Foi uma reação à decisão que, na prática, permite a motoristas de serviços como Uber e Cabify circularem livremente na capital e em outras cidades mineiras, podendo inclusive fazer viagens intermunicipais. A sessão da 1ª Câmara Cível do TJMG foi tensa e se prolongou pela tarde de ontem. Ao fim, os desembargadores decidiram pela parcial ilegalidade da Lei Municipal 10.900, de BH. Regulamentada em abril do ano passado, ela fixa normas para o funcionamento dos aplicativos que oferecem serviços privados de transporte e determina, na prática, que somente condutores cadastrados na BHTrans atuem por meio deles.
No entendimento do TJMG, os motoristas não estão sujeitos à exigência de cadastramento na BHTrans, apenas na empresa representante de cada aplicativo. Sendo assim, nenhum condutor parceiro pode ser multado por transporte clandestino. Na prática, o serviço continua nos moldes em que está. A decisão vale para circulação em Belo Horizonte e também para viagens da capital para outras cidades, o que traz impacto sobre a regras fiscalizadas pelo Departamento de Edificações e Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DEER/MG). Nesse caso, o órgão estadual também está impedido de multar.
DECISÃO O julgamento começou às 13h30. Advogados de diversas partes, entre elas da BHTrans, DEER/MG e da própria Uber, fizeram a sustentação de suas teses. O desembargador Corrêa Júnior, relator do processo, defendeu a inconstitucionalidade da Lei Municipal 10.900, mas seu parecer foi derrubado por seis votos a dois.
O que estava em jogo na sessão era um Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva (IRDR), para uniformizar o entendimento das câmaras do tribunal em relação à questão. A instauração foi provocada por um usuário do Uber, que requereu o reconhecimento da legalidade do funcionamento do aplicativo em Minas Gerais. Em outubro do ano passado, o processo foi aberto para que vários órgãos se manifestassem. O Ministério Público se manifestou pela não aplicabilidade da lei municipal e do Código de Trânsito Brasileiro à atividade exercida pelo Uber, discorrendo sobre a insuficiência dos serviços de transporte público tutelados pelo Estado.
REAÇÃO Do lado de fora do tribunal, na Avenida Afonso Pena, no Bairro Cruzeiro, na Região Centro-Sul de BH, a multidão de taxistas que desde cedo protestava contra a concorrência reagiu com protestos, carreatas e ameaças. Por meio de nota, a BHTrans informou que vai aguardar a publicação da decisão para, se for o caso, se manifestar. O DEER adotou postura semelhante.
A Uber informou que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais consolidou o entendimento que a empresa já tinha – de que o serviço oferecido por seus motoristas parceiros é legal no Brasil. “A decisão do IRDR é a primeira do tipo no país e reforça o direito de escolha da população de Minas Gerais e, principalmente, o direito de gerar renda dos motoristas parceiros da Uber”, informou, em nota.
Revolta, tensão e tráfego parado
A decisão da Justiça permitindo a operação de aplicativos de transporte em Minas revoltou taxistas, que agora ameaçam com protestos diários em BH. Desde o fim da manhã de ontem, motoristas estacionaram táxis no entorno da Praça do Papa, na Região Centro-Sul da capital. O grupo desceu a pé para a porta da unidade do Tribunal de Justiça, onde permaneceu até o fim da sessão. Após a decisão, representantes da categoria seguiram em carreata até a porta da Prefeitura, na Avenida Afonso Pena, onde voltaram a fechar o trânsito.
O presidente do sindicato da categoria (Sincavir), Avelino Moreira, afirmou que as manifestações vão continuar. “A partir de hoje, todos os dias, a partir das 18h, só se transita nesta cidade por vias aéreas. Porque aqui embaixo vai lacrar tudo. A partir de hoje está tudo fechado até que a ordem se restabeleça. Até que a justiça realmente aconteça”, disse.
Momentos de tensão marcaram o protesto quando um carro que trabalhava para um dos aplicativos de transporte passou pela manifestação. Taxistas obrigaram a passageira a descer, quebraram o para-brisa e só se acalmaram depois que a Guarda Municipal interveio. Condutores de táxi que não aderiram à passeata foram hostilizados pelos colegas que participavam do ato, o que demandou nova intervenção, desta vez da Polícia Militar. Diante do TJMG, outros protestavam acenando com notas de real.
O presidente do Sincavir conclamou os presentes a comparecer a uma reunião com o prefeito da capital, Alexandre Kalil, marcada para hoje. Durante vários momentos do protesto o trânsito no Centro de BH ficou travado. Segundo o site Maplink, por volta das 18h52, o congestionamento chegou a 70 quilômetros em toda a cidade. Por volta das 19h30 os manifestantes se dispersaram. (*Estagiário sob supervisão do editor André Garcia)