Luxuosamente vestida para as festas de fim de ano, a Praça da Liberdade partilha com toda a população de Belo Horizonte neste fim/início de ano um robusto banquete de cultura, que vai muito além das centenas de milhares de microlâmpadas que a iluminam. Quem aceitar o convite e se sentar à mesa encontrará cardápio variado, recheado por diversas atividades. A começar pelo Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) – um dos 15 equipamentos que compõem o Circuito Liberdade –, onde há atrações tanto dentro quanto fora do prédio
Até 5 de janeiro, a fachada exibe uma projeção com luz, som e efeitos tridimensionais. Já quem entrar pode sair com um presente para lá de criativo e original. Deixando para trás qualquer referência ao Papai Noel, à neve, aos duendes, e, sobretudo, ao Polo Norte, as prendas em questão são inspiradas no continente africano. É que o Setor Educativo do CCBB se preparou para uma atividade inspirada na exposição Ex Africa, maior mostra de cultura africana já realizada no Brasil, em cartaz até 30 de janeiro. Baseada nos costumes e tradições da África do Sul, a oficina convida cada visitante a levar para casa um presente feito por outro visitante.
O Museu Mineiro, por sua vez, está em clima de celebração pelos 120 Natais de Belo Horizonte, com a exposição 120 anos: Primeiros registros, que conta a história da cidade por meio de quadros, documentos, fotografias e plantas cadastrais do projeto original de BH. Reaberta após seis anos de inatividade, a Sala das Sessões é outra atração do museu.
Embora esteja fechada a partir de hoje para o recesso de réveillon, a casa Fiat de Cultura reabre dia 2 ainda em clima de Natal, com presépio colaborativo feito pelo público, em atelier aberto e com a curadoria do artista plástico Léo Piló. Os personagens – Jesus, Maria, José, além da fauna e da flora do cenário – foram criados a partir de referências dos povos ameríndios: indígenas brasileiros, incas, maias e astecas. Todos os elementos foram elaborados com material reciclado e ficam expostos até 6 de janeiro.
A filha rebelde de Aarão Reis
Um século e duas décadas depois de sua fundação, a Praça da Liberdade que convida visitantes a se deixarem seduzir por seus encantos nesta época de férias escolares é uma espécie de filha rebelde, que rasgou os planos da família tradicional em pleno período de festas. Transformou-se no que era, possivelmente, um dos maiores temores para Aarão Reis (1853-1936), seu “pai” – um engenheiro afeito a ideias positivistas. Criada para se tornar o centro do poder do estado, tornou-se artista.
Reis bem que tentou amarrá-la à vida burocrática. Não se contentou em situar no espaço quatro imponentes prédios administrativos estaduais – o Palácio do Governo, além das secretarias de Fazenda, Educação e Obras e Vias Públicas, presentes no projeto desde a inauguração, em 1897. Tratou de cercá-lo de uma pequena guarda de “autoridades”.
Mas basta um giro pelo Circuito Liberdade para perceber como tudo isso nunca combinou com a praça. O título de maior conjunto integrado de cultura do Brasil, conquistado em 2010, certamente lhe cai bem melhor. Que o digam seus frequentadores. “São novos tempos. A praça hoje não é mais do poder, ela empodera”, diz o estudante de ciências sociais Gabriel Silva, ao descer por um dos elevadores do Centro Cultural Banco do Brasil – antiga sede da Secretaria de Segurança Pública – onde acabara de contemplar a exposição Ex Africa.
Da entrada principal do CCBB, é possível enxergar um bolinho de adolescentes abrigados sob a marquise da Biblioteca Pública Luiz de Bessa, na Avenida Bias Fortes. “Adolescentes dos dias atuais ainda frequentam bibliotecas?”, poderia se perguntar um observador. Aqueles, no caso, não frequentam mesmo. De férias, o grupo se dirigia à Rua da Bahia, rumo a uma famosa rede de fast food gourmet da capital mineira.
Quem percorre os quatro andares do edifício erguido em 1954, no entanto, nem de longe pensa em um espaço morto. Com intensa programação cultural, o lugar com mais de 570 mil exemplares e 100 mil associados vive em plena atividade. Destinado aos cegos, o segundo andar é o mais frequentado do dia. O setor tem hoje 1.600 títulos impressos em Braille, somando cerca de 6.100 obras, 2 mil audiolivros de literatura brasileira e estrangeira e 200 da área de direito. O objetivo é orientar deficientes visuais em pesquisas, possibilitar o acesso a informações e à literatura, além de aumentar a autoestima dessas pessoas.
Liliane Camargo, de 38, está no setor estudando para um concurso. “Nas horas vagas, eu também pego livros emprestados, para ler em casa. Já li, por exemplo, vários da coleção Harry Potter. Sou adulta, mas adoro!”, conta.
Bruno Silva, de 39, não é cego. Os óculos que ostenta corrigem apenas grau e meio de miopia. Designer, mestre em educação, é recifense. Estava na capital a trabalho, e na biblioteca, a passeio. Aproveitou as horas de folga para fazer turismo pela da Praça da Liberdade. Entre os equipamentos que já havia visitado estavam o CCBB, o Memorial Minas Gerais Vale, o Centro de Arte Popular e a Casa Fiat de Cultura. “Se der, ainda quero dar um pulinho ao Arquivo Público Mineiro. Li no material de divulgação do circuito cultural deste lugar tão bonito que a maioria desses prédios foi projetada para ser o centro de poder da cidade. Hoje são espaço de arte e cultura. Fiquei ainda mais encantado pelo lugar, visse? Tem um espírito meio parecido com o meu.
Banquete
de cultura
Confira a programação do Circuito Cultural Praça da Liberdade
» CCBB Educativo
O que tem: projeção mapeada na fachada, atividade baseada na cultura africana de troca entre integrantes de uma mesma comunidade.
Onde, quando e quanto: Praça da Liberdade, nº 450, até 31 de janeiro, das 11h às 17h (o espaço fecha nos dias 31 e 1º). Entrada gratuita.
» Museu Mineiro
O que tem: Exposição Belo Horizonte – 120 anos: Primeiros registros
Onde, quando e quanto: Avenida João Pinheiro, 342, às terças, quartas e sextas, das 10h às 19h, quintas, das 12h às 21h, sábado, das 12h às 19h (o espaço fecha nos dias 31 e 1º). Entrada gratuita.
» Centro de Arte Popular Cemig
O que tem: Exposição Aparecida 300 anos (iconografia da imagem de Nossa Senhora Aparecida)
Onde, quando e quanto: Rua Gonçalves Dias, nº 1.608, até 7 de janeiro, terças, quartas e sextas, das 10h às 19h. Quintas das 12h às 21h. Sábado das 12h às 19h (o espaço fecha nos dias 31 e 1º). Entrada gratuita.
» Casa Fiat de Cultura (reabre dia 2)
O que tem: presépio colaborativo feito com material reciclável, inspirado nos povos ameríndios.
Onde, quando e quanto: Praça da Liberdade, nº 10, até 6 de janeiro, diariamente, das 10h às 21h. Entrada gratuita.
Programação completa: circuitoculturalliberdade.com.br/plus
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