Jornal Estado de Minas

BH 120

Na Praça da Assembleia, quem busca lazer convive com sujeira e falta de manutenção

Vizinho da Carlos Chagas, Luciano brinca com Laura, mas reclama da falta de manutenção - Foto: Paulo Filgueiras/EM/DA Press

Sábado de sol, 11h. O menino passa acelerado no seu velotrol e imita o barulho do motor de um carro, tremendo os lábios. Circula uma, duas vezes, até voltar ao aconchego da mãe, que abre os braços para ganhar um beijo carinhoso. A poucos metros dali, o senhor de cabelos grisalhos levanta uma criança no ar, canta música animada e convida o neto para ir ao parquinho de brinquedos. “Eba!”, ele grita de contentamento. Nenhum desses sons, no entanto, desperta do sono o morador em situação de rua que faz “meia-noite”, como se diz popularmente, deitado sobre o colchão à sombra do coreto, equipamento charmoso da Praça Carlos Chagas, mais conhecida como Praça da Assembleia, por ficar ao lado da sede do Legislativo estadual (ALMG), no Bairro Santo Agostinho, na Região Centro-Sul da capital.

Segunda maior praça de BH, conforme a Belotur – a primeira é a Praça do Papa, no Mangabeiras, na mesma região, a Carlos Chagas tem 33,7 mil metros quadrados e é das mais frequentadas, ressalta o presidente da Associação dos Moradores e Amigos do Bairro Santo Agostinho (Amagost), o médico Rodrigo Laender. Ele explica que o espaço público foi reentregue à comunidade há dois anos e meio, depois de obras que demandaram consulta popular.
Entre os destaques da área, estão os jardins de Burle Marx (1909-1994), tombados pelo patrimônio histórico, escultura em aço de Amilcar de Castro (1920-2002) com o símbolo da ALMG e, no centro, a Igreja de Nossa Senhora de Fátima. Para celebrar os 120 anos de Belo Horizonte – o aniversário é no dia 12 –, o Estado de Minas vai mostrar várias praças de BH, pontos de lazer, descanso e convívio da população.

“O maior problema é a falta de manutenção. Recentemente, a associação gastou R$ 22 mil na reforma dos brinquedos do parquinho, mas não temos recursos para fazer tudo. Os equipamentos de ginástica, por exemplo, já estão estragados e os banheiros nunca foram abertos. Quem precisa usá-los ou volta para casa ou, durante a semana, usa os da Assembleia”, diz Laender. Num contato direto com a Regional Centro-Sul, houve melhoramentos, reconhece o presidente, principalmente em relação à limpeza urbana e atuação dos ambulantes.

Uma das esperanças dos associados é que o espaço seja adotado, dentro do programa da PBH, pela ALMG, e há pedidos nesse sentido. “A praça precisa, na verdade, de um gerente”, resume. “Houve avanços na iluminação, mas precisa melhorar”, acrescenta.

ROUPAS NO MURO No lado da Avenida Barbacena, uma mulher lava roupas e vai pendurando as peças, tranquilamente, na mureta, como se fosse o quintal de sua casa. Um rapaz se exercita no aparelho de ginástica, finge que não vê nada e desconversa: “Não conheço esse pessoal, não”. No lado da Rua Rodrigues Caldas, perto do parque de brinquedos, mendigos se sentem em casa, e alguns se incomodam, quando o fotógrafo chega perto. E tem mais: brinquedos quebrados, ambulantes ocupando grandes espaços e falta de segurança à noite, quanto muita gente sai do trabalho e faz caminhada ou corrida.

Localizada numa das regiões mais nobres da cidade, ao lado da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), daí o apelido, a Praça Carlos Chagas se enche de famílias diariamente, ganhando mais movimento nos fins de semana.
É o lugar preferido do economista João Paulo Campos, morador da Avenida Barbacena, para curtir as filhas Carolina, de 3 anos, e Luísa, de 2, com a mulher Natacha. No passeio, a família não deixa de levar a cadelinha de estimação. “É ótimo ficar aqui, mas está havendo depredação”, lamenta João Paulo, mostrando pichações no coreto, que está bem no seu campo de visão.

“É uma situação difícil. A fiscalização (da Prefeitura de Belo Horizonte) vem, mas os problemas voltam. No caso do coreto, os moradores de rua costumam deixar restos de comida, acendem fogo. As lixeiras ficam cheias demais e transbordam, pois não comportam tantos resíduos”, diz o economista, que não deixa de ir à praça. “As meninas gostam demais, fizeram amigos. Outro dia, vieram a um aniversário de um desses novos coleguinhas, comemoraram aqui. Isso é bacana”, afirma o pai, certo de que manutenção permanente é essencial para garantir o lazer da população.


Brincando com a filha Laura, de 3, no escorregador, o administrador de empresas Felipe Campos, morador próximo da praça, diz que o quadro piora à noite, e obriga o cidadão a acender o sinal amarelo de atenção. “Aqui é bom, mas poderia ser melhor. Tem que ficar de olho para a criança não se machucar.” Morador do Bairro Buritis, na Região Oeste, o engenheiro Luciano Nunes Oliveira Alves conheceu a praça, na semana passada, mas se decepcionou ao tentar brincar com a filha Luana, de um ano e meio, no balanço. “Pena que está quebrado”, disse Luciano, na expectativa de outra gangorra vagar. “Trata-se um espaço bacana para trazer a família, mas é preciso conservar”, avaliou Luciano.

O engenheiro Luciano Ferreira, morador do bairro, também reclamou da manutenção. “Deixa muito a desejar. Trouxe muita sobrinha Loara, de 3, para brincar no parquinho, mas fico receoso. Outro dia, ela queria ir no cavalinho e estava quebrado”, disse Luciano, que gosta de correr à noite, mas fica vigilante.

FISCAIS Enquanto as famílias apontavam os pontos de deterioração do espaço público, um dos mais queridos da cidade, um grupo de agentes de campo da PBH circulava pela Praça Carlos Chagas.
Segundo técnicos da Regional Centro-Sul, os brinquedos da Praça Carlos Chagas sofrem depredações constantemente. Em nota, informam que, “em 22 de setembro, todos os brinquedos do local foram reformados em parceria com a Amagost e, infelizmente, sofreram com ação de depredadores. Uma equipe deverá vistoriar o local e tomar as medidas para a recuperação dos mesmos”. A gerência esclarece ainda que há “um enorme interesse da PBH em encontrar adotantes via programa Adote o Verde, porém ainda não encontrou parceiros para a manutenção”.

Apesar dos problemas, local é o preferido de João Paulo e as filhas, Carolina e Luísa - Foto: Paulo Filgueiras/EM/DA PressSobre os moradores em situação de rua, a secretária de Política Urbana, Maria Caldas, explica que a população em situação de rua triplicou: “Hoje, são 6 mil pessoas, enquanto a estrutura para acolhimento é a mesma de 20 anos atrás”. Assim, a PBH, por meio de vários setores, está fazendo uma grande ação para ampliação de vagas. No caso da praça, conta que foram feitas abordagens, apreendimentos materiais e um abrigo improvisado. Na quarta-feira, houve nova ação, mas, devido à chuva forte, uma barraca ficou no local. A secretária adianta que estão previstas novas abordagens na Carlos Chagas.

Sobre a segurança noturna, a Guarda Municipal informa que mantém nove viaturas para fazer atuar na Região Centro-Sul, com uma exclusiva para o conjunto de praças durante a noite e madrugada. Além disso, há fiscalização por meio das câmeras do Centro de Operações da Prefeitura (COP).

Memória


Em 18 de junho de 2011, o Estado de Minas noticiava que quase 4 mil pessoas já haviam dados sugestões para a requalificação da Praça Carlos Chagas, no Bairro Santo Agostinho, na Região Centro-Sul de BH. A intervenção foi feita com recursos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Entre os pontos mais apontados para intervenção e exigindo atenção das autoridades estavam segurança, iluminação pública e outros. Três anos depois, uma equipe da empresa de engenharia responsável pelo serviço deu a largada com supervisão da Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap). A ideia era que ela ficasse pronta para a Copa do Mundo 2014, mas o cronograma não foi cumprido. O projeto de requalificação contemplou a criação de um novo playground e um espaço para lazer e sociabilidade de idosos, além de outros melhoramentos.

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