A reparação dos danos sociais e ambientais provocados pelo rompimento da Barragem do Fundão e a celeridade na votação dos novos marcos da mineração e das barragens uniram ontem, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), parlamentares, Ministério Público e representantes dos atingidos em audiência pública que marcou os dois anos do desastre.
Do encontro saíram requerimentos para que projetos de lei que tornam a atividade mineradora mais controlada ganhem regime de urgência em sua tramitação. São eles: o PL 3.312/2016, que institui a política estadual dos atingidos por barragens; o PL 3.676/2016, que dispõe sobre o licenciamento ambiental e a fiscalização de barragens no estado; e o PL 3.277, que altera a Lei 19.976/2011, instituindo a taxa de controle, monitoramento e fiscalização das atividades minerárias e de barragens.
Nem representantes da Fundação Renova – criada para gerenciar a reparação dos danos do desastre –, nem da Samarco, empresa responsável pela barragem rompida, nem das controladoras da mineradora, Vale e a BHP Biliton, participaram da audiência. O governo do estado também não enviou representantes.
O promotor de Justiça coordenador de Inclusão e Mobilização Sociais – Cimos, André Sperling Prado, desenhou uma situação de desequilíbrio nas negociações e reparos. “Hoje, já dois anos após perderem casas, referências, empregos, os atingidos negociam com a Renova sem advogado e engenheiro e numa situação de que se não aceitarem, que entrem na Justiça. A pessoa, desesperada, aceita perder seus direitos”, afirma. Ele destacou que o trabalho da câmara técnica social, que atua na formação de um novo cadastro de danos e indenizações, trará mais igualdade ao processo, garantindo “um mínimo de paridade”.
O representante do Movimento dos Atingidos por Barragens, Guilherme de Souza, ressalta que não houve punição nem indenização: “Nesses dois anos, nem um tijolo foi erguido”.
DESGASTE
Para a atingida de Pedras, distrito de Mariana, Marlene Agostino Martins dos Reis, de 45 anos, a perda da identidade e as estratégias de desgaste dos atingidos são a parte mais cruel desse desastre, atualmente. “Minha família perdeu a fazenda que era do meu bisavô. Agora, minha mãe não quer mais voltar para lá, mas meu irmão não quer viver se não for da roça, de jeito nenhum. É assim que a Fundação Renova faz: joga uns contra os outros”, reclama Marlene.
A lavradora Maria José Horta Carneiro Silva, de 30, perdeu o emprego, a casa e a renda, quando a fazenda onde trabalhava e vivia foi demolida pela lama, em Ponte do Gama, em Mariana. “Agora, minha família que vivia junta, da hora que acordava à que ia dormir, só vive separada”, disse.
PRAZOS
A Fundação Renova, por meio de nota, disse que está aberta a atender a qualquer solicitação dos deputados para esclarecimentos. E afirmou que o prazo para entrega das casas, em 2019, será cumprido. No caso de Bento Rodrigues, disse, a previsão é de início das obras no primeiro trimestre de 2018. Já em relação a Paracatu de Baixo, oito dos nove terrenos necessários foram adquiridos. Em Gesteira, as negociações estão em andamento com o proprietário do terreno escolhido pelos atingidos.
Rio Doce na Justiça
A ONG Associação Pachamama se inspirou em decisões judiciais do Equador e da Colômbia, onde os rios e a natureza são reconhecidos como sujeitos de direito, para entrar com uma ação judicial em defesa dos direitos do Rio Doce. A ação foi ajuizada contra o governo federal e o governo de Minas Gerais, que são obrigados a fazer um Plano de Prevenção a Desastres para proteger toda a população da Bacia do Rio Doce. Para a organização, essa ação inaugura uma nova visão de direito no Brasil: os direitos da natureza. “Chegou a hora de o Rio e de os seres que dele dependem serem tratados com o mesmo respeito”, considera o advogado Lafayette Garcia Novaes Sobrinho, que move a ação na Justiça.