Quem observa a abrangência da mancha da área urbana de Belo Horizonte pelo relevo montanhoso não imagina que nas poucas áreas verdes da capital mineira existam 26 cavernas catalogadas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Mas, mais impressionante do que isso foi a confirmação, feita há menos de 15 dias, de que uma dessas cavidades não foi esculpida pelo regime das águas, mas sim pelas garras de um animal pré-histórico. A formação, caracterizada como uma paleotoca por um grupo de espeleólogos, biólogos e estudiosos da paleontologia, faz parte de uma das oito cavidades existentes no Parque Municipal das Mangabeiras, na Região Centro-Sul de BH. A descoberta da até agora única paleotoca belo-horizontina, que nem sequer foi ainda descrita oficialmente, pode despertar mais interesse de pesquisadores e ações de conservação para a unidade.
O trabalho de confirmação de que a estrutura foi de fato escavada por um ser vivo integrante da chamada megafauna extinta foi acompanhado pela equipe do Estado de Minas. O material resultante da expedição será avaliado por estudiosos da área durante o 3º Simpósio Mineiro de Carste (relevo geológico caracterizado pela corrosão das rochas), que ocorre hoje e amanhã na Universidade Federal de Minas Gerais.
Foi o espeleólogo e professor de química Luciano Faria, do Centro Universitário Newton Paiva, que desconfiou das características incomuns dessa cavidade de seis metros de profundidade e cerca de um metro e meio de altura, desde que fez sua descrição, há 10 anos. “Sempre tive uma pulga atrás da orelha com essa caverna. Isso porque normalmente formações do Quadrilátero Ferrífero, como essa, de minério de ferro (canga), têm uma configuração muito similar: a pessoa entra e sobe por elas, ou seja, há uma inclinação positiva. Mas essa é uma caverna horizontal”, distingue.
A disposição dos salões internos também é incomum, e ajudou a levantar ainda mais suspeitas sobre sua origem. “A cavidade tem espécies de câmaras, que sugerem o trabalho de um animal. O bicho fez um buraco, puxou a terra (para fora do túnel), cavou mais, puxou a terra, e assim avançou. Aparentemente, essa era uma caverna que foi ampliada pelo animal ou simplesmente uma paleotoca criada por esses animais extintos”, observa.
Mas a confirmação de que a cavidade no Parque das Mangabeiras é mesmo o abrigo de um animal extinto ocorreu somente após a apreciação do biólogo Luciano Vilaboim, do Museu de Ciências Naturais da PUC Minas. “As marcas encontradas nesta caverna são nítidas. Um animal veio aqui e fez um buraco. O teto é arredondado, e a gente consegue ver as marcas deixadas pelas garras do animal. Ele foi escavando com a pata erguida bem alto. O que nos dá essa certeza é que sempre as marcas de garras vêm em pares, demonstrando um padrão de escavação que difere do que se encontra numa formação natural”, disse Vilaboim.
De acordo com o especialista do Museu da PUC Minas, dois animais são os mais prováveis responsáveis pela escavação da paleotoca, uma estrutura que se estima ter sido abandonada entre 8 mil e 10 mil anos atrás. “Temos os xenartros extintos, como parentes das preguiças atuais, mas de tamanho muito maior, e também a linhagem dos pampatérios, que eram tatus gigantes”, afirma.
Paleotocas são tocas escavadas por animais hoje extintos, que viviam em parte em abrigos subterrâneos, assim como hoje ocorre com tatus, corujas buraqueiras e outras espécies. A pesquisa desse tipo de estrutura se insere na paleontologia, por se ocupar de vestígios de épocas geológicas passadas. São consideradas “iconofósseis”, como são conhecidos os sinais de atividades de seres vivos no passado, categoria em que se encaixam pegadas, fezes fossilizadas (coprólitos) e outros sinais.
Tatus gigantes que habitavam quase toda a extensão da América do Sul. Alguns podiam ter o porte de porcos adultos, enquanto outros chegavam a ser mais altos do que homens e do tamanho de carros populares. Tinham garras fortes, porém não muito compridas.
Parentes pré-históricos das preguiças modernas. Ao contrário das primas que vivem em árvores a maior parte de seu ciclo, esses animais vagavam pelas matas e podiam ter entre dois e seis metros de altura. Tinham membros poderosos e garras compridas, que podiam escavar o solo e descascar árvores. Há 88 gêneros conhecidos.
O trabalho de confirmação de que a estrutura foi de fato escavada por um ser vivo integrante da chamada megafauna extinta foi acompanhado pela equipe do Estado de Minas. O material resultante da expedição será avaliado por estudiosos da área durante o 3º Simpósio Mineiro de Carste (relevo geológico caracterizado pela corrosão das rochas), que ocorre hoje e amanhã na Universidade Federal de Minas Gerais.
"Ele foi escavando com a pata erguida bem alto. O que nos dá essa certeza é que sempre as marcas de garras vêm em pares, demonstrando um padrão de escavação que difere do que se encontra numa formação natural"
Luciano Vilaboim, biólogo do Museu de Ciências Naturais da PUC Minas
Foi o espeleólogo e professor de química Luciano Faria, do Centro Universitário Newton Paiva, que desconfiou das características incomuns dessa cavidade de seis metros de profundidade e cerca de um metro e meio de altura, desde que fez sua descrição, há 10 anos. “Sempre tive uma pulga atrás da orelha com essa caverna. Isso porque normalmente formações do Quadrilátero Ferrífero, como essa, de minério de ferro (canga), têm uma configuração muito similar: a pessoa entra e sobe por elas, ou seja, há uma inclinação positiva. Mas essa é uma caverna horizontal”, distingue.
A disposição dos salões internos também é incomum, e ajudou a levantar ainda mais suspeitas sobre sua origem. “A cavidade tem espécies de câmaras, que sugerem o trabalho de um animal. O bicho fez um buraco, puxou a terra (para fora do túnel), cavou mais, puxou a terra, e assim avançou. Aparentemente, essa era uma caverna que foi ampliada pelo animal ou simplesmente uma paleotoca criada por esses animais extintos”, observa.
Mas a confirmação de que a cavidade no Parque das Mangabeiras é mesmo o abrigo de um animal extinto ocorreu somente após a apreciação do biólogo Luciano Vilaboim, do Museu de Ciências Naturais da PUC Minas. “As marcas encontradas nesta caverna são nítidas. Um animal veio aqui e fez um buraco. O teto é arredondado, e a gente consegue ver as marcas deixadas pelas garras do animal. Ele foi escavando com a pata erguida bem alto. O que nos dá essa certeza é que sempre as marcas de garras vêm em pares, demonstrando um padrão de escavação que difere do que se encontra numa formação natural”, disse Vilaboim.
De acordo com o especialista do Museu da PUC Minas, dois animais são os mais prováveis responsáveis pela escavação da paleotoca, uma estrutura que se estima ter sido abandonada entre 8 mil e 10 mil anos atrás. “Temos os xenartros extintos, como parentes das preguiças atuais, mas de tamanho muito maior, e também a linhagem dos pampatérios, que eram tatus gigantes”, afirma.
Marcas da vida
Paleotocas são tocas escavadas por animais hoje extintos, que viviam em parte em abrigos subterrâneos, assim como hoje ocorre com tatus, corujas buraqueiras e outras espécies. A pesquisa desse tipo de estrutura se insere na paleontologia, por se ocupar de vestígios de épocas geológicas passadas. São consideradas “iconofósseis”, como são conhecidos os sinais de atividades de seres vivos no passado, categoria em que se encaixam pegadas, fezes fossilizadas (coprólitos) e outros sinais.
A megafauna de BH
Animais que podem ter escavado tocas na capital mineira
» Pampatérios
Tatus gigantes que habitavam quase toda a extensão da América do Sul. Alguns podiam ter o porte de porcos adultos, enquanto outros chegavam a ser mais altos do que homens e do tamanho de carros populares. Tinham garras fortes, porém não muito compridas.
» Preguiças-gigantes
Parentes pré-históricos das preguiças modernas. Ao contrário das primas que vivem em árvores a maior parte de seu ciclo, esses animais vagavam pelas matas e podiam ter entre dois e seis metros de altura. Tinham membros poderosos e garras compridas, que podiam escavar o solo e descascar árvores. Há 88 gêneros conhecidos.