Fonseca, os carros são um reflexo do estado emocional do motorista no trânsito. “Um carro é uma extensão do corpo humano e de seus sentimentos de quem está dentro. No congestionamento, se seguirmos esta linha, é uma multidão, cada um com um reflexo de sentimentos diferente.”
De acordo com João Gabriel Marques, o trânsito é um meio de alta-tensão onde a ação rápida é necessária. “O trânsito cobra dos motoristas uma atenção e gera uma tensão muito grande. Às vezes temos que agir rápido, sem pensar muito no que iremos fazer, e nem sempre isso será positivo. O número de carros nas ruas tem aumentado muito e as tensões, também.” Não há, segundo o professor, uma explicação genérica para os confrontos. “O que vemos hoje são as pessoas cada vez mais sem referências que norteiam nossas ações dentro de determinado conceito ou ideia, e sempre que as referências são menores, a intolerância tende a prevalecer e as pessoas ficam frágeis às frustrações diárias.”
*estagiária sob supervisão do editor André Garcia
Intolerância
Registros de lesão corporal após conflito relacionado a trânsito
Fonte: Secretaria de Estado de Segurança Pública
Em Belo Horizonte
21 (de janeiro a dezembro de 2015)
12 (de janeiro a dezembro de 2016)
4 (de janeiro a abril de 2017)
Em Minas Gerais
121 (de janeiro a dezembro de 2015)
95 (de janeiro a dezembro de 2016)
20 (de janeiro a abril de 2017).