A aguardada temporada das águas em Belo Horizonte começou trazendo transtornos à população no momento dos temporais e deixando para trás armadilhas urbanas e medo, mesmo após o fim da chuva. Com tempestades acompanhadas de ventanias de até 85km/h, o fantasma da queda de árvores voltou com força total à capital, onde ontem a população passou o dia enfrentando ruas fechadas, desvios de trânsito e preocupação com troncos que ainda ameaçam vir abaixo. O temor diante da possibilidade de tragédias como a que matou o taxista Fábio Teixeira Magestes, de 35 anos, cujo carro foi atingido por uma palmeira de tronco triplo no Bairro de Lourdes (Centro-Sul), na segunda-feira, faz sentido. Em apenas 24 horas, até a manhã de ontem, o Corpo de Bombeiros recebeu 103 chamados relacionados a corte e vistoria em árvores na Região Metropolitana de BH. Pelo menos 50 delas caíram. Na capital, 25% dos atendimentos feitos pela Defesa Civil entre domingo e ontem foram relacionados ao risco de queda e à queda de árvores (19 de 78). Enquanto a preocupação com a ameaça aumenta, os recursos municipais para ações preventivas na arborização urbana diminuem.
As restrições financeiras criaram, inclusive, uma lista de espera nos serviços. Segundo o órgão, está sendo dada prioridade a podas e supressões de árvores condenadas ou que possam representar riscos de danos humanos ou materiais. “As demais solicitações entram em fila de espera para execução em momento oportuno”, informa a nota.
"Não é possível esperar morrer mais gente. Alguma coisa tem que ser feita"
Leonardo Maciel, 43 anos, advogado
À sombra de novos riscos
Com novo alerta de temporal válido pelo menos até hoje, a situação é sinônimo de preocupação para quem vê troncos pendendo sobre vias e imóveis, sem que qualquer providência seja tomada. É o que ocorre na Rua Alagoas, Bairro Funcionários, Região Centro-Sul de BH. A advogada Cristiana Valente Carvalhido, de 36 anos, está muito apreensiva, pois, segundo ela, desde maio de 2016 o síndico do prédio em que mora vem tentando junto à prefeitura alguma intervenção em uma árvore que apresenta sinais de estar podre. “Em abril deste ano, um galho grande caiu desta árvore, sem chuva nem vento. Imagine agora o que pode acontecer?”, questiona. O incidente a que ela se refere motivou na época a intervenção dos bombeiros, que tiveram de agir para desobstruir a via. Como a árvore fica entre o prédio e uma casa onde vivem idosos, Cristiana diz que o perigo é ainda maior.
O risco alto de queda de outra árvore motivou a Coordenadoria Municipal de Defesa Civil (Comdec) a interditar o trânsito na Rua Juiz de Fora, entre as ruas Goitacazes e Tupis, no mesmo bairro. Segundo o coronel Alexandre Lucas, coordenador da Comdec, a medida foi tomada porque os técnicos detectaram grande possibilidade de acidente no local. “Isolamos o local e acionamos a regional para supressão da árvore. Como temos muitos problemas na cidade, a prefeitura está dando prioridade àquelas com impacto social mais forte. Até porque o corte de uma árvore desse tipo tem isolamento de rua, não pode ser feito em qualquer hora, tem toda uma gestão”, afirma o coronel.
De acordo com a Regional Centro-Sul da Prefeitura de BH, já foi autorizada poda para a árvore na Rua Alagoas, em frente ao número 315. Já sobre o espécime da Avenida Augusto de Lima, em frente ao número 1.854, não foi identificada solicitação no sistema do município. Entretanto, a administração informou que será feita vistoria no local. Na Rua Juiz de Fora, entre Goitacazes e Tupis, a árvore não corre risco iminente, mas será feita poda para diminuir o peso e mantido monitoramento.
"Em situações de vento forte, o ideal é se abrigar dentro de uma loja ou um shopping, por exemplo, para não correr o risco de ser atingido"
Coronel Alexandre Lucas, coordenador da Defesa Civil de BH
Praga ameaça 1,4 mil árvores
Além da diminuição do trabalho de corte e poda na arborização urbana e do perigo dos vendavais, as árvores de Belo Horizonte sofrem com outro problema: o besouro metálico. A praga ameaça cerca de 1,4 mil mungubas e paineiras, situação que liga o alerta para essas espécies, cujos exemplares podem ser suprimidos a qualquer momento, caso seja constatado risco de queda, segundo a prefeitura. Desde o início do ano, a prefeitura já retirou 600 árvores infestadas. Mas a preocupação se torna maior já que, no caso mais grave de segunda-feira, quando três troncos de palmeira unidos por uma única raiz provocaram a morte do taxista Fábio Magestes, a árvore era considerada sadia.
Segundo o tenente Pedro Aihara, chefe da Sala de Imprensa do Corpo de Bombeiros, no período chuvoso a corporação encontra dificuldades de atender todas as ocorrências ao mesmo tempo, diante do volume de casos. A corporação faz o corte de árvores apenas se existe o risco iminente de queda ou se o exemplar já caiu e está obstruindo a via. Do contrário, a situação é encaminhada à prefeitura, que tem autonomia para providenciar um laudo que autorize a supressão.
Inventário ficou pela metade
Um inventário da arborização de Belo Horizonte conduzido pela Universidade Federal de Lavras (Ufla) levantou 300 mil exemplares nas regiões Leste Noroeste, Oeste, Centro-Sul e em parte da Pampulha. Novo contrato precisa ser firmado pela administração municipal para fazer o levantamento de cerca de 180 mil árvores nas regiões Norte, Nordeste, Venda Nova, Barreiro e em outra parte da Pampulha.