Uma flor branca no fundo azul, peixes em círculos na imensidão do mar e a lua crescente no céu escuro. Mas há também ideogramas japoneses, sombras num deserto e figuras que, dependendo da imaginação de quem vê, causam impacto, surpresas e sempre encantamento.
A arte do belo-horizontino Marcos Farias Moraes Mello, de 31 anos, está presente em 20 telas, pintadas com tinta acrílica sobre papel, e resultado de superação aliada a muita criatividade.
Morador do Bairro Sion, na Região Centro-Sul da capital, Marcos foi diagnosticado, ao nascer, com microcefalia, o que não impediu o crescimento num ambiente inclusivo e aberto a todas as manifestações artísticas.
“Desde os cinco anos, ele está ligado à pintura, à dança e à música. Acredito na pedagogia da vida, do prazer”, orgulha-se a dentista Marcides Faria Moraes, mãe também do publicitário Camilo, de 34.
Até ontem, os quadros inéditos do artista estavam em cartaz no saguão da Câmara Municipal de Belo Horizonte e há planos para que, dentro de seis meses, a mostra A felicidade do Marquinhos possa ser vista na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), adianta Marcides. De braços dados com a mãe, o rapaz conta que está feliz e gostando muito de ver os trabalhos expostos. “Precisamos dar visibilidade aos invisíveis”, diz a dentista, que morou 15 anos em Portugal com o filho autodidata e sempre procurou escolas especializadas para matriculá-lo.
Com um sorriso de felicidade, que se harmoniza perfeitamente com o nome da exposição, Marcides revela que todos os quadros foram vendidos. Na verdade, a mostra se tornou possível graças a uma campanha de financiamento coletivo, viabilizada por meio de um espaço de e-commerce (comércio digital) e divulgada pelo Estado de Minas.
POEMAS Satisfeita da vida, Marcides contou que a arte de Marcos ganhou asas há dois anos, quando um amigo espanhol, o pintor e escritor Chencho Zocar, viu os trabalhos e ficou impressionado com a qualidade.
“Gostou tanto, que escreveu 20 poemas, um para cada tela. O resultado foi a publicação do livro Unidos pela luz, em edição bilíngue, que serviu para mostrar, à família, a capacidade ilimitada de Marcos.
Presente ao último dia da exposição, Fátima Nogueira, tia do artista, disse que o sobrinho traz uma ”experiência divina” e consegue apresentar sua arte em colorido vivo e se inserir na sociedade, mesmo com as limitações.
Os funcionários do Legislativo Municipal se emocionaram. “É muito bonito ver esta superação. Vale destacar que o incentivo da mãe é fundamental”, ressaltou a auxiliar de secretaria Carla Lopes.
NASCIMENTO A dentista Marcides Faria Moraes ficou sabendo que o filho Marcos tinha microcefalia logo que ele nasceu. “Na época, era uma doença que só existia na literatura, não teve nada a ver com zika. Foi um caso pontual”, explica. Se houve as dificuldades no início, o tempo e a arte se encarregaram de fortalecer os laços e apontar os caminhos.
Segundo os especialistas, a microcefalia é uma malformação congênita, em que o cérebro não se desenvolve de maneira adequada. Nesse caso, os bebês nascem com perímetro cefálico menor do que o normal, que habitualmente é superior a 32 centímetros
Pode ser efeito de uma série de fatores de diferentes origens, como exposição durante a gravidez a substâncias químicas e agentes biológicos (infecciosos), como elementos radioativos, bactérias e vírus.
Cerca de 90% dos casos de microcefalia estão associados a deficiência mental, exceto nas de origem familiar, que podem ter desenvolvimento cognitivo normal. O tipo e o nível de gravidade da sequela variam caso a caso. Tratamentos feitos desde os primeiros anos melhoram o desenvolvimento e a qualidade de vida.