As iniciativas na tentativa de barrar fraudes no uso das cotas de ingresso no ensino público superior com base no perfil étnico não são consenso entre estudiosos e militantes do movimento negro. Professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Marcus Taborna lembra que há duas formas de tentativa de comprovação para acesso a cotas raciais. O primeiro é o modelo adotado no Brasil, que leva em consideração o fenótipo – características externas das pessoas são critérios suficientes para que elas se declarem beneficiárias ou não. O segundo é aquele adotado segundo ele nos Estados Unidos, onde a comprovação é feita por meio de exame de DNA. Assim, afirma, a experiência da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) – que criou uma comissão para verificar as características dos candidatos às vagas reservadas por perfis étnicos – pode ser, no extremo, um argumento a mais, mas, do ponto de vista da conscientização, ele diz preferir o critério da autodeclaração. O educador afirma serem poucas as tentativas de fraude.
O pró-reitor adjunto de Assuntos Estudantis da UFMG, professor Rodrigo Edmilson de Jesus, disse que a universidade vai discutir a Lei de Cotas no ensino médio, em caráter educativo. A ideia é instaurar um debate sobre a declaração e autodeclaração irresponsáveis, exatamente para evitar fraude. Uma sindicância para apurar suspeita de desvios no sistema de cotas também está em andamento e os resultados serão divulgados ainda este ano."O racismo não se mede pela gota de sangue, não no Brasil, e sim por atributos fenotípicos tais como a cor da pele, textura do cabelo, formato do nariz e outros"
Aline Neves Alves, pesquisadora do Programa Ações Afirmativas da UFMG
Sobre a possibilidade de uso de exame sanguíneo, a pesquisadora do Programa Ações Afirmativas da UFMG, militante negra e professora da educação básica da rede municipal de Belo Horizonte, Aline Neves Alves, afirma que “o racismo não se mede pela gota de sangue, não no Brasil, e sim por atributos fenotípicos tais como a cor da pele, textura do cabelo, formato do nariz e outros”. Ela afirma que “é sabido que não se solicita exame de sangue para discriminar alguém ou um grupo e consequentemente menosprezar sua cultura, sua religião e modos de viver. Portanto, não se trata de raça no sentido biológico, mas no sentido sociológico, vivido nas nossas relações raciais imediatas: na mídia, na rua, no trabalho, na educação, no atendimento médico e na abordagem policial”.
Aline avalia que o país está saindo do silêncio, do racismo não dito e não assumido, e criando meios para corrigir o problema. “E, ao mexer nos privilégios de grupos hegemônicos, vem à tona todo o ranço do racismo que se finge não existir. Não se desconstrói algo tão grande sem conflitos, isso é inerente ao processo democrático. Logo, a política de cotas está sendo aperfeiçoada para garantir a entrada de quem mais sofre com os prejuízos do racismo, indiferentemente da classe social a que aquele indivíduo pertença.”