Jornal Estado de Minas

Capela de 300 anos na Grande BH está ameaçada

A zeladora Maria da Conceição questiona: "Falta verba ou interesse?" - Foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press
Merecia uma grande festa, dessas bem mineiras com procissão, foguetes e muita gente nas ruas. Mas a infestação de cupins dentro e fora, infiltrações nas pinturas, danos na cobertura, estragos no piso e outros sérios problemas, incluindo a parte elétrica, adiaram a comemoração dos 300 anos da Capela Nossa Senhora do Ó, joia barroca de Sabará, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, e uma das preferidas dos turistas para visitação, especialmente pelas famosas chinesices. “Houve uma missa no dia 18. Do jeito que está, é impossível fazer a celebração como gostaríamos”, lamenta a coordenadora da comunidade e zeladora, Maria da Conceição do Carmo, a dona Biá, residente há seis décadas a poucos metros do templo vinculado à Paróquia Nossa Senhora da Conceição e Arquidiocese de BH.

A situação do monumento conhecido como Igrejinha do Ó, localizado no Largo de Nossa Senhora do Ó e tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) desde 1938, e pelo município, entristece Maria da Conceição. Ela se lembra da última restauração, em 2001, e olha com pesar a lateral da construção do início do século 18, que tem uma parte podre no telhado. “Fica até perigoso passar aqui nesta beirada. Olha a pintura externa, que coisa horrorosa”, aponta a zeladora, que conclama as autoridades a fazer os reparos com urgência, devido à temporada de chuvas. “Será que é falta de verbas ou de interesse?”, questiona, esperançosa de poder participar da festa do tricentenário ainda em 2018.

No início do milênio, quando a igreja ficou fechada durante um ano para restauro, as missas eram celebradas na garagem da casa de Maria da Conceição.
“Fico preocupada. Parece que dão pouco valor a uma capela tão bonita. Vem gente de todo lado para conhecê-la. Tivemos uma reunião com o pároco (padre Nivaldo Magela de Almeida Rodrigues), que é muito atuante, e mostramos nosso interesse em ajudar a conseguir recursos, por meio de barraquinhas, bingos, jantares e outros eventos.” Em outubro de 2015, a capela ficou parcialmente interditada após denúncias do Estado de Minas sobre o avanço da degradação.

Na avaliação da coordenadora da comunidade religiosa, só há esperança com trabalho. “A capela ficou muito tempo sem manutenção. É um templo em movimento, pois tem missa toda quinta-feira, às 19h, catequese, reunião de vicentinos, curso de crisma, além de ficar aberto todos os dias”. Enquanto passa uma vassoura na porta, a recepcionista Fabiana Rodrigues de Almeida, de 19, acrescenta: “Este lugar é uma maravilha, uma joia barroca de Sabará.
Às vezes fico pensando como gente da nossa cidade nunca veio aqui”.

Paisagem com motivos chineses, um dos atrativos do templo - Foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press

CHINESICES Quem entra pela primeira vez na Capela Nossa Senhora do Ó, após passar a porta de madeira e depois uma cortina, não consegue esconder o encantamento no ambiente que leva ao recolhimento, à admiração e à surpresa. Milhares de brasileiros e estrangeiros não cansam de contemplar as chinesices presentes no arco-cruzeiro e nos painéis laterais, que incluem até santos com olhos puxados. Derivada da palavra francesa chinoiserie, chinesice é o conjunto de pinturas que recriaram, no século 18, em igrejas e capelas de Minas, os pagodes ou pagodas (tipo de torre com fins religiosos comuns na China e outros países da Ásia), animais e paisagens.

Segundo levantamento do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG), as chinesices, geralmente com fundo vermelho, verde ou azul e elementos dourados, podem ser contempladas na Matriz de Nossa Senhora da Conceição, também em Sabará, e em outras cidades mineiras. Passados três séculos, o grande mistério continua sendo identificar a origem delas e há muitas histórias a respeito: uns acreditam numa ideia romantizada de que teria vindo para cá, no século 18, um indiano ou um chinês, e que essa pessoa teria feito esses trabalhos, ou que artistas das Gerais copiavam figuras de livros ou dos desenhos impressos em pratos e outros utensílios de porcelana. O certo mesmo é que, conforme especialistas, chinoiserie significa feito “à moda da China”.

OBRAS Há dois anos e dois meses, autoridades de instituições federais, estaduais e municipais, moradores e representantes e várias entidades participaram de uma audiência pública na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), coordenada pela Comissão de Cultura, para avaliar a situação da Igrejinha do Ó. Na época, houve várias propostas e nada foi feito de concreto para frear a deterioração desse marco da cidade colonial e uma das primeiras Vilas do Ouro de Minas, a antiga Vila Real de Nossa Senhora da Conceição de Sabará.

Pelas informações fornecidas ao EM, tudo indica que serão feitos os serviços e que não há risco de desabamento, pois, de acordo com o Iphan, uma vistoria recente realizada por arquitetos e engenheiros mostrou que não há comprometimento da estrutura da construção. Os problemas são pontuais, na cobertura e nas laterias, com presença de madeiras podres. A vistoria não contemplou a parte elétrica.

A coordenadora-geral do Memorial da Arquidiocese de Belo Horizonte, Maria Goretti Gabrich Freire Ramos, informa que a Paróquia Nossa Senhora da Conceição vai bancar os custos da descupinização no interior do templo.
Segundo Maria Goretti, a intervenção deverá começar após o período de férias, pois é intenso o turismo nesta época e o forte cheiro do material aplicado poderia incomodar os visitantes. Em nota, o prefeito de Sabará, Wander Borges, informa que, com recursos do município e início ainda neste semestre, será feita a restauração da capela de Nossa Senhora do Ó. “O material necessário para a obra já foi adquirido e, no momento, está sendo montada a equipe técnica que executará os trabalhos”, adianta Borges.

Enquanto isso...
Capela do Senhor Bom Jesus

Uma boa notícia para os moradores e visitantes é que a Prefeitura de Sabará vai fazer, com recursos próprios, a restauração da Capela do Senhor Bom Jesus, localizada no Bairro Morro da Cruz e ponto de peregrinação nas cerimônias da semana santa e festas religiosas em outras épocas. Para tanto, o prefeito Wander Borges assinou, em 11 de novembro, termo de autorização para o serviço no templo e revitalização do entorno. A capela foi tombada pelo município em 1999, tem importância na cultura local e está fechada há seis anos. O valor da obra é de R$ 700 mil, com previsão de término em junho de 2019.

 

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