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Estado de Minas

Grafite ganha espaço nas ruas de BH

Artistas visuais dão a largada para duas intervenções na capital mineira e já mudam a cara de fachada lateral do Viaduto Moçambique e de muros na Rua Sabinópolis


postado em 10/09/2017 06:00 / atualizado em 11/09/2017 14:31

No Bairro Santa Tereza, uma parte do grafite no muro de uma escola já está pronta e atai olhares e aplausos de quem passa por lá: 'valoriza o bairro', diz o morador Carlos Ferreira(foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)
No Bairro Santa Tereza, uma parte do grafite no muro de uma escola já está pronta e atai olhares e aplausos de quem passa por lá: 'valoriza o bairro', diz o morador Carlos Ferreira (foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)

A calçada se transforma em ateliê; a superfície de concreto, numa tela; e a cidade ganha o formato de galeria de arte ao ar livre. Perto de completar 120 anos de fundação – a data será celebrada em 12 de dezembro –, Belo Horizonte assiste ao despertar do programa municipal Gentileza, que tem o objetivo de semear grafites por áreas de grande movimentação e oferecer cores, desenhos e criatividade a quem passa na rua. Ou olha da janela de casa.

Para começar, duas intervenções: no Viaduto Moçambique, na Avenida Antônio Carlos, no Bairro Cachoeirinha, na Região Nordeste, e na Rua Silvianópolis, no Bairro Santa Tereza, na Região Leste.

“Já me acostumei com o barulho dos carros e as pessoas pedindo informações”, diz, com bom humor, o artista visual Nilo Zack, que começou o trabalho na tarde desse sábado (9), no muro de contenção do Moçambique, dividindo o espaço com Hely Costa e Ataíde Miranda.

O grafite da Avenida Antônio Carlos vai ocupar 200 metros quadrados (50m de comprimento por 4m de altura), na fachada lateral entre as ruas Paranaíba e dos Operários, no sentido bairro-Centro. “A ideia surgiu como um presente para a cidade e também para transformá-la numa grande galeria”, diz Hely, de 47 anos, artista de rua com larga experiência, formado em desenho e plástica e pós-graduado na Universidade Estadual de Minas Gerais (Uemg).

Para sua parte no mural, Hely, coordenador do projeto Arte-Favela, escolheu o rosto de uma criança negra. Além de uma homenagem ao país africano que batiza o viaduto, ele diz que estudou muito antes de fazer o esboço e se interessa por manifestações culturais, a exemplo do congado. “O grafite dialoga com as pessoas, enquanto um quadro é muito limitado”, compara.

Ao lado, com a foto de uma criança personificando um palhaço, imagem que já se tornou sua marca registrada em outros grafites, Nilo Zack, de 30, conta que atua como grafiteiro desde 2006 na capital. Formado em cinema de animação e artes digitais pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com especialização em Portugal, o artista nascido no Bairro Taquaril, na Região Leste, tem uma certeza: “o grafite é a arte do século 21 em todo o mundo”.

Hely Costa e Nilo Zack iniciaram ontem o trabalho no Moçambique e vão transformar em mural uma área de 200 metros quadrados(foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)
Hely Costa e Nilo Zack iniciaram ontem o trabalho no Moçambique e vão transformar em mural uma área de 200 metros quadrados (foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)
A segunda intervenção em andamento fica no Bairro Santa Tereza, na Rua Sabinópolis, entre as ruas São Gotardo e Pirite, num coletivo integrado também por Ataíde Miranda, Nilo Zack e Hely Costa e ainda Arthur Ribeiro, Fhero, Nika, Michel Testa, Carol, Tão, Rodrigo Scalabrini, Gud Assis e John Viana. Uma parte do grafite no muro de uma escola, com 50 metros de extensão, assinado por Ataíde Miranda, está pronta e atrai olhares e aplausos.

“Este tipo de arte valoriza o bairro. Moro aqui desde criança e acho que a paisagem urbana fica mais bonita. As cores tomam lugar do concreto e da sujeira do muro”, diz o morador Carlos Alberto Ferreira, de 56, um apaixonado pelo Bairro Santa Tereza.

“Pode pôr aí: meu apelido é Godê de Santa Tereza”, diz ao repórter, com entusiasmo. A obra coletiva completa terá como tema a história e as características culturais do tradicional bairro da Região Leste.

SEM BUROCRACIA A coordenação e idealização do Programa Gentileza são da primeira-dama da cidade, Ana Laender, que atua de forma voluntária. Na primeira etapa, a mulher do prefeito Alexandre Kalil recebeu pessoalmente as propostas de Hely Costa e Ataíde Miranda.

Para ter o projeto aprovado, bastou aos artistas apresentarem um desenho do grafite, que, na sequência, teve avaliação da diretoria de Patrimônio, da Secretaria de Regulação Urbana e da BHTrans. O melhor é a desburocratização”, afirma Hely, lembrando que a produção do grafite deverá durar um mês.

Uma próxima etapa será o lançamento de um edital, já nas áreas da recém-criada Secretaria Municipal de Cultura e da Fundação Municipal de Cultura. O objetivo é estimular a arte urbana em diversos espaços da cidade.

Ana Laender explica o conceito da iniciativa: “Gentileza é a palavra que resume uma série de ações que nossa cidade recebe todos os dias de artistas, voluntários e outras pessoas que, com gestos simples, fazem de Belo Horizonte um lugar mais bonito, mais poético e mais humano para se viver.

Assim, o Programa Gentileza quer identificar, estimular e apoiar ações socioculturais e artísticas que, nas suas mais variadas formas de expressão, socializam, requalificam e ressignificam o espaço urbano, criando uma atmosfera de amor e suavizando o nosso cotidiano com traços, cores, sons e gestos de grande valor humano.”

De acordo com a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), os artistas visuais que fazem o grafite com seu próprio material, sem custos para o poder público, a exemplo dos coletivos de agora, podem fazer contato diretamente no gabinete do chefe do Executivo.

DINÂMICA
No início da tarde de ontem, Hely Costa e Nilo Zack davam início à sua empreitada, que terá a companhia de Ataíde Miranda. “O Ataíde é mais intuitivo, deverá fazer uma grande moldura, espelhando-se na cultura afro”, adianta Hely. Com as escadas encostadas no muro do viaduto, réguas e lápis, eles começaram o primeiro movimento, que é fazer medições e verificar as proporções.

Em seguida, vão dividir os espaços e, finalmente fazer os esboços. A última etapa será a pintura com spray, que, segundo eles, dá cores mais vivas ao grafite e permite maior durabilidade. “Sou muito ligado às questões dos patrimônios imaterial e material, enfim, à cultura. Penso que esses murais devem ser incorporados ao patrimônio da cidade, fazer parte da memória de BH”.

Olhando a parede nua, Nilo diz que tem trabalhos seus em coleções de pessoas conhecidas e diz que 90% dos grafites que fez até hoje não tiveram autorização: “O que desanima é a burocracia”. Nesse momento, um ônibus passa fazendo o barulho característico. “Isso incomoda?” Sem titubear, Nilo revela já ter se acostumado. “Na rua, vê-se de tudo. E, muitas vezes, a gente tem que parar e dar informações.”

Parceiros na arte


Idealizadora do Programa Gentileza, a primeira-dama Ana Laender acredita que a parceria entre a Prefeitura de Belo Horizonte e os artistas visuais é primordial para que mais espaços públicos sejam ocupados com o grafite.

“Ele e o muralismo já começaram a mudar a cena urbana de Belo Horizonte. Intervenções como as que serão feitas no Viaduto Moçambique e no Bairro Santa Tereza são sementes de ótimas ideias culturais, que só tendem a se multiplicar. A ocupação dos espaços traz a beleza da arte, a poesia ilustrada e o incentivo para que os moradores encontrem ali um local agradável de permanência e convivência”.


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