Jornal Estado de Minas

Onda de assaltos no câmpus Pampulha é reflexo da crise na UFMG

- Foto: Juarez Rodrigues/EM/DA PressQuando o início da crise orçamentária, em 2014, obrigou a Universidade Federal de Minas Gerais a demitir funcionários terceirizados de segurança e portaria, os alunos já questionavam a falta de proteção. O medo começou a rondar o câmpus Pampulha com mais intensidade. Hoje, dois anos e meio depois, o temor não é mais baseado em suposições. Uma onda de assaltos toma conta da maior instituição de ensino superior do estado. Na cidade chamada UFMG, somente no primeiro semestre deste ano foram 32 ocorrências, de acordo com a Polícia Militar, seis apenas neste mês. A mais recente aconteceu anteontem à noite: dois homens abordaram um aluno no estacionamento e levaram o carro dele. Estudantes cobram soluções. Hoje, PM e reitoria se reúnem para traçar estratégias para tentar conter a violência.

Na comparação com o primeiro semestre do ano passado, houve leve redução – foram 35 crimes.

O contrário se percebe nos dados levantados entre 1º e 23 de agosto: seis este ano e cinco em 2016. “É preciso lembrar que nesse período houve um reforço policial devido à Olimpíada”, afirma o major Fábio Almeida, comandante da 17ª Companhia da PM, responsável pela área. Segundo ele, a UFMG é tratada nos boletins de ocorrência em separado, como se fosse um bairro. “Hoje, a tendência é não haver aumento substancial dos registros”, acredita.


O major explica que reuniões com a reitoria são frequentes – somente este ano foram duas –, mas agora o que se tentará é um consenso para um policiamento mais específico na universidade. A implantação de bases móveis e viaturas especializadas e o aumento do efetivo de vigilância privada está entre as possibilidades que devem ser tratadas. “O que deve evoluir é parceria maior para iluminação dentro do câmpus e controle maior de quem entra e sai, além de um policiamento mais específico em determinados horários”, diz.

Anteontem, dia de jogo no Mineirão pela semifinal da Copa do Brasil, estudantes usaram grupos nas redes sociais para falar de um assalto a pedestres que estavam em um ponto de ônibus em frente ao Instituto de Ciências Biológicas (ICB). A postagem mostrava uma mensagem no WhatsApp falando sobre cinco homens armados envolvidos em um arrastão.
Os relatos não pararam por aí. Ainda de acordo com os alunos, dois carros e uma motocicleta teriam sido levados. Ontem à noite, o Diretório Central dos Estudantes (DCE) divulgou comunicado alertando sobre o “surto de violência, assaltos e roubos” na universidade.

A PM, no entanto, foi procurada para o registro de apenas um dos casos: o roubo de um Punto, por volta das 20h, por dois homens que estavam escondidos no meio do mato e surpreenderam o estudante. Foi montado bloqueio nas saídas da universidade, mas, segundo a polícia, a vítima só acionou a corporação meia hora depois do fato, o que impossibilitou encontrar os suspeitos.
Mensagens do WhatsApp publicadas pelos alunos no Facebook mostram relatos de crimes - Foto: Reprodução internet/Facebook
VIGIAS AMARRADOS
Um dos crimes mais graves e violentos ocorreu em 30 de julho, às 6h40. Uma das vítimas, um vigilante da universidade, relatou à polícia que ao chegar ao prédio da Unidade Administrativa III, na saída para a Avenida Abraão Caran, no carro oficial da segurança para substituir o profissional que havia passado a noite de plantão, foi rendido por três homens armados, que chegaram num Fox verde. Eles amarraram os pés e as mãos dos funcionários com lacres de plástico e, de acordo com a ocorrência, os ameaçaram o tempo todo, além de ordenar que ficassem de cabeça baixa.

Um dos bandidos tirou de dentro do Fox um maçarico e um cilindro de gás para abrir um caixa eletrônico do Banco do Brasil, mas nenhum dinheiro foi levado, porque durante o processo as notas foram queimadas. A bateria do carro oficial foi usada na ação e levada pelos criminosos. A Polícia Militar relata que tudo foi filmado pelas câmeras de segurança do local, mas a qualidade das imagens não permitiu identificar a placa do veículo nem as características físicas dos suspeitos.

Prédios isolados e mais vulneráveis


Áreas ermas e mais distantes no câmpus Pampulha da UFMG são os locais preferidos dos criminosos, que atacam em locais como as proximidades dos prédios de Farmácia e Odontologia e no caminho do Instituto de Ciências Biológicas (ICB).

A maioria dos crimes foi cometida no horário noturno, mas há também muitos em plena luz do dia. O tamanho da unidade também é um desafio. São 2.842.685 metros quadrados – maior que o Parque das Mangabeiras, a maior área verde da capital, com 2,3 milhões de metros quadrados.

Uma estudante de pós-graduação no prédio da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (Fafich), que pediu para não ser identificada, confirma a sensação de insegurança. “Compreendemos que houve cortes e que a universidade está fazendo o que pode. Mas algo terá de ser feito. Tenho evitado ficar no câmpus até tarde. Quando cai a noite, parece até que o clima aqui dentro muda. Sempre houve casos de assaltos, mas agora está demais.” A Fafich é um verdadeiro complexo. Quinze edifícios abrigam aulas, laboratórios e pesquisas dos departamentos de antropologia e arqueologia, ciência política, ciências socioambientais, comunicação social, filosofia, gestão pública, história, psicologia e sociologia.

As demissões na vigilância privada na UFMG começaram em 2014. No fim daquele ano, houve um corte de R$ 30 milhões nos recursos previstos para os últimos meses, resultando na suspensão do pagamento de contas de água e luz e na dispensa de funcionários terceirizados de segurança, portaria e limpeza.
Em março de 2015, a diminuição chegou a 30% entre os servidores que faziam rondas e controlavam o espaço. Dos 280 responsáveis pela função, entre vigias de portarias, rondas motorizadas e a pé, 84 foram dispensados.

Em entrevista no início do mês ao Estado de Minas, o reitor Jaime Arturo Ramírez informou que não há previsão de mais corte de pessoal. “Não há mais como reduzir, pois se isso ocorre, põe a universidade em extrema fragilidade do ponto de vista de funcionamento”, disse, na ocasião.

Estudante de 20 anos do 5º período de geografia que também preferiu o anonimato diz que vez ou outra se têm notícias por grupos de redes sociais sobre algum furto ou roubo, mas que, nas últimas semanas, os relatos aumentaram bastante. “Foram demitidos muitos seguranças e, por isso, estacionamentos e prédios como o da Engenharia, Fafich e Farmácia, que é mais distante, ficam desprotegidos. A segurança, principalmente noturna, é muito precária e a iluminação, insuficiente”, diz. Ele não acredita que a presença da Polícia Militar possa melhorar a situação. “É ineficiente. Não surte efeito na sociedade, basta ver os índices de criminalidade em BH e outros estados”, diz.

O universitário, que fica no câmpus do horário do almoço até as 23h, tem tomado medidas de precaução para não ser mais uma vítima. Evita ficar fora dos prédios, sai mais cedo para pegar o ponto de ônibus cheio e não anda com objetos de valor. “Estou deixando computador e até cartão e dinheiro em casa.” Procurada, a UFMG não se pronunciou sobre os casos.

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