Congonhas e Ouro Preto – A lembrança dos vizinhos que se foram deixa o pequeno povoado do Mota, em Ouro Preto, um pouco mais solitário para seus cerca de 500 moradores e os vizinhos do Bairro Pires, em Congonhas. Famílias que moravam nas partes baixas das comunidades foram removidas pela Nacional Mineração (Namisa) após água e rejeitos terem vazado da Barragem Auxiliar de Vigia, em 2008, deixando um rastro de prejuízos e medo. Nascida na comunidade do Mota, a dona de casa Nilza Maria de Jesus, de 57 anos, diz que o que a preocupa mais é quem ficou e não quem saiu, referindo-se ao medo que todos têm do complexo de barragens que não só permaneceu operando como foi ampliado e está a apenas 350 metros de distância. “Antigamente, se tivesse um rompimento a gente não era atingido. Agora, que aumentaram (as barragens), as nossas casas e as nossas famílias podem ser soterradas em caso de um rompimento.”
A área de influência dos barramentos chega até Congonhas e por isso vai integrar os planos da prefeitura municipal de auxiliar no treinamento e na definição de estratégias de evacuação para comunidades sob a ameaça direta de barragens. A primeira a ter esse tipo de ação é também a que mais preocupação traz a Congonhas. Trata-se da Barragem Casa de Pedra, onde desde o ano passado a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) – que absorveu a Namisa – luta para reforçar os diques afetados por infiltrações.
A apreensão com a estabilidade da Barragem Casa de Pedra é tão grande que o governo do estado formou um grupo de ação emergencial sigiloso, integrado pela Coordenadoria Estadual de Defesa Civil (Cedec), o Corpo de Bombeiros e a Polícia Militar. A principal função desse grupo é, independentemente das ações da mineradora, traçar estratégias para a evacuação de cerca de 4.800 pessoas que podem ser atingidas direta ou indiretamente caso o barramento de 80 metros de altura se rompa, liberando parte dos 9,2 milhões de metros cúbicos (m³) de rejeitos de minério de ferro que armazena.
A CSN informa que o Dique de Sela, que é a parte mais vulnerável do barramento, já atingiu índice de segurança acima do exigido, chegando a 1,6 e a 1,7, quando o limite seria de 1,5. A empresa também informa que vai realizar exercícios de evacuação ao lado da Prefeitura de Congonhas, no próximo dia 26. Duas, das cinco sirenes que a CSN se comprometeu a instalar e que poderão alertar a população em caso de colapso da estrutura, começaram a ser montadas, mas ainda não estão operacionais, conforme apurou o Estado de Minas.
O secretário municipal de Meio Ambiente de Congonhas, Neilor Aarão, disse que o plano de evacuação feito para a Barragem Casa de Pedra será um projeto-piloto, após o qual outras comunidades suscetíveis a rompimentos de barragens também receberão planejamentos de emergência. “(O treinamento) precisa ser feito. Nenhuma cidade tem a cultura de prevenção. Não é porque vamos trabalhar com prevenção que (a barragem) está rompendo. Se romper, nem adianta treinamento. É uma ação preventiva. Fora do Brasil, treina-se para qualquer eventualidade, como deslizamentos, enchentes e incêndios”, afirma.
De acordo com o secretário, foram requisitados à Superintendência Central de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Supram) e às mineradoras que estão na área de influência de Congonhas todos os mapas de inundação e de efeitos em caso de problemas com barragens. “Várias (barragens) nos preocupam, não apenas a Casa de Pedra. Ela é a mais grave por estar muito próxima à área urbana. Também estamos preocupados com barramentos da Vale, da Ferros, da CSN, da Gerdau”, cita.
Duas dessas barragens próximas a comunidades são justamente Vigia e Auxiliar de Vigia, que se erguem a quase 50 metros de altura e a 350 metros das primeiras propriedades rurais no limite de Ouro Preto com Congonhas. Do alto da represa se enxerga nitidamente que o desnível do terreno traça um caminho direto para essas habitações em caso de rompimento. As duas estruturas estão atualmente com suas estabilidades garantidas por auditorias contratadas – assim como Casa de Pedra e Fundão (em Mariana) também estavam.
O rompimento total de Vigia representaria metade da Casa de Pedra. O dano seguiria pelo Vale do Rio Preto, encaixando na calha do Rio Maranhão, com risco de inundar e isolar os bairros ribeirinhos, atingir o centro baixo de Congonhas, podendo, inclusive, chegar ao Rio Paraopeba, em Jeceaba, com propensão de necessidade de ampliação das formas de captação de água, conforme avaliação de ambientalistas e bombeiros.
MEMÓRIA
Acidentes com barragens
2001
São Sebastião das Águas Claras, no distrito de Nova Lima
» Barragem da Mineração Rio Verde se rompe matando cinco operários. O Córrego Taquaras foi atingido e assoreado bem como acessos, mata e residências da comunidade
2003
Cataguases, na Zona da Mata
» Barragem da Cataguases de Papel Ltda se rompe, despejando no Rio Pomba cerca de 1,4 bilhão de litros de lixívia (licor negro), um subproduto da produção de celulose. Ao todo, 600 mil pessoas ficaram sem água em três estados
2007
Miraí, na Zona da Mata
» Barragem da Mineradora Rio Pomba Cataguases se rompe, atingindo bairros de Miraí e Muriaé. Cerca de 4 mil pessoas foram desalojadas
2008
Ouro Preto e Congonhas, na Região Central
» Barragem Auxiliar de Vigia tem rompimento e atinge cerca de 40 residências de Ouro Preto e Congonhas
2014
Itabirito, Região Central
» Barragem da Herculano Mineração se rompe e mata quatro operários que faziam manutenção numa barragem desativada
2015
Mariana, Região Central
» Barragem do Fundão, operada pela Samarco, se rompe matando 19 pessoas e despejando quase 40 milhões de m³ de rejeitos na Bacia Hidrográfica do Rio Doce e no mar, sendo considerado o maior desastre socioambiental do Brasil