Conceição do Mato Dentro – Impossível não sentir uma paz quase absoluta no distrito de Córregos, localizado a 24 quilômetros da sede municipal, sendo uma parte percorrida em estrada de terra. Pode ser pelo caminho que parece atravessar o tempo, pela paisagem bucólica e silenciosa, com uma rua antiga e principal, e pela atmosfera colonial, cujas raízes fincadas no início do século 18 estão presentes nas igrejas, casas e topografia. No entanto, quem chega à comunidade de cerca de 300 pessoas se surpreende com uma história de séculos e única nas Gerais: o nome da padroeira local é o mesmo da protetora dos brasileiros, Nossa Senhora Aparecida, mas há uma diferença que os moradores se apressam em frisar bem. “A daqui é Nossa Senhora Aparecida de Córregos”, esclarece a oficial interina do cartório de registro de imóveis, Maria Odete de Almeida, professora aposentada e zeladora da igreja matriz.
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Fé em Nossa Senhora Aparecida é celebrada por famílias que mudaram suas vidasIgreja celebra três séculos do encontro da imagem de Nossa SenhoraCerca de 200 mil pessoas celebram Nossa Senhora em AparecidaA cabeça do visitante pode dar um nó, mas o melhor é seguir em frente a fim de entender bem essa particularidade do distrito, que, no próximo domingo, faz a festa para sua padroeira. As novenas começaram na sexta-feira passada e o entusiasmo está nas alturas, pois haverá missa, procissão, descendimento da bandeira e os ritos típicos das celebrações religiosas. “Este ano, rezar o terço à noite e soltar foguete ao meio-dia para celebrar a padroeira do Brasil, já que são 300 anos de encontro da imagem nas águas do Paraíba do Sul (SP)”, conta Maria Odete.
Conforme a tradição oral, em 1722, “apareceu” no cemitério, onde depois foi erguida a matriz, uma imagem de Nossa Senhora que hoje “mora” no altar-mor, conforme diz Maria Odete bem à mineira e, a exemplo de outros devotos, mostrando completa intimidade com a santa. A peça teria sido deixada por um bandeirante em busca de ouro, que bateu em retirada, seguindo o Rio Santo Antônio, sem conseguir grandes riquezas. “São necessárias pesquisas para conhecermos melhor essa história”, diz o vigário paroquial, padre Walter Guedes, da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição, de Conceição do Mato Dentro, certo de que há poucos estudos sobre o assunto.
FERVOROSOS
A Igreja de Nossa Senhora Aparecida de Córregos data de 1722 e os números estão pintados na fachada da construção, ao lado de outros referentes a obras. Caminhando dentro da matriz, Maria Odete mostra a escultura da padroeira no altar, na verdade uma semelhante à de Nossa Senhora do Rosário, sem o rosário na mão. “Estamos esperando a obra de restauração do templo. Já foram feitas as prospecções e acreditamos que agora vai sair”, diz com esperança e apontando para o sacrário com elementos artísticos dourados e prateados. Criada com freiras franciscanas e professora aposentada de ciências biológicas e matemática, Maria Odete destaca que a Nossa Senhora Aparecida de Córregos é branca, outra surpresa, já que a padroeira dos brasileiros tem a pele negra.
Curiosamente, vê-se que os paroquianos não se preocupam especificamente com a iconografia da padroeira. Para eles, é Nossa Senhora Aparecida e pronto. “Quando rezo, peço a Nossa Senhora Aparecida de Córregos.
Nascida e criada em Córregos, onde batizou a filha e netos na Matriz de Nossa Senhora Aparecida, a dona de casa Maria do Amparo Teixeira Duque também tem muita fé na padroeira. “É isso que vale. Ai de nós se não fossem elas. A gente pede e todas atendem na hora”, confessa Maria do Amparo, casada com Antônio Ferreira Duque.
Na tarde ensolarada diante da matriz, um grupo se reúne para fortalecer a amizade e mostrar o fervor pelas padroeiras. Lado a lado, a pedido do Estado de Minas, eles colocam sobre o muro de pedras do adro a bandeira de Nossa Senhora Aparecida de Córregos e a imagem de Nossa Senhora padroeira do Brasil. Ao se aproximar, Antônio Geraldo Pereira e Osvaldino Barroso tiram o chapéu em sinal de respeito. “Gosto das duas”, diz Noeme Alveis Reis, enquanto Antonio assegura sua fé em ambas.
Depois da foto, a despedida, e aquela clima bem mineiro de convidar para tomar um café em casa. O sol ainda está alto e banha de luz a Rua Cônego Madureira, a mais antiga do distrito e batizada em homenagem ao primeiro vigário de Córregos. Um homem, sentado no passeio, mostra a camisa com o desenho de Nossa Aparecida – mas avisa que é Nossa Senhora protetora de todos os brasileiros..