Os policiais militares envolvidos na operação que terminou na morte de um jovem em Ouro Preto, na Região Central de Minas Gerais, vão responder em liberdade. De acordo com a assessoria de imprensa da PM, a corregedoria abriu um inquérito para investigar o que teria ocorrido no dia da morte. O garoto ia para um show de rap com amigos e foi morto depois de militares suspeitarem de "um movimento brusco", quando recebeu a ordem de descer do carro, o que fez com que um dos agentes acreditasse que ele sacaria uma arma de fogo. Nesta segunda-feira, familiares e amigos fazem protestos na cidade.
O caso ocorreu na noite de sexta-feira. Igor Arcanjo Mendes, de 20 anos, estava em um carro junto com amigos e seguia para um show. Ele acabou baleado quando o veículo foi parado em uma operação da PM. “Na hora não vi que foi um tiro. Escutei um estouro e pensei que era uma bomba, foi muito rápido. Mas quando saí do carro, o Igor já estava no chão ensanguentado e sem respirar”, afirma S.C.B, de 17 anos, que estava no automóvel.
Em entrevista ao em.com.br, a jovem contou a versão dada em depoimento à Polícia Civil ainda na sexta-feira. De acordo com S.C.B, o fato ocorreu entre as 21h as 22h, quando militares em uma viatura pediram que o motorista do Fiat Palio em que Igor estava com quatro amigos parasse o carro.
Segundo a jovem, o pedido dos policiais foi atendido, e então começou o conflito. “Nós fomos abordados por um camburão e os policiais, numa tamanha ignorância, já saíram da viatura com as armas em punho e gritando pra gente coisas como 'desce do carro agora', 'mão na cabeça todo mundo'. Nesse momento, as portas do carro travaram e aí o policial apontou a arma para a cabeça do Igor e mandou que ele descesse com as mãos na cabeça”.
De acordo com o relato da jovem, o amigo atendeu ao pedido do policial e abaixou uma das mãos para abrir a porta do carro. “O Igor obedeceu, abriu a porta do carro e levou as mãs à cabeça. Foi nessa hora que escutamos um barulho enorme, como se fosse uma bomba. Quando saímos, e olhei para baixo e vi o Igor com a metade do corpo pra fora do carro, ele estava todo ensanguentado. Eu entrei em desespero e comecei a gritar para minha amiga que o Igor estava morto, pois eu não o vi agonizando ou respirando.”
Após o disparo, S.C.B disse que os policiais mandaram que os amigos guardassem os celulares e não ligassem para ninguém. Pediram também que o grupo deixasse o local, acompanhado por outros policiais. A jovem, no entanto, precisou ser medicada em uma Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) da cidade por causa de estilhaços no pescoço.
“Fomos para a UPA, onde fui atendida sem ter nenhuma notícia do Igor. Voltamos para o local onde ele foi morto e não deixaram a gente sair da viatura, enquanto os policiais fizeram uma rodinha e começaram a conversar bem baixo e olhando para a gente. Nos levaram para o quartel, onde ficamos até as 3h e depois fomos encaminhados para a delegacia, onde um moço sem querer nos contou que ele tinha morrido dizendo: 'Vocês são amigas do menino que morreu né?'. Ficamos arrasados e tivemos de ir com os policiais à casa do Igor para dar a notícia para a mãe dele”.
De acordo com S.C.B, durante a abordagem policial, Igor Mendes não fez nada além do que foi pedido pelos policiais. A jovem também reiterou que ninguém no carro estava usando drogas. “Não tinha droga nenhuma no carro e nem com o Igor. A droga só apareceu depois que ele foi morto. Sempre encontrava com ele e nunca vi ele nem com um cigarro na mão. Trataram a gente como bandido e não somos."
Posicionamento da PM
Em nota, enviada à imprensa no ultimo sábado, a assessoria de comunicação do 52º BPM informou que o Fiat Pálio estava com “lotação superior à permitida, seis ocupantes, e com película escura nos vidros, o que gerou suspeição e acompanhamento da viatura policial.” Ainda conforme a nota, foi dada ordem de parada ao veículo, que não foi obedecida de imediato. O carro só parou, segundo a PM, em um segundo pedido de parada.
“O passageiro que ocupava o banco da frente, no momento da ordem para descer do veiculo, levou as mãos à cabeça e, em seguida, abaixou-se e tirando as mãos da cabeça efetuou movimento brusco com as mãos em direção ao porta-luvas do carro. O comandante da equipe policial, então, verbalizou e efetuou um disparo de arma de fogo na direção do passageiro, pois devido ao movimento brusco do jovem, o mesmo poderia atentar contra a integridade física dele e dos outros policiais militares.”
Ao fim da nota, a polícia informou que dois pinos de cocaína foram encontrados no carro e que uma bucha de maconha foi encontrada no bolso de Igor Mendes, por uma enfermeira da Upa, onde o jovem foi atendido. A Polícia Militar informou que o motorista do carro, de 46 anos, foi detido por prática de transporte irregular dos passageiros que se encontravam no Fiat Palio, que foi apreendido. O caso será investigado pela Corregedoria de Polícia Militar.
A Prefeitura de Ouro Preto divulgou nota sobre o caso e pediu investigação. “A ação policial merece pronta investigação da Corregedoria da Polícia Militar, do Ministério Público e do Poder Judiciário. O Município de Ouro Preto acionará também a Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de Minas Gerais para acompanhar todas as apurações”, disse. A administração municipal ainda ressaltou que o jovem era conhecido como uma pessoa de boa índole , sem passagem pela polícia, trabalhador e vindo de uma família de bons princípios e valores.
Manifestação
Na manhã desta segunda-feira, familiares e amigos, inconformados com a morte de Igor Arcanjo, protestam em ruasqueligam o bairro onde o jovem morava ao Centro de Ouro Preto. Além de cartazes e faixas, o grupo fez uma barricadacom pneus e impediu o trânsito de veículos.